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Coach e grifes usam couro de área desmatada da Amazônia, diz ONG britânica

A ONG é conhecida por realizar investigações aprofundadas para expor crimes ambientais e sociais, injustiças e as ligações com o consumo global.

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A cadeia de suprimentos de couro da marca norte-americana de bolsas e acessórios Coach e de outras grifes de luxo internacionais está ligada a fazendas de gado envolvidas com desmatamento ilegal na Amazônia, especialmente no estado do Pará, que sediará a COP30 (30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas) neste ano. A conclusão faz parte de uma investigação da ONG britânica Earthsight divulgada hoje (24/6) no site UOL.

O caso da Coach, grife famosa no segmento de bolsas e acessórios premium, é o que mais chama atenção nos dados reunidos na denúncia da organização. Mas também são citadas na investigação grifes internacionais como Fendi, Chloé, Hugo Boss e Louis Vuitton, cujas cadeias de suprimentos de couro estão envolvidas com desmatamento ilegal e violações de direitos indígenas na Amazônia brasileira.

O centro da investigação é o frigorífico Frigol e o curtume Durlicouros. Segundo o relatório da Earthsight, o Frigol comprou centenas de cabeças de gado de fazendas com histórico de desmatamento ilegal, inclusive dentro de terras indígenas, no Pará, violando regras ambientais e territoriais. O frigorífico está entre os cinco maiores do país e abastece a Durlicouros, que é o maior exportador de couros do Pará para a Europa.

A Earthsight é uma organização sem fins lucrativos sediada no Reino Unido. A ONG é conhecida por realizar investigações aprofundadas para expor crimes ambientais e sociais, injustiças e as ligações com o consumo global. Sua mais nova investigação é intitulada “O preço oculto do luxo: o que as bolsas de grife europeias estão custando à floresta amazônica” e tem como base decisões judiciais, registros de embarques, imagens de satélite e documentos oficiais.

Os investigadores também infiltraram-se em feiras do setor de couro na Europa, para demonstrar como o couro processado por fornecedores brasileiros e oriundos do desmatamento ilegal acaba chegando a marcas de luxo. Isso inclui as grifes que se apresentam como sustentáveis, como a Coach.

Siga o couro: o caminho da produção ilegal

Falta de rastreabilidade na cadeia do couro no Brasil permite que o material de origem ilegal seja “lavado”. Ao analisar os dados, a organização encontrou brechas em relação à certificação de que as peles de animais para transformá-las em couro tinham origem legal. Essa falha permite, por exemplo, que animais de fazendas irregulares, associadas à áreas desmatadas na Amazônia, sejam transferidos para propriedades “limpas”, especialmente no caso dos fornecedores indiretos.

Entre 2020 e 2023, mais de 40% dos pecuaristas alvo das ações judiciais por pecuária ilegal forneceram gado para unidades da Frigol no estado sede da COP. O MPF (Ministério Público Federal) identificou que, ao todo, 47.200 cabeças de gado foram criadas ilegalmente dentro da Terra Indígena Apyterewa, no Pará, sendo que quase a metade delas vendidas ao frigorífico.

Frigol também é alvo de outras denúncias. Um levantamento elaborado pela ONG norte-americana EIA (Agência de Investigação Ambiental, na sigla em inglês) mostra que, entre janeiro de 2020 e o início de 2023, a FriGol também teria recebido animais de fazendas na Amazônia utilizadas para burlar as regras ambientais.

Ainda no ano passado, o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) também multou a empresa em quase R$ 2 milhões. Segundo o órgão, a Frigol adquiriu gado de áreas embargadas por desmatamento em Tucumã, também no estado paraense.

As denúncias contínuas de irregularidades representam uma violação. Em 2009, a empresa produtora de carne assumiu o compromisso público de não comprar animais criados em propriedades que desmataram, usaram trabalho análogo à escravidão ou cometeram outras irregularidades socioambientais.

A ligação entre Frigol e Durlicouros. Ao conectar a produção de gados com as empresas de curtume, a ong britânica identificou como a maior exportadora de couro do Pará, a Durlicouros, que é cliente do frigorífico. O fato, segundo Earthsight, foi evidenciado pelas redes sociais de ambas as empresas e confirmado em uma carta enviada pela Durlicouros à organização no ano passado.

“A Durlicouros é a maior exportadora de couro do Pará, responsável pelo envio de 90% do couro do estado para a Itália entre 2020 e 2023 (14.726 toneladas), expondo o mercado europeu ao risco de produtos de couro ligados ao desmatamento e a violações de direitos em suas cadeias de fornecimento”, diz a Earthsight, no relatório “O preço oculto do luxo: o que as bolsas de grife europeias estão custando à floresta amazônica”.

A investigação detalha que quase um quarto das exportações de couro da Durlicouros do Pará para a Itália foi adquirido por apenas dois curtumes da região do Vêneto, na Itália. São eles: Conceria Cristina, pertencente ao Gruppo Peretti, e a Faeda. As duas empresas são conhecidas por fornecer couro a marcas de destaque nos setores de design de interiores, automotivo e da moda de alto padrão.

Entre essas marcas está a Coach, conhecida por suas bolsas de luxo feitas com couro. Tanto a Conceria Cristina quanto a Faeda confirmaram a investigadores da Earthsight, em uma feira do setor, que fornecem couro para a Coach.

“Em uma reunião ‘undercover’ com representantes do Gruppo Peretti, os investigadores foram informados por um representante da Conceria Cristina que a Coach utiliza regularmente couro do Brasil — revelando a disposição da marca em ignorar os riscos de desmatamento e violações de direitos humanos”, diz a Earthsight.

A Coach é a principal marca do grupo Tapestry, Inc., um conglomerado de moda multinacional com sede nos Estados Unidos. No Brasil, uma bolsa da marca é enquadrada na categoria de “luxo acessível”, com preços que variam de R$ 598 a R$ 6.498,00. A companhia, segundo apresentação em seu site, foi fundada em 1941 como uma empresa familiar e hoje tem alcance mundial com mais de 950 lojas em 21 países.


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