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Amazonas

Nova espécie de peixe elétrico descoberto na Amazônia emite maior descarga entre animais

Conhecido por ser o único desses peixes com potencial de produzir altas descargas elétricas para defesa e caça, o poraquê pode alcançar mais de dois metros de comprimento e 20 quilos.

Por quase dois séculos e meio acreditou-se existir apenas uma espécie de poraquê, Electrophorus electricus, mas uma nova pesquisa revelou que há pelo menos três espécies distintas na Amazônia. Como novidade, uma das duas novas espécies, Electrophorus voltai, emite a maior descarga elétrica do reino animal, chegando a 860 volts e superando o recorde anterior de 650 volts do E. electricus. O estudo foi publicado na revista Nature Communications contou com contribuição de pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa/MCTIC).

Os peixes elétricos integram um grupo de 256 espécies que produzem naturalmente a eletricidade e a utilizam para se comunicar, orientar-se durante a locomoção e para detectar presas e predadores. Conhecido por ser o único desses peixes com potencial de produzir altas descargas elétricas para defesa e caça, o poraquê pode alcançar mais de dois metros de comprimento e 20 quilos. É típico da região amazônica e foi considerado por muito tempo como uma única espécie, amplamente distribuída por diversos tipos de ambientes aquáticos.

“Por ser um peixe muito característico, ninguém nunca havia prestado atenção para verificar se de fato era uma única espécie, ou se haviam outras envolvidas”, conta o pesquisador do Inpa especialista em peixes amazônicos, Jansen Zuanon.

A definição das espécies foi feita a partir de um grande conjunto de dados incluindo DNA, morfologia externa, detalhes do esqueleto e distribuição geográfica dos animais, que resultaram na identificação de três linhagens principais que se diferenciaram nos períodos Mioceno e Plioceno (entre 3 e 7 milhões de anos atrás).

O primeiro autor do artigo é o brasileiro Carlos David Santana, pesquisador associado do Museu Nacional de História Natural do Instituto Smithsonian (EUA). Do Inpa, além de Jansen, também assinam o trabalho o técnico Renildo de Oliveira e o estudante de doutorado Douglas Bastos.

Para Bastos, estudos como esses são importantes para mostrar que se conhece muito pouco sobre a diversidade e biologia de peixes amazônicos. Ele lembra que mesmo uma espécie tão comum e fácil identificação, como o poraquê, ficou 250 anos “escondida”. Os poraquês que estão no Bosque da Ciência, área de visitação pública do Inpa, e à vista de todo mundo, por exemplo, pertencem à espécie nova E. varii.

“Isso é um sinal que temos muito trabalho pela frente, tanto na descoberta de novas espécies de peixes elétricos, como no entendimento de aspectos biológicos e comportamentais dos peixes elétricos”, disse Bastos, que é engenheiro de pesca, com doutorado em andamento sobre a História Natural do Poraquê, no Programa de Pós-Graduação em Biologia de Água Doce e Pesca Interior do Inpa.

Em uma entrevista para a Agência Fapesp, o pesquisador do National Museumof Natural History da Smithsonian Institution, Carlos David de Santana, explica que a descarga é de alta tensão, mas a amperagem é baixa, aproximadamente um ampere, não sendo necessariamente perigosa a humanos se comparada ao choque de uma tomada elétrica com 20 amperes. “O choque atordoa a vítima. É suficientemente forte para ajudar os peixes a capturar presas ou assustar um predador”, disse Santana.

Os poraquês emitem corrente em pulsos, esgotando a sua energia após algumas descargas e levando algum tempo para recarregar. Antes do artigo publicado, achava-se que a espécie tinha hábitos solitários, mas foi verificado que em caso de ameaça eles podem se juntar em grupos caso se sintam ameaçados ou queiram capturar presas.

O poraquê sempre foi muito popular na comunidade científica, justamente pela sua capacidade de gerar energia elétrica. “O conceito de eletricidade surgiu em função desses organismos e o poraquê teve um papel histórico muito importante para descoberta de eletricidade”, conta Zuanon. O estudo da capacidade do poraquê de gerar energia elétrica inspirou o físico italiano Alessandro Volta a desenvolver a primeira bateria elétrica (pilha), e as descobertas feitas a partir dos estudos da fisiologia desse peixe resultaram na descoberta de uma fonte de uma substância chamada acetilcolinesterase, que tem sido usada para tratar doenças neurodegenerativas.