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Amazonas

Deputados federais do Amazonas ocupam 2º lugar entre os que votam contra meio ambiente, diz pesquisa

Ferramenta da Repórter Brasil, Ruralômetro aponta os deputados federais com Febre Ruralista, referencial de pior desempenho socioambiental.

Indígenas em protesto, em Brasília. (Foto:Midia Ninja)

Deputados federais do estado do Amazonas ocupam o segundo lugar na lista dos parlamentares do Congresso Nacional que mais votam contra projetos de lei relacionados à proteção do meio ambiente, povos indígenas e trabalhadores rurais. Empatados com os amazonenses estão os políticos dos estados do Mato Grosso e Roraima. Os representantes de Santa Catarina ocupam o primeiro lugar.

Os dados fazem parte do Ruralômetro, ferramenta desenvolvida pela agencia de notícias Repórter Brasil que avalia a atuação dos deputados diante da agenda socioambiental.

Cada deputado recebeu uma pontuação entre 36° C a 42° C — equivalente à temperatura corporal. Quanto pior o desempenho, mais alta a temperatura. Classificações acima de 37,4° C indicam “febre ruralista” — ou atuação desfavorável.  (consulte aqui a ferramenta).

 

Análise nacional

Enquanto o ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles sugeria aproveitar a pandemia para ir “passando a boiada”, pelo menos 351 deputados federais, ou dois terços da Câmara dos Deputados, estavam votando medidas e elaborando projetos de lei contrários ao meio ambiente, aos povos indígenas e aos trabalhadores rurais.

Esses parlamentares apresentaram projetos de lei e votaram mudanças legislativas que prejudicam a fiscalização ambiental, favorecem atividades econômicas predatórias, precarizam a legislação trabalhista, dificultam o acesso a benefícios sociais e travam a reforma agrária, dentre outros retrocessos apontados por organizações socioambientais.

Para avaliar os deputados, foram analisadas 28 votações nominais e 485 projetos de lei apresentados na atual legislatura, iniciada em fevereiro de 2019. As propostas e os votos foram classificados como “favoráveis” ou “desfavoráveis” por 22 organizações especializadas em temas sociais, ambientais e trabalhistas.

Os resultados da análise indicam o avanço da “nova direita” no Legislativo e mostram também o poder, em Brasília, da Frente Parlamentar da Agropecuária, conhecida como bancada ruralista. ” Com a onda bolsonarista de 2018, foi eleito um Congresso mais à direita que os anteriores. E ainda temos um governo anti-indígena e antiambiental, que construiu uma base de apoio no Legislativo com o centrão [grupo de partidos aliado ao governo] e dá reforço institucional à agenda regressiva”, diz Cláudio Couto, cientista político e professor de gestão pública da FGV (Fundação Getulio Vargas).

Analistas ouvidos pela reportagem dizem que a inclinação ruralista da Câmara já era uma realidade, mas o governo Bolsonaro desequilibrou o tabuleiro político com o enfraquecimento do Ministério do Meio Ambiente. Mesmo diante dessa maioria ruralista do Legislativo, sempre foi possível aprovar leis de proteção ao meio ambiente e aos povos tradicionais, segundo Suely Araújo, ex-presidente do Ibama e especialista em políticas públicas do Observatório do Clima. Para isso, no entanto, pesava o apoio de parte do Executivo.

“Mas isso se perdeu, porque o Ministério do Meio Ambiente é hoje o primeiro a apoiar no Congresso a derrubada da proteção ambiental”, diz ela, que trabalhou por 29 anos na Câmara como consultora legislativa de meio ambiente. “Foi uma tempestade perfeita em desfavor do meio ambiente, a pior legislatura desde a redemocratização”, afirma Raul Valle, diretor de Justiça Socioambiental da WWF Brasil.

Entre os retrocessos aprovados pela Câmara desde 2019, Kenzo Jucá, assessor legislativo do ISA, aponta três projetos do chamado “pacote da destruição”:

  • o PL 6.299/2002, ou “PL do Veneno” (que libera o uso de agrotóxicos, incluindo os comprovadamente cancerígenos, sem necessidade de aprovação da Anvisa);
  • o PL 2633/2020, conhecido como “PL da Grilagem” (que afrouxa a fiscalização fundiária e facilita a grilagem de terras públicas);
  • e o PL 3729/2004, ou Lei Geral do Licenciamento Ambiental (que elimina o licenciamento em alguns casos, cria o autolicenciamento em outros e enfraquece o papel das agências ambientais).

As três medidas, que fazem parte da base de dados do Ruralômetro, passaram na Câmara e estão em análise no Senado. Única parlamentar indígena no Congresso em mais de 30 anos, a deputada Joenia Wapichana (Rede-RR, 36,6° C) avalia que, com o reforço da base ruralista, os ambientalistas têm sido obrigados a atuar na defensiva, sem muito espaço para avançar com propostas.

“A gente tem feito o possível para não desmontar totalmente os poucos direitos dos povos indígenas”, diz Joenia Wapichana (Rede-RR), deputada federal.

Os reis do rodeio

Quem mais se destacou com propostas e votos considerados antiambientais e anti-indígenas foram deputados homens, eleitos por estados da Amazônia Legal e da região Sul, além de representantes da “nova direita”. Dos 20 piores pontuados no Ruralômetro 2022, 14 estão em primeiro mandato e 13 deles são do PL, partido do presidente Bolsonaro.

É o caso de Nelson Barbudo (PL-MT, 42° C), “campeão” do ranking entre os parlamentares mais mal avaliados. Todos os seus oito projetos de lei incluídos no levantamento foram considerados danosos ao meio ambiente, com destaque para aquele que impede a apreensão e destruição de equipamentos flagrados em infrações ambientais.

Em outro projeto de lei, Barbudo atuou em causa própria ao propor a redução do limite máximo de multas ambientais de R$ 50 milhões para R$ 5.000 — medida que potencialmente o beneficia, já que ele deve R$ 25 mil ao Ibama desde 2005.

Procurado, Barbudo não comentou o fato de ter tido a pior avaliação. Contudo, disse à Repórter Brasil que se define como um “preservacionista liberal”.

O segundo deputado mais mal avaliado pelo Ruralômetro é Lucio Mosquini (MDB-RO, 41,3° C), que está na Câmara desde 2015, seguido pelo delegado Éder Mauro (PL-PA, 40,9° C), que se define como “líder da bancada da bala na região Norte”.

Apesar de sua atuação estar mais relacionada com a defesa das armas, Mauro vem se destacando como porta-voz de garimpeiros, ao apresentar projetos que fragilizam a fiscalização ambiental em prol da mineração. Mauro e Mosquini foram procurados pela Repórter Brasil, mas não atenderam aos pedidos de entrevista.

O Ruralômetro 2022 avaliou 499 dos 513 deputados, excluindo aqueles que participaram em menos de dez das votações selecionadas, os suplentes que assumiram no meio do mandato e três políticos que morreram no decorrer da legislatura.

Assim como em 2018, quando foi lançada a primeira edição, a plataforma também cruza dados do Ibama, do Ministério do Trabalho e do TSE para mostrar quais deputados têm multas ambientais ou trabalhistas, e quais receberam doações eleitorais de infratores ambientais e trabalhistas.

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