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Brasil

Estadão: grileiros fraudam documentos virtuais para roubar terras indígenas na Amazônia

As projeções mostram brigas de grileiros pelos mesmos espaços e um avanço feroz de fazendeiros sobre florestas de Roraima, Rondônia, Amazonas, Pará e Mato Grosso.

Cruzamento de bases de dados geoespaciais realizado pelo Estadão mostra, dia a dia, o avanço de fazendas sobre áreas que deveriam ser apenas dos povos da floresta. Reportagem identificou que há locais onde 90% do território indígena foi grilado.

O Cadastro Ambiental Rural (CAR), que é autodeclaratório, se transformou numa máquina rápida de produzir documentos oficiais que ligam grileiros a uma propriedade

A grilagem de terras avança agora de forma digital na Amazônia. Criado a pretexto de centralizar informações sobre a vegetação nativa, o sistema do Cadastro Ambiental Rural (CAR) permitiu um “vale tudo” na internet e virou uma ferramenta para tomada de florestas e invasão efetiva de territórios indígenas e da União. Nos últimos dez anos, entretanto, o cadastro, que é autodeclaratório, se transformou numa máquina rápida de produzir documentos oficiais que ligam grileiros a uma propriedade.

O mecanismo da grilagem digital avança especialmente nas terras indígenas com processos de homologação em fase inicial. Por meio de cruzamentos de bases de dados geoespaciais com milhares de registros do CAR, foram identificadas 325 fazendas registradas ilegalmente, entre 2014 e 2023, sobre cinco áreas que deveriam ser ocupadas exclusivamente por comunidades tradicionais da floresta.

A legislação diz que o CAR é válido enquanto os órgãos ambientais dos estados não reconhecem a ilegalidade, ainda que as propriedades estejam flagrantemente sobrepostas a terras públicas. Como o poder público leva anos para analisar cada registro, o grileiro inscreve áreas virgens no sistema e consegue instantaneamente um documento oficial da terra. A demora na análise do cadastro dá tempo ao falsificador de se consolidar como proprietário de seu suposto imóvel. Com o cadastro, fazendeiros podem, por exemplo, emitir guia para transporte de gado e até solicitar financiamentos.

As projeções mostram brigas de grileiros pelos mesmos espaços e um avanço feroz de fazendeiros sobre florestas de Roraima, Rondônia, Amazonas, Pará e Mato Grosso. A grilagem digital combinada com desmatamento se intensificou nos momentos em que o governo federal negligenciou a renovação das proibições de acesso às terras, restrição que caracteriza áreas em vias de reconhecimento por decreto.

Na criação do CAR em 2012, o governo federal argumentou que pretendia mapear informações ambientais de todos os imóveis rurais do País. Cada dono de terra deve informar ao governo características hidrográficas, áreas de proteção, florestas, restingas e veredas, por exemplo. Os dados são enviados pela internet, por meio dos sites dos órgãos ambientais. O que se viu, no entanto, foi um novo mapa de áreas extensas da floresta elaborado pelo crime organizado de terras.

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