Amazonas
Ao O Globo, governador do Amazonas nega arrependimento por ter revogado ‘lockdown’
Em entrevista ao Globo, Lima diz que a situação do sistema de saúde no Amazonas só deve se estabilizar nos próximos dias.
Em entrevista ao O Globo, o governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), disse que os “próximos dias em Manaus serão difíceis” por conta do caos no sistema de saúde gerado pelo aumento no número de casos de Covid-19 e pela falta de oxigênio hospitalar. Enfrentando a maior crise dos seus dois anos de mandato, Lima nega, no entanto, arrependimento por ter afrouxado as restrições impostas por ele próprio a atividades como o comércio no final do ano.
No dia 23 de dezembro, o governador amazonense assinou um decreto restringindo uma série de atividades econômicas para conter o avanço da doença. Após pressão de empresários, ele recuou e determinou a reabertura. “Era preciso ouvir a voz das ruas”. Em meio à crise que veio depois, Lima se viu obrigado a decretar toque de recolher na quinta-feira.
Em entrevista ao Globo, Lima diz que a situação do sistema de saúde no Amazonas só deve se estabilizar nos próximos dias que o estado não tem condições de realizar o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), ao contrário do que pediu a Advocacia Geral da União (AGU) em um recurso contra a decisão da Justiça Federal que suspendeu a aplicação da prova no Amazonas em função da crise vivida pelo estado. O primeiro dia da prova está previsto para o domingo.
O governo do Amazonas foi alertado no ano passado sobre possibilidade de um novo pico da doença no segundo semestre de 2020. Por que o governo não se planejou com antecedência?
Nós fizemos tudo o que era possível. No primeiro pico da pandemia, nós sofremos por quase 30 dias. Só que dessa vez, nos últimos 10 ou 15 dias, mais do que duplicou o nosso consumo de oxigênio hospitalar. Nós não contávamos com essa nova variante do coronavírus que, ao que tudo indica, tem algo grau de transmissibilidade. O estado do Amazonas. A gente ampliou a rede. Nós abrimos 700 leitos. Nós fizemos tudo o que era possível baseado no que havia acontecido entre abril e maio.
Em dezembro, o senhor assinou um decreto restringindo atividades econômicas, mas houve pressão de empresários e o senhor recuou. Se arrepende do recuo?
Todas as decisões que eu tomei foram baseadas em dados técnicos levando em consideração, de um lado, a proteção da vida, e de outro, levando em conta a importância das atividades econômicas. Quando a gente fez aquele decreto e houve aquelas manifestações, o resultado foi o efeito contrário ao que a gente buscava. Acabaram ocorrendo aglomerações. Aconteceu o que a gente não queria. Então, entramos em acordo com os órgãos de controle e com o comércio e encontrar um caminho de conciliação. Até que chegou o momento em que não deu mais para manter a flexibilização.
Então o senhor, sabendo o que acontece hoje, teria mantido a restrição.
Todas as decisões que tomei foram baseadas. É difícil dizer o que eu faria ontem com base no que aconteceu hoje…
Não faz tanto tempo assim, governador. Ontem, aliás, a equipe da Fundação de Vigilância em Saúde alegou que as aglomerações do final do ano podem ter tido resultado significativo no que ocorre agora. Se o senhor pudesse, voltaria atrás e teria mantido as restrições?
Todas as ações que tomamos naquele momento foram as que eram possíveis de ser tomadas, evitando uma convulsão social, aglomerações, violência. Aquelas foram as ações que deveriam ser tomadas naquele momento. Não tem como tomar uma decisão levando em consideração apenas os dados. Era preciso, também, escutar a voz das ruas.
Diante do que está acontecendo agora, ter ouvido a voz das ruas foi a melhor decisão naquele momento?
A gente tentou encontrar o equilíbrio entre a proteção da vida e as atividades econômicas.
A PM terá poder para prender quem viole o toque de recolher?
Isso é um caso excepcional. A gente não quer que a PM saia prendendo ninguém, mas estamos diante de uma situação sem precedentes na história.
A Advocacia Geral da União (AGU) entrou com um recurso na Justiça Federal para manter a realização do Enem no Amazonas, que havia sido suspensa por uma ordem judicial. O senhor concorda com a AGU?
O Estado do Amazonas não tem condições de abrir suas salas de aula para fazer o Enem. Já conversei sobre isso com o presidente do Inep e com o ministro da Educação (Milton Ribeiro) e abrimos a possibilidade para que o exame fosse realizado em fevereiro.
A situação no Amazonas é grave. O senhor avalia que ela pode piorar nos próximos dias?
Os próximos dias serão muito difíceis. A gente estima que a situação só vai melhorar, se estabilizar, dentro de dois dias. A gente acredita que em dois dias nós já tenhamos normalizado a nossa situação, levando em consideração que há uma possibilidade de transferência de pacientes e o fato de que teremos cargas de cilindros de oxigênio chegando.
O senhor é governador há dois anos. No ano passado, o Amazonas teve a chance de lidar com um pico da epidemia. O senhor se sente de alguma forma responsável por esse cenário já que faltou oxigênio hospitalar, um item tão básico em uma crise como essa?
Nós rodamos todos os cenários possíveis, mas o que aconteceu no Amazonas foi algo extraordinário, algo excepcional. Temos essa mutação do vírus que tem alta transmissibilidade. Eu, como governador, tenho a missão de conduzir esse processo, que é o que eu venho fazendo quando converso com a sociedade civil organizada e com o governo federal, por exemplo.
O discurso e a conduta do presidente Jair Bolsonaro, que deu várias declarações minimizando os efeitos da doença ao longo de todos esses meses, contribuiu de alguma forma para o cenário que vocês enfrentam hoje?
Eu não vou entrar nesse mérito porque não vou comentar o comportamento do presidente. O governo federal é um grande parceiro do estado do Amazonas. Se não fosse o governo federal, estaríamos em uma situação muito mais complicada.
Qual a previsão do estoque de oxigênio ser regularizado?
Daqui a dois dias a gente acredita que teremos mais estabilidade no sistema. A gente também precisa analisar a curva de infecção para saber em que momento vamos baixar o número de internações. Só vamos ter uma regularização da situação no momento em que caírem as internações.
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