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Brasil

Ferramenta de inteligência artificial pode prever o desmatamento na Amazônia

A plataforma PrevisIA , do Imazon, tem o objetivo de mostrar onde o desmatamento pode acontecer.

Em vez de tentar reparar os danos causados pelo desmatamento feito, pesquisadores do Imazon, organização sem fins lucrativos, queriam encontrar uma maneira de impedir que isso acontecesse. Assim nasceu a plataforma de inteligência artificial PrevisIA, que tem o objetivo de prever onde o desmatamento acontecerá a seguir, conta reportagem do The Guardian.

A PrevisIA apontou Triunfo do Xingu, no Pará, como a Área de Proteção Ambiental (APA) com maior risco de desmatamento em 2023, com 271 km² de floresta na área de conservação a serem perdidos até o final do ano. Cerca de 5 km² já haviam sido destruídos em março. Agora o Imazon está agora estabelecendo parcerias com autoridades de toda a região, com o objetivo de interromper o desmatamento antes que ele comece.

A destruição na Amazônia brasileira está chegando perto de um recorde histórico. De acordo com o SAD, Sistema de Alerta de Desmatamento do Imazon, o desmatamento em março triplicou em relação ao mesmo mês do ano passado, e o primeiro trimestre de 2023 teve 867 km² de floresta tropical destruídos – a segunda maior área derrubada nos últimos 16 anos.

A ideia do PrevisIA surgiu em 2016, quando a equipe do Imazon analisou dados coletados em imagens de satélite do SAD. Cansados de receber notificações depois que grandes áreas de floresta já foram desmatadas, eles se perguntaram: é possível gerar modelos de previsão de desmatamento em curto prazo?

“Os modelos de previsão de desmatamento existentes eram de longo prazo, olhando para o que aconteceria em décadas”, diz Carlos Souza Jr, pesquisador sênior do Imazon e coordenador do projeto PrevisIA e SAD, ao Guardian. “Precisávamos de uma nova ferramenta que pudesse antecipar a devastação.” Souza e sua equipe – um engenheiro de computação, um consultor em geoestatística e dois pesquisadores – começaram a desenvolver um novo modelo capaz de gerar previsões anuais. Eles publicaram suas descobertas na revista Spatial Statistics em agosto de 2017.

Multas por desmatamento na Amazônia aumentam mais de 200%

O modelo adota uma abordagem em duas frentes. Primeiro, enfoca as tendências presentes na região, analisando geoestatísticas e dados históricos do Prodes, o sistema governamental anual de monitoramento do desmatamento na Amazônia. Compreender o que aconteceu pode ajudar a fazer previsões mais precisas. Quando as áreas já desmatadas são recentes, isso indica que as gangues estão operando na área, então há um risco maior de que a floresta próxima seja exterminada em breve.

Em segundo lugar, analisa as variáveis que freiam o desmatamento – como terras protegidas por comunidades indígenas e quilombolas e áreas com corpos d’água que não se prestam à expansão agrícola – e também variáveis que tornam o desmatamento mais provável, incluindo maior densidade populacional, presença de assentamentos e propriedades rurais e maior densidade de infraestrutura rodoviária, tanto legal quanto ilegal. “São as artérias da destruição da floresta”, diz Souza, referindo-se às estradas não oficiais que serpenteiam a Amazônia para facilitar atividades industriais ilegais. “Essas estradas criam as condições para novos desmatamentos.”

Monitorar a construção dessas estradas é crucial para prever – e eventualmente prevenir – o desmatamento. Segundo o Imazon, 90% do desmatamento acumulado está concentrado a 5,5 km de uma estrada. A exploração madeireira está ainda mais próxima, com 90% ocorrendo em um raio de 3 km e 85% dos incêndios em um raio de 5 km. Os pesquisadores costumavam vasculhar milhares de imagens de satélite para ver se conseguiam identificar novas estradas cortando o bioma. Com o PrevisIA, o trabalho é entregue a um algoritmo de inteligência artificial (IA) que automatiza o mapeamento, permitindo análises mais rápidas e, por sua vez, atualizações mais frequentes.

Mas sem uma plataforma computacional robusta e a capacidade de atualizar os roteiros mais rapidamente, o PrevisIA não poderia ser colocado em prática. Somente em 2021 a equipe do Imazon fez parceria com a Microsoft e o Fundo Vale, adquirindo o poder de computação em nuvem necessário para executar o algoritmo de IA para mapear estradas. “A tecnologia sempre foi a razão pela qual conseguimos controlar o desmatamento”, diz Juliano Assunção, diretor executivo da Climate Policy Initiative e professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), à reportagem. “O PrevisIA é uma evolução natural dessa incorporação de tecnologia na luta pela proteção da Amazônia e com muito potencial.”

Embora a tecnologia seja fundamental para o funcionamento do PrevisIA, quem a utiliza fará a diferença. Assunção aponta os órgãos governamentais encarregados de proteger a floresta e também aqueles que não estão diretamente envolvidos no monitoramento da Amazônia, como bancos, investidores e compradores de produtos da região, como aqueles que poderiam usar a informação para tomar melhores decisões, tanto do ponto de vista econômico quanto ambiental.

Até agora, o Imazon tem parcerias oficiais com algumas promotorias estaduais da região, que esperam que o uso do PrevisIA leve a menos punições e mais prevenção. “Estamos sempre trabalhando para penalizar esses crimes e irregularidades ambientais. Mas do lado ambiental, o estrago já foi feito. Queremos inverter essa lógica. Queremos encontrar uma maneira de impedir que isso aconteça”, diz José Godofredo Pires dos Santos, promotor público do Pará e coordenador do Núcleo de Apoio Operacional Ambiental. Sua equipe tem feito reuniões semanais com o Imazon para se atualizar sobre a melhor forma de usar o PrevisIA. Ele espera começar a usar o sistema no segundo semestre de 2023.

No Acre, o Ministério Público estadual espera o mesmo. A ideia, diz o procurador Arthur Cezar Pinheiro Leite, é que a PrevisIA notifique os órgãos fiscalizadores das áreas de risco, para que fiquem mais atentos e para que o Ministério Público alerte os proprietários de imóveis ou outras pessoas da região que serão responsabilizados caso ocorra o desmatamento. “Queremos que eles saibam que estamos cientes do que está acontecendo”, diz Leite. “E se esse desmatamento ainda acontecer, eles serão punidos e servirão de exemplo para outros que pensam em fazer o mesmo.”

Até agora, Souza diz que a precisão da PrevisIA tem sido “fantástica”. De todos os seus alertas de desmatamento, 85% estiveram dentro de 4 km do local previsto. Pouco mais de 49% dos alertas foram em áreas classificadas como de alto ou muito alto risco. Ele e sua equipe estão constantemente trabalhando para melhorar o modelo, mas ele também espera que, um dia, eles errem. “Se isso acontecer, significará que a prevenção está funcionando”.

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