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Brasil

Cúpula da Amazônia: entenda o que ficou de fora e o que entrou no acordo assinado pelos 8 países

Especialistas destacam que texto final foi ‘superficial e frágil’, mas fazem elogios ao avanço do diálogo entre países membros da Organização do Tratado de Cooperação da Amazônia (OTCA).

Um documento batizado de “Declaração de Belém” é o principal legado da Cúpula da Amazônia, evento que reuniu presidentes e ministros de Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela nesta terça-feira (8) e quarta-feira (9) em Belém. As informações são do site g1.

O texto final da conferência não trouxe avanços sobre pontos considerados fundamentais para especialistas e entidades que acompanham o tema:

deixa de assumir metas comuns de desmatamento;
não estabelece medidas concretas para evitar o ponto de não retorno da Amazônia, a partir do qual cientistas estimam que a floresta não se sustentaria sozinha;
não veta a exploração de petróleo na região.

Mas o texto sinaliza com alertas importantes e consensos assumidos pelos 8 países da região:

-ainda que sem medidas concretas, os países concordaram que é preciso evitar o ponto de não retorno da Amazônia;
-os presidentes acordaram em cobrar dos países desenvolvidos o pagamento de recursos para mitigar o impacto da mudança do clima;
-ficou acertada a criação de diversas instâncias de fiscalização comum dentro da perspectiva de fortalecer a Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA);
-destaca a necessidade de proteger os territórios indígenas e o respeito aos direitos humanos nas mais diversas formas na região, temas presentes nas propostas da sociedade civil.

Sobre o resultado do encontro, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, minimizou a falta de metas claras e ponderou que o processo de buscar consensos é algo que avança aos poucos.

“O processo de negociação é sempre um processo mediado, porque ninguém pode impor sua vontade a ninguém. Então, são os consensos progressivos”, afirma Marina Silva, ministra do Meio Ambiente.

Abaixo, entenda os avanços e as pendências que ficam após a conclusão da Cúpula da Amazônia.

1. Ponto de não retorno: sem metas e objetivos
Qual era a expectativa? Ações imediatas para evitar que a Amazônica chegue no seu ponto de não retorno, quando não se sustentaria sozinha, trazendo consequências desastrosas para todo o planeta. Esperava-se que fossem acertados compromissos, como desmatamento zero até 2030 em todos os países membros e metas de redução de emissão de poluentes.

O que aconteceu? O documento resultante da cúpula destaca em quatro momentos a preocupação central em torno disso, mas não fornece um plano claro com metas nem prazos.

Especialistas, como o climatologista Carlos Nobre, têm reforçado o alerta sobre o tema. Apesar da ausência da previsão de ações práticas, Nobre – reconhecido internacionalmente por suas pesquisas sobre Amazônia e mudanças climáticas – vê como positivo o fato de que todos reconhecem a gravidade da situação. Para ele, esse consenso já é um passo importante para enfrentar o problema.

“Isso é uma maravilha porque não há dúvidas sobre a seriedade da situação em que nos encontramos. Estamos à beira do precipício”, diz Carlos Nobre, climatologista, sobre o risco do ponto de não retorno da Amazônia

2. Petróleo e mineração: discordâncias entre países

Qual era a expectativa? Definição sobre barrar novos campos de exploração de petróleo e planos de ação contra a mineração ilegal na região da Amazônia.

O que aconteceu? A sugestão de setores da sociedade para barrar a exploração de petróleo ficou de fora da Declaração de Belém, em um indicativo sobre a falta de consenso em torno disso.

No documento, consta a decisão de iniciar um diálogo entre os países sobre a sustentabilidade de setores como mineração e hidrocarbonetos (petróleo) para atender aos objetivos da agenda 2030, coleção de 17 metas globais estabelecidas pela ONU.

“[A Declaração de Belém] não falou em como nem quando vamos parar de explorar petróleo na região e deixar de abrir novas fronteiras de petróleo em mundo, que não aguenta mais emissão de carbono”, diz Raul do Valle, especialista em Políticas Públicas do WWF-Brasil.

Na cúpula, o único a discursar de forma veemente pedindo o fim da exploração de petróleo na região foi o presidente da Colômbia, Gustavo Petro.

“A política não consegue se destacar dos interesses econômicos que derivam do capital fóssil. Por isso, a ciência se desespera, porque ela não está vinculada a esses interesses tanto quanto a política”, disse.
Aqui no Brasil, o governo tem discutido a possibilidade de a Petrobras conduzir pesquisas para avaliar a viabilidade da extração de petróleo na região, algo duramente criticado por ambientalistas.

No início da Cúpula, o Cacique Raoni, uma das principais lideranças indígenas do Brasil, entregou uma carta ao presidente Lula, pressionando por ações imediatas na proteção dos povos indígenas, incluindo a remoção de garimpeiros e medidas contra atividades ilegais na Amazônia, além do cumprimento de compromissos assumidos.

3. Desmatamento: sem metas comuns
Qual era a expectativa? Uma meta conjunta de redução do desmate do bioma, como o compromisso do desmatamento zero.

O que aconteceu? O documento não traz uma meta conjunta de redução do desmatamento do bioma.

Houve o compromisso de formar uma aliança regional para fomentar a colaboração internacional e impulsionar o alcance das metas individuais de cada nação.

Para André Guimarães, diretor executivo do IPAM, o evento estimulou a iniciativa inédita de compromissos de linhas de financiamento para empreendedores substituírem atividades danosas por sustentáveis na região.

São esperados aportes significativos, em torno de US$ 25 bilhões, articulados por 19 bancos, liderados pelo BNDES e BID. A ideia é não apenas disponibilizar crédito, mas também estimular o crescimento do setor privado.

4. Sociedade civil: ausência de participação efetiva
Qual era a expectativa? Uma participativa ativa da sociedade civil nas discussões e elaboração de propostas do evento.

O que aconteceu? Durante a Cúpula, surgiram críticas em relação à participação ativa da sociedade civil. Antes do encontro, um evento paralelo chamado “Diálogos Amazônicos” reuniu mais de 400 organizações da sociedade.

Representantes de diferentes setores entregaram documentos aos líderes dos países amazônicos, mas muitas das sugestões ficaram de fora do documento final.

“Houve debates anteriores, do dia 4 até o dia 6, muito interessantes, muitas oficinas, mas esses debates, os pedidos da sociedade, não se refletiram na declaração e nos documentos oficiais do encontro”, destaca Raul do Valle, do WWF-Brasil..

5. Retomada do diálogo
Qual era a expectativa? Fortalecer a cooperação entre os países membros. Impulsionar não só a atuação da OTCA como o diálogo regional e fortalecer parcerias estratégicas entre os órgãos governamentais desses países e a sociedade civil.

 O que aconteceu? Justamente o que era esperado.

Os especialistas ouvidos pelo g1 destacam o fator “pontapé” do evento. A Cúpula da Amazônia se encerra como importante vitrine para depois de 15 anos os países membros da OTCA voltarem a discutir Amazônia e pelo menos concordarem em abordar o desmatamento e a degradação florestal no bioma.

Nobre diz ainda que falta de metas concretas para eliminar o desmatamento e reduzir a degradação florestal foi um ponto crítico, mas o documento reconhece a necessidade de fortalecer o empoderamento das populações indígenas, a demarcação de terras e a criação de unidades de conservação.

O especialista destaca a importância de os países amazônicos se unirem politicamente e economicamente, buscando financiamento dos países desenvolvidos para impulsionar uma nova bioeconomia sustentável na região.

“Se países amazônicos concordarem antes da COP 30, em 2025, de zerar as emissões de gases, zerar o desmatamento e zerar a degradação florestal, nós seremos os primeiros países estaremos entre os primeiros países do mundo a atingir as metas do acordo de Paris”.

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