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Criança estuprada no ES que engravidou passa bem após aborto legal

A menina, de dez anos, está fora de perigo depois do procedimento para interromper a gestação; a lei brasileira prevê o direito ao aborto quando a gravidez decorre de estupro e quando há risco de morte para a mãe.

A menina capixaba de dez anos que engravidou após ter sido estuprada de forma recorrente no Espírito Santo está fora de perigo após realizar legalmente um aborto. O quadro de saúde dela é estável após o procedimento médico para interromper a gestação. As informações são do jornal Folha de S.Paulo.

A lei brasileira prevê o direito ao aborto quando a gestação decorre de estupro e quando há risco de morte para a mãe —o episódio se insere em ambos os casos—, além de nos casos de anencefalia do feto.

O procedimento de aborto foi iniciado no domingo (16) em uma maternidade pública do Recife sob protestos de grupos católicos e evangélicos, liderados por parlamentares conservadores, e concluído nesta segunda.

“Ela está bem. Pela manhã, começou a apresentar contrações uterinas e esperamos encerrar todo o processo hoje”, informou o médico Olímpio Moraes, diretor-médico da unidade de saúde onde a menina está internada.

Ainda não há informações precisas sobre quando a menina vai receber alta médica para retornar ao Espírito Santo. O procedimento ocorreu no Cisam (Centro Integrado de Saúde Amaury de Medeiros), hospital referência no atendimento à saúde da mulher.

Ela precisou sair de seu estado porque o hospital procurado pela família em Vitória, o Hucam (Hospital Universitário Cassiano Antônio Moraes), negou-se a fazer o procedimento legal com urgência.

Em entrevista coletiva transmitida nas redes sociais, na tarde desta segunda-feira (17), a superintendente do hospital, Rita Checon, disse que a decisão foi tomada pela equipe, que avaliou que a unidade não tinha condições técnicas para realizar o procedimento. A menina passou 36 horas internada no hospital, onde foi feito o ultrassom que constatou gestação de 22 semanas e quatro dias e peso fetal de 537 gramas.

Segundo a superintendente, a norma técnica do Ministério da Saúde seguida pelo protocolo do programa do hospital permite abortamento até 21 e 22 semanas e com peso fetal de 500 gramas. A solução encontrada foi dar alta à criança, para que ela pudesse buscar alguma unidade de referência em outro estado, capaz de realizar o procedimento com segurança.

A superintendente do hospital capixaba disse ainda que, apesar de a menina ter desenvolvido diabetes gestacional, ela não corria risco iminente de morte. “Quero deixar claro que não teve viés religioso, ideológico, nenhuma interferência externa, como tem sido ventilado por mídias sociais. Foi uma condução estritamente técnica da equipe, baseado no que [o hospital] faz sempre”, afirmou Checon.

Especialistas em direito afirmam que não há um período limite para se fazer um aborto autorizado pela Justiça, sobretudo quando a gestante corre risco de morrer.

Na coletiva, o secretário estadual de Saúde do Espírito Santo, Nésio Fernandes, disse que, após a definição do Hucam por não realizar o procedimento, a pasta contatou outros locais onde a menina poderia ter acesso ao aborto legal.

Com falta de vagas em uma unidade de Uberlândia, no sábado à noite ficou definido que a menina iria a Recife e foram emitidas passagens em voo comercial, com garantia de proteção de dados e preservação da dignidade e privacidade dela durante o processo.

“No entanto, [as redes sociais foram] indevidamente utilizadas por alguns atores mais radicalizados e passaram a constituir uma verdadeira mobilização social em torno do tema”, afirmou o secretário.

A viagem e o destino da criança foram divulgados nas redes sociais por conservadores. A ativista extremista Sara Giromini, conhecida nas redes como Sara Winter, chegou a publicar o nome da vítima e o endereço do hospital, contrariando o que preconiza o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente).

A Justiça do Espírito Santo determinou o apagamento de posts que identifiquem a criança direta ou indiretamente, como mostrou a coluna Painel, da Folha.

Liderados pelos parlamentares Joel da Harpa (PP), Clarisa Tércio (PSC) e Cleiton Collins (PP), os ativistas cristãos fizeram rodas de oração no hospital, e médicos do hospital foram chamados de “assassinos”. Feministas também estiveram no local para defender o direito à realização do procedimento legal. O tumulto só terminou por volta das 20h30 de domingo.

“Foi uma situação muito triste, as pessoas completamente ensandecidas. A gente estava lá para evitar que eles conseguissem ter acesso a ela, que era o mais importante, que ela seja resguardada. O que ela está enfrentando já é difícil demais”, diz Sophia Branco, 30, militante do Fórum de Mulheres de Pernambuco.

Na coletiva desta segunda-feira, a superintendente do hospital em Vitória disse que a instituição vai investigar se houve vazamento do prontuário. A Corregedoria do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) também apura se a Justiça do Espírito Santo resguardou os direitos da criança durante a condução do processo.

O Ministério Público do Espírito Santo também apura o vazamento das informações, a atuação de grupos que teriam ameaçado a família da criança e publicações de vídeos e informes que podem ter violado as leis vigentes.

O secretário estadual de Saúde citou a linha do tempo do caso, nesta segunda, e afirmou que menina procurou atendimento no dia 7 de agosto, e não no fim de semana como vinha sendo divulgado.

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