Brasil
Golpe do falso advogado já atingiu 17,5 mil pessoas no Brasil, diz OAB
O cenário também é agravado pela “inércia” das big techs. As informações são da agência Lupa

Tânia Rêgo/Agência Brasil
O “golpe do falso advogado” vem se alastrando pelo país. A prática, criminosa, consiste na fraude da identidade de advogados para a aplicação de golpes financeiros em seus clientes. Segundo a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), já foram registrados 17,5 mil casos do tipo no país. O problema vem causando prejuízos à prática da advocacia e, principalmente, danos financeiros à clientela, mas a resposta ao crime ainda é tímida. O cenário também é agravado pela “inércia” das big techs. As informações são da agência Lupa.
Em posse de dados detalhados de processos judiciais reais, os criminosos entram em contato — geralmente via WhatsApp — com clientes de escritórios de advocacia, informando que suas causas foram ganhas. Com a falsa promessa de que há um valor a receber, os clientes são induzidos a pagar taxas inexistentes. Em alguns casos, os estelionatários, sem maiores explicações, orientam as vítimas a realizar transferências.
Além do uso das fotos dos advogados reais e da falsa promessa de ganhos, há outro padrão na atuação dos golpistas: os ataques, por assim dizer, não são aleatórios. Os criminosos costumam acessar, em bloco, os processos de um mesmo advogado ou escritório de advocacia e, em posse de informações detalhadas sobre as ações em curso, aplicam os golpes nos clientes.
Na tentativa de proteger clientes e evitar transtornos, advogados têm tentado comunicar à clientela sobre a recorrência do golpe do falso advogado. Publicações em redes sociais com avisos sobre o crime tornaram-se comuns, tanto em perfis de profissionais quanto nos de tribunais e de seccionais da OAB.
No entanto, ações mais efetivas de combate a esse tipo de fraude ainda esbarram em desafios de alcance nacional. O enfrentamento aos crimes de estelionato e de falsidade ideológica é, em sua maioria, atribuição das polícias civis, entidades de âmbito estadual. A Polícia Federal (PF), por exemplo, não possui dados consolidados sobre a dimensão do problema no país.
Dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública mostram que, em 2024, o Brasil registrou ao menos 281,2 mil casos de estelionato digital. Em Minas Gerais, foram 53,9 mil ocorrências e, em Mato Grosso, 21 mil. O estado de São Paulo, assim como o Rio de Janeiro e o Ceará, não divulga dados específicos para estelionatos em ambientes virtuais. A Lupa procurou as secretarias estaduais de segurança pública de Minas, São Paulo e Mato Grosso para obter informações sobre o volume de registros do golpe do falso advogado. Minas Gerais e São Paulo informaram que não têm dados específicos para essa modalidade de crime. A secretaria mato-grossense não retornou até o fechamento desta reportagem.
Vazamento de dados e ‘inércia’ da Meta contribuem para o problema
O advogado Eduardo Ferrari, coordenador da Força-Tarefa de Enfrentamento ao Golpe do Falso Advogado da OAB-SP, disse à Lupa que, além de acessar dados públicos de processos em andamento, golpistas também obtêm informações a partir de vazamentos de dados cometidos por outros criminosos. Dessa forma, conseguem até mesmo senhas de advogados reais para acessar informações sensíveis dos processos, já que, pelo princípio da publicidade, advogados têm permissão para consultar detalhes de ações na Justiça. “O golpista desfruta disso com má-fé. Um sistema que foi criado pensando no bem da sociedade”, afirma Ferrari.
Além dos dados vazados, Ferrari aponta outro problema: a inação das grandes empresas de tecnologia.
“Uma situação que também é de grande importância para a validação do golpe é o descaso ou a inércia por parte das big techs, especialmente a Meta [dona do WhatsApp]. Eles dificultam o bloqueio do telefone usado indevidamente e não dão uma devolutiva em tempo razoável (…) Às vezes são feitas várias denúncias e o número continua ativo durante meses. As operadoras de telefonia também não têm uma campanha especial sobre o assunto. Seria muito importante que tivessem, porque, se há um WhatsApp ativo, é porque tem um número de telefone ativo na operadora”, afirma Ferrari.
A advogada Andréia Bonel contou à Lupa que, por alguns dias, acompanhou um perfil no WhatsApp que se passava por ela. Dois dias após aplicar golpes em seus clientes, a foto e o nome do perfil foram alterados para os de outro advogado, homem, que atua em outro município. Com o número ativo e não bloqueado pela Meta, novos golpes podem ter ocorrido.
Em nota à Lupa, a Meta disse que investe em tecnologia para capacitar os usuários a evitar mensagens suspeitas e golpistas. “Sempre que você recebe uma mensagem de alguém que não está nos seus contatos, perguntamos se deseja bloquear ou denunciar essa pessoa. Recentemente, adicionamos cartões de contexto que informam se um novo contato está salvo na sua agenda, se vocês têm grupos em comum, ou o país de onde a pessoa está enviando a mensagem”. A empresa também afirma que, por utilizar criptografia de ponta a ponta como padrão, o WhatsApp não tem acesso ao conteúdo das mensagens trocadas entre usuários, e que o uso do serviço para fins ilícitos não é permitido.
Para jogar luz sobre o problema, a OAB-SP lançou uma cartilha com informações sobre o golpe do falso advogado. O documento reúne dicas de prevenção e orientações aos clientes sobre como agir caso sejam vítimas da fraude. Uma das principais é acionar o Banco Central por meio do Mecanismo Eletrônico de Devolução (MED), criado para agilizar a devolução de valores transferidos via Pix em casos de fraude. De acordo com a entidade, a campanha de conscientização sobre a ocorrência do golpe levou a uma queda de 54% no número de ocorrências no primeiro semestre de 2025.
Como parte dos esforços contra o golpe do falso advogado, a OAB nacional disponibilizou a plataforma ConfirmADV, que permite consultar a verdadeira identidade de advogados. Para isso, é necessário fornecer o número de inscrição do advogado na Ordem, o estado de registro e o e-mail cadastrado pelo profissional. A consulta gera uma solicitação ao advogado, que precisa validar seus dados em até 5 minutos para comprovar sua autenticidade. Caso o tempo expire, tanto quem fez a consulta quanto o advogado consultado recebem uma notificação de que a verificação falhou.
A OAB também disponibiliza um canal de denúncias, onde vítimas do golpe podem relatar cobranças indevidas. As informações são encaminhadas para apuração pelas seccionais correspondentes. Em nota à Lupa, o presidente nacional da OAB, Beto Simonetti, afirmou que a entidade atua em todo o território nacional para proteger a advocacia e a sociedade. “Nosso compromisso é garantir que as pessoas tenham acesso à informação correta e saibam como reagir diante das tentativas de golpe”, diz.
Com informações da assessoria
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