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Amazonas

Estado do Amazonas sanciona lei que pode beneficiar até políticos em ‘situação vexatória’

A lei, de autoria da deputada estadual Joana Darc (PL), gerou controvérsias, e foi sancionada pelo governador Wilson Lima (PSC)

Segundo especialistas, a lei pode ser revogada

Desde o dia 28 de julho, está proibido o ato de fotografar, filmar, publicar em redes sociais ou praticar qualquer outro meio capaz de capturar ou divulgar imagens que exponham pessoas acidentadas ou em “situação vexatória ou vulnerável”. A lei, de autoria da deputada estadual Joana Darc (PL), gerou controvérsias, e foi sancionada pelo governador Wilson Lima (PSC) e publicada no Diário Oficial do Estado (DOE) na última quarta-feira (28).

O coordenador do Comitê Amazonas de Combate à Corrupção, advogado Carlos Santiago, destacou que a nova lei amazonense pode ser interpretada como censura, o que é proibido pela Constituição Federal. Ele salientou que o Ministério Público poderá entrar com medido judicial para revogar a lei.

“A legislação agora sancionada traz uma censura. O que é inconstitucional. Não existe liberdade de expressão absoluta. Quem promover agressões, constrangimento ou algum tipo de violência será acionado na justiça e pagará por isso, mas não existe proibição prévia. Não existe censura prévia. Esta lei tem tudo para ser revogada ou julgada inconstitucional pelo poder judiciário. Cabe ao Ministério Público promover uma ação nesse sentido”.

Para o advogado, a Assembleia Legislativa do Amazonas (ALE-AM) extrapolou a competência jurídica uma vez que a matéria deveria sido tramitada no Congresso Nacional. “Não é competência do poder legislativo estadual estabelecer uma tipologia criminal na área do direito civil ou na área do direito penal. E muito mais quando trata de menor. Quando trata de vulneráveis, a competência para o estabelecimento de normas, na penal, na área cível, é do Congresso Nacional”, disse o advogado.

Carlos Santiago diz que é estranho o fato de a parlamentar amazonense apresentar um tipo de matéria jurídica neste foco. “Além disso, também, mostra de forma clara que o Governo do Amazonas peca muito quando olha o projeto de forma mais política, de interesse de agradar os parlamentares da assembleia, em detrimento do cuidado jurídico que deve ter a norma. Ademais, causa estranheza a parlamentar apresentar um projeto de lei de forma até genérica, muito genérica, como se tivesse preocupada em esconder algo”, avaliou Carlos Santiago.

A presidente da Comissão de Defesa da Liberdade de Expressão da seccional do Amazonas da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Luziane Figueiredo, disse que a lei sancionada pelo governador Wilson Lima pode sofrer processo de julgamento de inconstitucionalidade. Ela destaca “o interesse público, o direito de informação (de informar de ser informado) está acima desse conceito amplo de situação vexatória”.

“Porque a gente observa que a liberdade de expressão é plena, assegurada pela constituição. E é fato que a fotografia, a exposição de acidentes, de crimes, cadáveres, tem enquadramento penal já especifico. Agora, a questão do interesse público, muitas vezes se sobrepõe a essa questão do fato vexatório. Isto é muito amplo. O interesse público se sobrepõe. Imagina se num estado democrático de direito a gente não pudesse publicar, veicular, fotografias, de pessoas que cometeram algum tipo de corrupção, foram presas? Imagina se a gente não pudesse fazer esse tipo de divulgação?”, disse Luziane Figueiredo, que também é jornalista.

‘Mais do mesmo’

O cientista político e professor universitário de Comunicação Social Helso Ribeiro disse que não vê a nova lei como uma censura ainda que ela seja considerada “mais do mesmo” pelo fato de já ter garantia constitucional. “Eu vejo esta lei como um pouco ‘mais do mesmo’, porque já tem a previsão constitucional. Uma das preocupações que tenho com meus alunos é sempre mostrar que a proibição da censura que veio com a constituição trouxe ao lado, se você pegar o artigo 5º da Constituição, está lá o inciso 10º a questão da não violação da intimidade também, da vida privada, de imagem de pessoas. E aí, o que que eu vejo: boa parte das vezes há exposição indevida”, analisou o professor.

“Mas não vejo como a lei vá impedir a exposição de políticos, de autoridades, de agentes públicos, em locais e atos que são reprováveis do ponto de vista legal e do ponto de vista moral”, completou Carlos. “Eu particularmente defendo o princípio constitucional que é o da inocência. Que diz que ninguém pode ser considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Isso implica em que? Não me veja como censor porque eu não sou. Mas muitas vezes alguns colegas jornalistas na ânsia de dar notícias criam juízos de valor em cima de imagens”, disse.

“Há pouco tempo, eu vi os garotos pulando no igarapé, sendo afogados e alguém filmando. Para mim, isso é para lá de marrom. Não vejo graça você filmar a desgraça alheia. Corpos sendo filmados, fotografados, eu não aprovo isto. Nesse sentido eu compreendo a sanção desta lei”, afirmou Helso Ribeiro.

A autora da Lei, a deputada Joana Darc (PL) disse que a prática de postar tudo na internet “muitas vezes sem pudor ou critério ético, é extremante prejudicial à sociedade e de modo específico aos entes envolvidos na exposição pública e ilegal de suas imagens”.

“A Lei têm como objetivo direto, reprimir a conduta de fotografar, filmar ou divulgar por quaisquer meios, imagens de pessoas acidentadas, feridas, vítimas de tragédias, situações vexatórias e vulneráveis. Temos incontáveis casos no Amazonas, onde pessoas acidentadas possuem suas imagens divulgadas nas redes sociais. E, aí, vale lembrar que isso representa ofensa à imagem e à privacidade, estando passível quem postou a representação na esfera cível. Também temos casos extremos, onde pessoas vítimas de acidentes fatais no trânsito, aquáticos ou mesmo aéreos, tem seus corpos expostos na internet. Isso, vai contra a dignidade humana. Das vítimas e de suas famílias”, defendeu a deputada.

A lei prevê multa de 300 Unidades Fiscais de Referência (UFIR), que pode ser em dobro na hipótese de a conduta de que trata esta Lei ter sido praticada contra pessoa menor de 18 anos, ou contra pessoa que apresente qualquer problema ou retardo mental.

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