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COP30 em Belém é oportunidade de salvar a Amazônia do colapso, diz cientista Carlos Nobre em artigo no UOL

Segundo o cientista, o mundo não pode falhar com a Amazônia. E proteger a floresta e as populações locais é um dever global, e mantê-la viva e conectada é crucial para o futuro da humanidade.

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E artigo publicado no UOL, o cientista cientista Carlos Nobre afirmou que a 30ª Conferência das Partes sobre Mudanças Climáticas (COP30) será decisiva para o futuro da Amazônia e das populações que nela vivem. Segundo ele, nas últimas cinco décadas, a Amazônia registrou algumas das maiores taxas de desmatamento e degradação de florestas tropicais do mundo.”A destruição contínua, somada às mudanças climáticas globais, cria múltiplas pressões que empurram a floresta para além de seus limiares críticos de funcionamento ecológico — conhecidos como tipping points, ou pontos de não retorno”, diz.

Carlos Nobre é um cientista brasileiro, destacado principalmente na área dos estudos sobre o aquecimento global. É considerado um dos mais renomados do país e um dos cientistas brasileiros mais conhecidos mundialmente,.

No artigo, ele diz que o colapso da Amazônia comprometeria não apenas sua biodiversidade e os povos que dela dependem, mas também o clima do planeta, especialmente da América do Sul. Ele pergunta: como evitar que isso aconteça? E responde: “Antes de tudo, é fundamental pôr fim ao desmatamento, à degradação florestal e aos incêndios”.

“Essa urgência se deve ao fato de que a combinação de um desmatamento entre 20% e 25% com um aumento médio da temperatura global entre 2°C e 2,5°C levará a Amazônia ao ponto de não retorno (…) Se esses limites forem ultrapassados, haverá impactos severos no regime de chuvas, na produtividade agrícola e florestal, nas emissões globais de gases de efeito estufa e na diversidade biológica e cultural. Isso agravaria as desigualdades na Amazônia, impondo um ciclo vicioso de degradação ambiental e injustiça social difícil de ser superado”, escreve.

“A COP30 será realizada em Belém, em novembro de 2025. Trata-se de uma reunião histórica: ou avançamos em soluções reais — integrando ciência, tecnologia, saberes locais e vontade política — ou testemunharemos o ponto de não retorno da maior reserva biológica e fornecedora de chuvas da superfície terrestre. O mundo não pode falhar com a Amazônia. Proteger a floresta e as populações locais é um dever global, e mantê-la viva e conectada é crucial para o futuro da humanidade”, afirma o cientista.

Veja a íntegra do artigo:

COP30 em Belém é oportunidade de salvar a Amazônia do colapso

Colapso da Amazônia comprometeria não apenas sua biodiversidade e os povos que dela dependem, mas também o clima do planetaImagem: Pablo Porciuncula – 6.dez.2024/AFP

A COP30 (30ª Conferência das Partes sobre Mudanças Climáticas) será decisiva para o futuro da Amazônia e das populações que nela vivem. Nas últimas cinco décadas, a Amazônia registrou algumas das maiores taxas de desmatamento e degradação de florestas tropicais do mundo. A destruição contínua, somada às mudanças climáticas globais, cria múltiplas pressões que empurram a floresta para além de seus limiares críticos de funcionamento ecológico — conhecidos como tipping points, ou pontos de não retorno.

A COP30 será a primeira reunião da UNFCCC (Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima) realizada na Amazônia e representa uma oportunidade crucial — e possivelmente a última — para debater e encaminhar soluções capazes de proteger todos os biomas do planeta, especialmente evitar que a floresta amazônica ultrapasse limites do ponto de não retorno. O colapso da Amazônia comprometeria não apenas sua biodiversidade e os povos que dela dependem, mas também o clima do planeta, especialmente da América do Sul. Como evitar que isso aconteça?

Zerar o desmatamento é condição essencial

Antes de tudo, é fundamental pôr fim ao desmatamento, à degradação florestal e aos incêndios. Atualmente, cerca de 20% da floresta amazônica já foi desmatada. Para zerar o desmatamento, é necessário fortalecer a governança transnacional na região. Além disso, é imprescindível cumprir o Acordo de Paris, limitando o aquecimento a 2°C – idealmente não ultrapassando permanentemente 1,5°C. Em 2024, a média de temperatura global foi de 1,55°C acima do período pré-industrial (1850-1900).

Essa urgência se deve ao fato de que a combinação de um desmatamento entre 20% e 25% com um aumento médio da temperatura global entre 2°C e 2,5°C levará a Amazônia ao ponto de não retorno. Isso significaria uma transição para um novo estado climático e ecológico, com entre 50% a 70% da floresta sendo convertidos em uma vegetação semelhante à savana degradada. Apenas a região oeste e noroeste, próxima à Cordilheira dos Andes, manteria remanescentes significativos de floresta.

Se esses limites forem ultrapassados, haverá impactos severos no regime de chuvas, na produtividade agrícola e florestal, nas emissões globais de gases de efeito estufa e na diversidade biológica e cultural. Isso agravaria as desigualdades na Amazônia, impondo um ciclo vicioso de degradação ambiental e injustiça social difícil de ser superado.

Soluções baseadas na natureza para evitar o ponto de não retorno

Em artigos anteriores, abordei os desafios e oportunidades relacionados à restauração florestal, às estratégias de inovação e à bioindustrialização como caminhos para o desenvolvimento sustentável da Amazônia. Essas medidas permitem, simultaneamente, capturar carbono da atmosfera e produzir alimentos e matérias-primas que podem fortalecer a segurança alimentar e impulsionar a industrialização de produtos da biodiversidade com uso intensivo de tecnologia.

Agora, destaco o legado dos povos indígenas e a produção de energia renovável como soluções baseadas na natureza para afastar a Amazônia do ponto de não retorno.

Legado dos povos indígenas

Para os povos indígenas, tudo na floresta é sagrado — um conhecimento ancestral do qual a sociedade não indígena tem muito a aprender para conservar a Amazônia.

A ocupação indígena da Amazônia, há mais de 12 mil anos, resultou nos atuais 1,15 milhão de quilômetros quadrados Terras Indígenas. Isso representa 23% da Amazônia brasileira, área responsável por 25% das chuvas produzidas na região. Essas chuvas são transportadas pelos rios voadores para além da floresta, contribuindo para o abastecimento hídrico e a produção agrícola em várias outras partes do Brasil, como o Cerrado, as bacias dos rios Paraná e da Prata e também o Sudeste.

A presença indígena na Amazônia foi crucial para a globalização da biodiversidade. Dezenas de espécies nativas, como mandioca, pimenta, urucum, murumuru, castanha-do-pará, cacau, andiroba, copaíba e açaí, são hoje patenteadas e consumidas em diversas partes do mundo. Ao todo, o uso de cerca de 2.300 espécies nativas foi relatado por Indígenas a cientistas e naturalistas, gerando inúmeros benefícios para as indústrias de cosméticos, alimentos, fármacos e biotecnologia.

Além disso, grande parte desse conhecimento está disponível somente em idiomas indígenas — saberes que podem ser cuidadosamente acessados para o benefício das populações locais.

Energia renovável a partir da biodiversidade

Outra estratégia promissora é a produção de energia renovável a partir de resíduos da biodiversidade amazônica. A biomassa gerada pelo processamento de frutos como o açaí e a castanha-do-pará é estudada há décadas como fonte energética.

Esses resíduos representam cerca de 60% do peso dos frutos. Apenas nos estados do Amazonas e Pará, estima-se que 1,7 milhão de toneladas de frutos sejam comercializados anualmente, gerando cerca de 1 milhão de toneladas de resíduos aproveitáveis. Com poder calorífico entre 17 e 19 MJ/kg, esses resíduos podem produzir entre 4,72 e 5,28 milhões de MWh de energia térmica bruta.

Considerando uma eficiência de 25% na conversão dessa energia térmica em eletricidade, o volume gerado pode alcançar entre 1,18 e 1,32 milhão de MWh por ano — energia suficiente para abastecer as cerca de 200 mil residências da Amazônia brasileira que ainda estão fora da rede elétrica convencional. Outras alternativas complementares incluem o uso da radiação solar, captada por placas fotovoltaicas, e da energia hidrocinética, obtida diretamente por turbinas instaladas na correnteza dos rios.

Um chamado global para agir agora

A COP30 será realizada em Belém, em novembro de 2025. Trata-se de uma reunião histórica: ou avançamos em soluções reais — integrando ciência, tecnologia, saberes locais e vontade política — ou testemunharemos o ponto de não retorno da maior reserva biológica e fornecedora de chuvas da superfície terrestre. O mundo não pode falhar com a Amazônia. Proteger a floresta e as populações locais é um dever global, e mantê-la viva e conectada é crucial para o futuro da humanidade.


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