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Covid-19: Região Norte teve o maior índice de mortos após intubação no primeiro ano da pandemia

Os números da pesquisa evidenciam que um paciente intubado numa UTI tem muito mais chances de sobreviver que os atendidos com ventilação mecânica na enfermaria ou nos corredores.

De 15 de fevereiro até o final de dezembro de 2020, quase 80% das pessoas com Covid-19 que precisaram de ventilação mecânica invasiva morreram; e o percentual tende a piorar. No Norte, a mortalidade de pacientes intubados é maior, sobe para 86,7% e, no Nordeste, para 83,7%. No Centro-Oeste, o percentual também é acima da média (83,6%). Já no Sul e Sudeste, a taxa fica em 76,8%, segundo dados de uma pesquisa inédita publicados pela BBC News Brasil, segundo o site da revista Época.

Para um paciente grave de covid-19, com pulmão que perdeu a capacidade de oxigenar o sangue, a intubação pode aliviar as dores e ser a única esperança de sobrevivência. Mas, no Brasil, o percentual alto de mortes entre os infectados que precisam de ventilação mecânica assusta: 8 em cada 10 pacientes intubados ao longo do primeiro ano de pandemia morreram.

A título de comparação, a média mundial é de cerca de 50% de mortalidade. E, segundo os pesquisadores envolvidos nesse estudo, dados preliminares de 2021 mostram que a taxa de mortalidade brasileira deve piorar.

“Os dados de morte por intubação em 2021 não estão consolidados, mas as informações disponíveis sobre morte hospitalar apontam para um aumento significativo da mortalidade”, disse à BBC News Brasil o pesquisador da Fiocruz Fernando Bozza, chefe do Laboratório de Pesquisa Clínica em Medicina Intensiva do Instituto Evandro Chagas.

Uma primeira pesquisa dele sobre mortalidade de pacientes de Covid-19, publicada na revista médica The Lancet Respiratory Medicine, revelou que quase 80% dos doentes intubados no Brasil entre 16 de fevereiro e 15 de agosto de 2020 morreram. Para esse levantamento foram analisados dados de 254 mil internações.

Bozza terminou de compilar os números do segundo semestre de 2020 e eles revelam que a taxa de mortalidade se manteve próxima a 80%. Ou seja, os números mostram que após a primeira onda de Covid-19 no Brasil, o país não foi capaz de se organizar e adotar parâmetros nacionais de tratamento a ponto de reduzir a mortalidade de pacientes graves mesmo.

Para chegar ao percentual, foram analisadas 163,2 mil internações de pacientes com Covid-19 entre 15 de agosto e 31 de dezembro do ano passado. Os dados foram obtidos pelo sistema SIVEP-Gripe, do Ministério da Saúde, que determina que todos os hospitais comuniquem internações por síndrome respiratória.

O estudo revela que 78,8% dos pacientes que precisaram de ventilação mecânica invasiva morreram ao longo do segundo semestre de 2020 no Brasil.

“A taxa permaneceu alta ao longo do ano. Perdeu-se tempo discutindo tratamento precoce sem qualquer evidência científica e não se investiu em disseminar informação sobre tratamentos eficazes para pacientes graves, como uso de esteroides, técnicas de identificação de insuficiência respiratória, uso da posição prona e outros”, avalia Bozza.

Segundo o pesquisador da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) Otavio Ranzani, que também é um dos autores do estudo, o percentual brasileiro é maior que a média mundial, de cerca de 50%, conforme estudo que analisou dados de 69 países, publicado no American Journal of Respiratory and Critical Care Medicine.

A média de mortalidade de pacientes com Covid intubados na Ásia é de 47%, na Europa, é de 36% e, na América do Norte, é de 46%, completa o Ranzani, que também é pesquisador da Institute for Global Health, em Barcelona. “A taxa de mortalidade brasileira para uso de ventilação mecânica (invasiva) é semelhante à do México, de 80,9%”, acrescenta.

Agora, no pior momento da pandemia no Brasil, médicos de UTIs ouvidos pela BBC News Brasil também alertam para o provável aumento da taxa de mortalidade entre pacientes intubados em todas as regiões do país.

Isso porque, a superlotação de hospitais de Norte a Sul está levando à demora na intubação de pacientes graves, agravando o quadro deles. E profissionais de saúde sem experiência em ventilação mecânica estão sendo alocados para UTIs improvisadas. Além disso, médicos e associações farmacêuticas alertam que o estoque de medicamentos necessários para intubação está perto de acabar.

Os números da pesquisa de Ranzani e Bozza evidenciam que um paciente intubado numa UTI tem muito mais chances de sobreviver que os atendidos com ventilação mecânica na enfermaria ou nos corredores.

“Quanto mais especializado o serviço, menor a mortalidade”, diz a pneumologista do Albert Einstein Carmen Valente Barbas, professora da Faculdade de medicina da USP.

“O que tem sido feito em alguns hospitais do país é uma tentativa de treinamentos de urgência para os médicos, enfermeiros e fisioterapeutas que acabaram tendo que trabalhar na área intensiva, devido à situação de emergência. Mas não é a mesma coisa que ter formação e experiência na área.”

Os médicos ouvidos pela BBC News Brasil dizem que o cenário de improviso e caos, que impacta diretamente o número de mortes, poderia ter sido minimizado, se medidas de distanciamento social e isolamento tivessem sido adotadas, em conjunto com uma mensagem nacional de defesa do uso de máscara e lavagem constante das mãos.

“Existe um problema de comunicação grande no país, porque não tem uma orientação única no sentido de dizer que precisa usar máscara e manter distanciamento”, critica o professor da USP Carlos Carvalho, diretor da Divisão de Pneumologia do Hospital das Clínicas

“Qualquer deslize, se você tiver a infelicidade de estar perto de alguém com Covid e não tomar cuidado, você pega rapidamente. Pode acontecer ao baixar a máscara para comer um sanduíche”, destaca Carmen Valente Barbas, que ficou sete dias intubada após pegar Covid-19 no ano passado.

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