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Vacina russa Sputnik V tem 91,6% de eficácia contra a Covid-19, informa The Lancet

Os resultados preliminares consideram que o imunizante, administrado em duas doses, mostrou “grande eficácia” e foi bem tolerado entre os voluntários acima de 18 e 60 anos.

A Sputnik V, vacina produzida pelo Instituto Gamaleya, da Rússia, tem eficácia de 91,6% contra casos sintomáticos da Covid-19. Os dados, avaliados por pesquisadores independentes, foram publicados nesta terça-feira (2), na revista científica The Lancet. A vacina já está sendo aplicada na Rússia e em outros países, como Argentina e Argélia. As informações são da AFP e Associated Press, com publicação pelo jornal O Estado de S.Paulo.

Os resultados preliminares consideram que a vacina, administrada em duas doses, mostrou “grande eficácia” e foi bem tolerada entre os voluntários que participaram da última etapa dos ensaios clínicos. A proteção do imunizante se mostrou consistente entre todas as faixas etárias – dos mais jovens, acima de 18 anos, até participantes acima de 60 anos.

A pesquisa, que envolveu cerca de 20 mil voluntários, mostrou que a vacina ajuda a prevenir as formas mais graves da Covid-19. Os participantes do estudo, realizado entre setembro e novembro, foram divididos em dois grupos: um recebeu duas doses da vacina e o outro, duas doses de placebo, com três semanas de intervalo. No total, foram confirmados 78 casos de Covid-19 entre os participantes a partir do 21º dia após a primeira dose: 62 entre os 4,9 mil participantes que receberam placebo e 16 casos entre os 14,9 mil que receberam o imunizante. Nenhum evento adverso grave relacionado à vacina foi registrado.

De acordo com os dados preliminares, os vacinados que desenvolveram a Covid-19 tiveram formas mais leves da doença, o que sugere que a severidade do quadro pode diminuir com a imunidade conferida pela vacina. Nenhum caso grave ou moderado da doença foi registrado entre os participantes que receberam o imunizante, enquanto 20 casos foram registrados no grupo que recebeu placebo. Os dados equivalem a uma eficácia de 100% contra as formas moderada e grave da Covid-19.

Cientistas independentes reconheceram que a vacina produzida pela Rússia, criticada pela velocidade do desenvolvimento e pela falta de transparência na divulgação preliminar dos estudos, teve resultado claro. “O desenvolvimento da vacina foi criticado pela precipitação, por pular etapas e pela ausência de transparência. Mas os resultados mostrados são claros e o princípio científico desta vacina foi mostrado”, disseram os especialistas britânicos Ian Jones e Polly Roy, em um comentário publicado junto do estudo.

Esses resultados corroboram as afirmações iniciais da Rússia, feitas em novembro. Com os dados, a Sputnik V se junta às vacinas mais eficazes, como as da Pfizer/BioNTech e Moderna, que têm acima de 90% de eficácia. Os autores indicam a necessidade de realizar mais pesquisas incluindo adolescentes, crianças e gestantes. Os estudos clínicos ainda estão em andamento e pretendem incluir um total de 40 mil participantes.

A vacina já foi autorizada em outros países, como Hungria, Sérvia, Bolívia, Venezuela, Paraguai, Belarus e Irã.

Tecnologia

A vacina tem como base dois tipos de adenovírus (Ad26 e Ad5), um tipo de vírus que causa resfriados, que recebeu o gene da proteína spike do novo coronavírus. Os cientistas modificaram os adenovírus para que pudessem invadir as células, mas não conseguissem se replicar, tornando-os incapazes de causar a doença. De acordo com a The Lancet, o uso de dois adenovírus diferentes – administrados nas duas doses aplicadas com 21 dias de intervalo – é o que distancia a Sputnik V de outras vacinas.

As vacinas Sputnik V e de Oxford usam a mesma tecnologia de fator viral, mas com composições diferentes – a de Oxford usa adenovírus de chimpanzé, e a vacina russa usa adenovírus de humanos. Já a Coronavac é produzida a partir de um vírus inativado do novo coronavírus.

Segundo os pesquisadores, o uso de um vetor de adenovírus diferente na segunda dose pode ajudar a criar uma resposta imune mais potente, já que minimiza o risco do sistema imunológico desenvolver resistência ao primeiro vetor administrado.

Estes imunizantes são mais resistentes que os desenvolvidos pela Pfizer e Moderna, por exemplo, baseados na tecnologia do RNA mensageiro. O DNA não é tão frágil quanto o RNA, e o revestimento de proteína resistente do adenovírus ajuda a proteger o material genético interno. Por isso, a vacina Sputnik V pode ser refrigerada e não requer temperaturas de armazenamento muito baixas.

Negociação no Brasil

O imunizante russo é visto como um dos mais promissores por interlocutores do presidente Jair Bolsonaro e do ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, mas ainda esbarra na falta de dados para a aprovação na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). O Estadão mostrou, em reportagem publicada na sexta-feira (30), que defensores dizem, nos bastidores, que a Sputnik poderia se tornar “a vacina de Bolsonaro”.

No dia 15 de janeiro, o laboratório brasileiro União Química, que produz a vacina no País, e o Fundo de Investimentos Diretos da Rússia (RDIF) fizeram o pedido de uso emergencial para 10 milhões de doses da Sputnik V à Anvisa. O pedido foi rejeitado no dia seguinte por não cumprir requisitos mínimos para a aplicação emergencial das doses, como a vacina ter estudos de fase 3 em andamento no Brasil. As vacinas que tiveram uso emergencial aprovado – Coronavac, do Instituto Butantan em parceria com a chinesa Sinovac, e Covishield, da Universidade de Oxford e AstraZeneca – realizaram testes clínicos no Brasil.

A Anvisa informou por meio de nota nesta terça-feira, 2, que tem realizado reuniões com técnicos da União Química, mas desde a rejeição do pedido não houve mudança de status. Também acrescentou que o estudo publicado no Lancet é com a vacina em forma líquida, armazenada a -18ºC.

“A União Química quer comercializar no Brasil a vacina em outras condições de temperatura e conservação, diferentes do produto que trata o artigo.  Dessa forma é necessário saber se os resultados encontrados são extrapoláveis, ou seja, se os resultados da vacina líquida a -18ºC vale também para a vacina que a União Química quer trazer para o Brasil. Para este tipo de avaliação é necessário estudo de comparabilidade entre os produtos.”

Bolsonaro se reuniu na quarta-feira, 27, com o presidente da Anvisa, Antonio Barra Torres, e um dos temas tratados, segundo apurou o Estadão, foi a aprovação da Sputnik V. Como mostrou a Coluna do Estadão, o Ministério da Saúde disse à União Química que está “disposto a formalizar as tratativas comerciais para eventual aquisição dos lotes do imunizante”, caso a empresa receba aval para o estudo de fase 3 e peça novamente o uso emergencial à Anvisa.

A União Química já começou a produzir doses da vacina em território nacional. De acordo com Rogério Rosso, diretor de negócios internacionais do laboratório, a produção foi iniciada com um lote piloto de Insumo Farmacêutico Ativo (IFA), o princípio ativo do imunizante. Ele afirma que é possível produzir 8 milhões de doses por mês no País, assim que sua planta em Brasília, a Bthek, estiver operando em capacidade máxima.


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