Brasil
Divergências de Fux sobre trama golpista já foram rejeitadas pelo STF, antes do julgamento
Ministro defende julgamento no plenário.

O ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), abriu seu voto no julgamento da trama golpista acolhendo pedidos preliminares realizados pelas defesas. Ele divergiu do relator, Alexandre de Moraes, ao sustentar que o processo não poderia tramitar no STF e que, caso permaneça na Corte, deveria ser julgado pelo plenário completo. Além disso, levantou a hipótese de cerceamento de defesa pela entrega tardia e desorganizada de provas eletrônicas, em volume que chamou de “tsunami de dados”. Esses questionamentos, porém, já foram analisados pela Primeira Corte em ocasiões anteriores, e rejeitados por maioria de votos.
1. Incompetência do STF
Fux afirmou que os oito réus da ação não tinham prerrogativa de foro no momento da denúncia e que, por isso, o caso deveria ser remetido à primeira instância.
— Nós não estamos julgando pessoas com prerrogativa de foro. Estamos julgando pessoas que não têm prerrogativa de foro — disse.
O ministro criticou a aplicação retroativa da mudança recente na jurisprudência que ampliou a permanência de processos no Supremo mesmo após a saída do cargo.
— O Supremo Tribunal Federal mudou a competência depois da data dos crimes… A aplicação da tese mais recente para manter esta ação no Supremo, muito depois da prática de crimes, gera questionamentos não só sobre casuísmos, mas ofende o princípio do juiz natural e da segurança jurídica — afirmou.
O STF já definiu, no entanto, que a atribuição de julgar os casos relativos ao 8 de janeiro é a Corte. Além disso, a tese definida pelo Supremo em março deste ano determina que o foro continua na Corte “ainda que o inquérito ou a ação penal sejam iniciados depois de cessado seu exercício”. Esses são os casos do ex-presidente Jair Bolsonaro e de réus que eram ministros à época dos episódios alvos da acusação.
Entretanto, um dos oito réus é o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ). Além disso, em março deste ano, o STF decidiu que os processos penais contra autoridades permanecem na Corte mesmo após saída do cargo. A maioria dos ministros também já reafirmou essa jurisprudência no julgamento das mais de mil ações relacionadas ao 8 de janeiro.
2. Julgamento deveria ser no plenário
Na segunda preliminar, o ministro defendeu que, se a ação continuar no Supremo, o julgamento deveria ocorrer no plenário, com os 11 ministros, e não na Primeira Turma.
— Se está sendo julgado como presidente, esta ação deveria se iniciar no plenário do Supremo Tribunal Federal — disse.
Segundo ele, restringir a análise à Turma seria “rebaixar” a competência do tribunal e “silenciar” ministros que também deveriam se pronunciar sobre os fatos. Por isso, declarou a incompetência da Turma e a nulidade dos atos já praticados.
Essas preliminares já haviam sido apreciadas pela Primeira Turma em fases anteriores do processo, ainda no momento do recebimento da denúncia feita pela Procuradoria-Geral da República (PGR). A maioria dos ministros entendeu, à época, que o Supremo é competente para julgar o caso e que não havia motivo para sustar a ação penal, rejeitando as alegações das defesas.
3. Cerceamento de defesa pelo “tsunami de dados”
Fux também tratou, de ofício, de uma preliminar sobre o contraditório e a ampla defesa. Ele apontou que as defesas tiveram acesso, de forma tardia e desorganizada, a um volume de provas eletrônicas equivalente a 70 terabytes. Segundo o ministro, os arquivos foram entregues sem índice ou nomenclatura adequada, poucos dias antes das oitivas de testemunhas.
— Para exercer o seu direito à autodefesa, o acusado precisa conhecer plenamente todas as provas produzidas contra si ou a seu favor. E isso vale para os acusados de ontem e de hoje, independentemente de suas matizes ideológicas. O devido processo legal vale para todos — afirmou.
O ministro citou o professor Gustavo Badaró, da USP, que destacou a violação à ampla defesa, e lembrou precedentes da Justiça Federal em que situações semelhantes resultaram até em absolvição sumária por cerceamento de defesa.
Por unanimidade, a Turma rejeitou todas as preliminares de nulidade apresentadas pelas defesas. Para a Turma, não procede a alegada falta de acesso amplo e total aos elementos de prova. No julgamento, o relator apresentou documento que lista cada acesso dos advogados de cada investigado ao processo, o que comprova que não houve cerceamento de defesa.
4. Delação de Mauro Cid
Depois de criticar a forma como a colaboração premiada do ex-ajudante de ordens havia sido conduzida, Fux afirmou que, no caso concreto, o acordo foi válido e deve ser mantido. O ministro destacou que a homologação já havia sido feita pelo relator, Alexandre de Moraes, em 2023, e que o colaborador prestou depoimentos acompanhado de advogados, assumindo inclusive autoincriminação.
— Mudar de entendimento é manifestação de humildade judicial. O direito não é museu de princípios, está em constante mutação. Neste caso, a colaboração foi válida e deve gerar benefícios ao réu — afirmou.
O julgamento
O placar da Primeira Turma está em 2 a 0 pela condenação, com votos de Alexandre de Moraes e Flávio Dino. Ainda votam Cármen Lúcia e Cristiano Zanin. O julgamento pode condenar o ex-presidente Jair Bolsonaro e outros sete réus acusados de tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022.
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