Amazonas
Amazonas ignorou alertas da White Martins seis meses antes da crise, diz CNN
Reportagem mostra relatório do SUS dos alertas enviados pela fornecedora de oxigênio hospitalar ainda no mês de julho de 2020, seis meses antes do colapso que resultou na morte de dezenas de amazonenses sem oxigênio
A CNN informou na noite desta quarta-feira (09) que o governo do Amazonas ignorou dois alertas para que fosse alterado o contrato com a fornecedora de oxigênio White Martins de modo a assegurar a oferta adequada diante do aumento da demanda na pandemia. É o que mostra o relatório do Departamento Nacional de Auditoria do SUS.
Segundo a reportagem, o primeiro alerta veio da própria empresa por meio de uma carta encaminhada à Secretaria de Saúde do Amazonas no dia 16 de julho. Nela, a White Martins pede que o contrato assinado em 2016 seja alterado para ampliar em 25% a oferta de oxigênio.
“Avaliando os volumes contratados por Vossas Senhorias, já pudemos constatar que os mesmos não suportarão o consumo que atualmente estão praticando. Por outro lado, preocupa-nos que, neste momento excepcional, de tão alta demanda, há possibilidade de termos que tomar a difícil decisão de atender somente os clientes em seus limites, prazos e condições comerciais contratadas, até porque, muito embora a indiscutível situação de calamidade, que indica uma maior flexibilização nas contratações, em todos os casos persiste a máxima de qualquer dispêndio público só é possível mediante formalização de contrato prévio, observadas a hipóteses e justificativas legais”, diz o trecho escrito por Petrônio Bastos, gerente-executivo da empresa. “Por isso é imperioso que se tomem medidas preventivas imediatas em relação ao atendimento desta secretaria, até porque são referentes a atendimento de indiscutível suporte à vida. Assim, nossa sugestão é que Vossas Senhorias possam, desde já, providenciar o acréscimo nos volumes contratados, de 25% nos termos da lei que afeta à matéria”, completou.
As negociações começaram e o Governo do Amazonas concordou em alterar o percentual, mas na ordem de 21,9%. Foi aí que ocorreu o segundo alerta, dessa vez da área técnica da Secretaria de Saúde do Estado. Isso ocorreu no dia 11 de setembro, quando a área técnica afirmou que esse percentual era insuficiente.
“Considerando a referida memória de cálculo, o DELOG concluiu que o percentual de 21,9152% não atenderia as necessidades da Secretaria, em função da alta crescente nos números de casos confirmados da Covid-19 no Estado. Diante de tal situação, foi efetuado encaminhamento para superior deliberação quanto ao acréscimo não mais de 25% e, sim, de 46,9152% do contrato, amparado pelo artigo 4º-I da Medida Provisória nº 926/2020”, diz o documento.
A resposta, porém, foi a de que não havia recursos para esse acréscimo. “Decorridos diversos trâmites internos, os autos retornaram da Gerência de Execução Orçamentária-GEO/FES com a informação de indisponibilidade orçamentária para atender o acréscimo de 46,9152% do contrato, sendo autorizado o provisionamento de recursos para o acréscimo de 25% ao valor ora contratado, conforme Despacho de 05/10/2020, assinado pela Secretária Executiva do Fundo Estadual de Saúde”, diz a auditoria.
O aditivo foi assinado no dia 23 de novembro, ratificando o aumento de 21,9152% na oferta.
A auditoria ainda ponta outros problemas na relação do Amazonas com a White Martins. Cita, por exemplo, que relatórios de controle e fiscalização do consumo eram frágeis e feitos pela empresa.
A auditoria foi feita a pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR) e anexada no inquérito aberto pelo STF (Supremo Tribunal Federal) para analisar a atuação da Secretaria Estadual da Saúde do Amazonas e da Secretaria Municipal de Saúde de Manaus no período de 01/03/2020 a 31/01/2021.
Não foi avaliado o abastecimento de oxigênio medicinal nas unidades de saúde da rede privada em Manaus, nem a atuação do governo federal para socorrer a situação.
Sobre isso, ela menciona que “a articulação do Estado com o Ministério não se efetivou em período suficiente para a implementação de ações de contingência que poderiam evitar ou mitigar os problemas decorrentes da falta do medicamento no Estado”.
Confira a reposta do governo:
A referida solicitação de aditivo de valor do contrato foi realizada em julho de 2020, quando a média de consumo era de 15,5 mil metros cúbicos por dia, portanto atendido no valor contratado.
Esse mesmo nível de consumo se manteve até meados de dezembro de 2020, conforme documento da própria White Martins. Mesmo assim, conforme plano de contingência da Secretaria de Estado de Saúde (SES-AM), em novembro de 2020, foi autorizado aditivo de valor dentro das possibilidades legais.
Ressalta-se, ainda, que, na solicitação de aditivo de valor, a White Martins não menciona, em momento algum, incapacidade de produção para atender volume maior do insumo.
O aumento de consumo de oxigênio ocorreu de forma substancial no início de janeiro. De 20 de dezembro de 2020 a 4 de janeiro de 2021 houve incremento gradativo do consumo de oxigênio e a média passou a 28 mil metros cúbicos por dia.
A partir de 5 de janeiro, esse volume apresentou tendência de crescimento e a empresa solicitou, no dia 7 de janeiro de 2021, apoio logístico para trazer o insumo de outras plantas em outros estados, não mencionando, mais uma vez, incapacidade para atender a demanda, que passou a ter picos de 60 mil ao dia, o que a empresa chamou, à época, de escalada descontrolada de consumo.
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