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Amazonas

Defensoria informa que, mais de 30 dias após obter semiliberdade, indígena estuprada em delegacia do AM permanece em abrigo

Segundo a DPE-AM, indígena já recebeu as chaves da residência que obteve em acordo com o Estado, mas está impedida de usar por falta de laudo da Funai.

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A Defensoria Pública do Amazonas (DPE-AM) informou que mais de 30 dias após obter decisão judicial garantido o regime de semiliberdade, a indígena Kokama, que foi violentada em uma delegacia do interior do Estado, continua isolada em um abrigo da capital, sem visita dos familiares, por falta de manifestação da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), responsável pela supervisão do cumprimento da pena em semiliberdade.

Segundo a DPE-AM, a indígena já está com as chaves da residência que ganhou do Governo do Estado mediante acordo homologado pela Justiça. Contudo, para ser transferida para a nova moradia, também é necessário aval da Funai por meio de um laudo que ainda não foi emitido.

Na quarta-feira (10), ela esteve na sede da DPE-AM, onde reuniu com os defensores públicos Theo Costa, do Núcleo de Atendimento Prisional (NAP), e Roger Moreira, titular da Defensoria Especializada Na Promoção e Defesa dos Direitos Humanos, da Pessoa Com Deficiência e de Grupos Socialmente Vulneráveis.

Durante a reunião, segundo a DPE-AM, ela reforçou a necessidade da transferência para a nova residência, onde deve abrigar uma irmã de 27 anos que está em tratamento de um câncer agressivo, além da mãe, padrasto e dos dois filhos (um de 13 anos e outro de quase três anos), os quais não vê desde quando foi transferida de Santo Antônio do Içá para Manaus.

A irmã da indígena passou por uma cirurgia que retirou órgãos como útero e reto e recebeu alta no último domingo (7). Ela está morando em um quarto de hotel na região central da capital e está usando sondas para se alimentar e fazer as necessidades fisiológicas.

Acompanhados de uma representante da Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos (Sejusc), a indígena e os defensores Theo Costa e Roger Moreira visitaram a irmã da mulher após a reunião na DPE-AM.

A DPE-AM informou que o restante da família da indígena está a caminho de Manaus, com previsão de chegada nesta sexta-feira (12). Sem apoio de órgãos que inicialmente disseram que ajudam a indígena, parte dos custos das passagens foi paga com recursos próprios do defensor público Roger Moreira.

A indígena afirma que sua maior preocupação neste momento é estar junto dos familiares. “Minha irmã passou por uma cirurgia delicada e está precisando da minha ajuda. Minha mãe e meus filhos estão chegando também”.

“O pedido que eu fiz é para que eu ficasse junto ao meu núcleo familiar o quanto antes e até o momento a Justiça ainda não definiu nada. Eu preciso o quanto antes ter essa decisão para estar com a minha irmã que está doente. A Defensoria Pública já informou ao juízo da Vara de Execução Penal sobre essa situação”.

Na avaliação do defensor público Theo Costa, a decisão que concedeu a semiliberdade para a indígena “na realidade está sendo utilizada contra ela”.

Ele explica que, quando realizou pedido de prisão domiciliar, a DPE-AM obteve parecer favorável do Ministério Público. Entretanto, houve uma readequação pelo juízo da Vara de Execuções Penais (VEP), que concedeu o cumprimento de pena em regime especial de semiliberdade para indígenas condenados, conforme previsão do Estatuto do Índio (lei 6.001/1973), que deve ser supervisionado pela Funai.

Contudo, a Funai não foi chamada com antecedência pelo juízo para discutir os termos e ausência disso está impedindo a indígena de cumprir o regime, que foi deferido há mais de um mês. “Nesse meio termo, o próprio Estado do Amazonas já cumpriu com parte do acordo concedendo uma residência para ela. Ou seja, ela já tem para onde ir e continua na casa abrigo”, observa o defensor.

“Isso acaba sendo não só um transtorno, mas uma violação institucional em razão dessas omissões nos processos. Omissões que vêm ocorrendo desde o início e estamos vendo acontecer novamente”, disse.

No dia 2 deste mês, o defensor informou à Justiça sobre a situação da irmã da indígena e a disponibilidade da residência, solicitando autorização para a transferência dela da casa abrigo para a nova moradia. “Até hoje não obtivemos uma decisão por parte do juízo. O processo fica concluso para decisão, infelizmente sem qualquer decisão judiciária”.

“Nosso objetivo é fazer com que ela consiga cumprir o regime de semiliberdade nos termos em que foi deferido e também consiga conviver com seus familiares e prestar a ajuda necessária para a irmã, que se encontra nessa situação delicada de saúde”, destaca Theo Costa. “Lembrando que a irmã dela não tem ninguém para apoiá-la e nem um lugar para morar aqui em Manaus”, acrescenta.

“Ela teve que conceder uma parte de suas economias para a irmã ter um lugar para ficar por algum período, mesmo tendo uma residência concedida pelo Estado. É uma incoerência causada por um atraso, mais uma mora judicial”, enfatiza Costa.

Ao conceder a semiliberdade prevista no Estatuto do Índio, a VEP, explica o defensor, deu a responsabilidade para a Funai regulamentar o cumprimento do regime. “Mas, passado mais de um mês até o momento, não há nada encaminhado nem formalizado, nenhuma proposta de como isso se daria. Na prática, quem está fazendo todos os cuidados da indígena, não é a Funai, mas sim a Secretaria de Justiça. Isso é algo que não deveria acontecer e acontece por conta dessa decisão judicial que foi concedida pela metade”.

Para ele, as omissões criam um “vácuo jurídico” com consequências não só para a indígena, mas também para os filhos, a irmã e a mãe idosa, que convive com as sequelas de um acidente vascular cerebral (AVC). “Assim, uma omissão de uma decisão judicial pode causar tantos transtornos a uma, não só uma pessoa, mas a todo o núcleo familiar”.


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