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Cidades das região norte e nordeste têm maior dificuldade para contratar médicos, aponta estudo da CNM

Entre as cidades pesquisadas em todo o País, 979 estão com falta de médicos, o que, na maioria dos casos, já dura mais de três meses.

Um levantamento realizado pela Confederação Nacional dos Municípios (CNM) mostra que faltam médicos na atenção primária em uma em cada três cidades brasileiras. O problema também atinge grandes centros, como Belo Horizonte. As região Norte e Nordeste são as mais prejudicadas. Sul, Sudeste e Centro-Oeste aparecem na sequência, respectivamente.

A pesquisa mostrou que um terço das cidades entrevistadas tem falta de profissionais e não suporta atendimentos para a eficiência da rede de saúde pública. O levantamento foi aplicado via call center da CNM aos gestores municipais e alcançou 3.385 municípios, que concentram cerca de 112 milhões de habitantes, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Entre as cidades pesquisadas, 979 estão com falta de médicos, o que, na maioria dos casos, já dura mais de três meses. As prefeituras apontam como dificuldades para contratação a exigência do cumprimento da carga horária semanal de 40 horas, o salário e a escassez de recursos.

A falta de infraestrutura na cidade, como cinema, shopping e outros atrativos de lazer, foi apontado como um problema por 17 dos municípios. As gestões disseram realizar processos seletivos e editais de chamamento público para contratação de médicos.

O problema impacta majoritariamente os municípios de grande porte, embora eles sejam o menor número de respondentes do levantamento. Uma das possíveis explicações para isso é que uma grande parte dos médicos quer se dedicar somente ao trabalho na rede privada ou dividir a atuação entre a área pública e particular, conforme mostra a edição 2023 da “Demografia Médica no Brasil”.

A pesquisa também concluiu que o Programa Mais Médicos, do governo federal, “não atende o preconizado em sua origem” — a CNM cita que a falta de enquadramento para grandes municípios agrava a situação. O governo relançou o programa em março e abriu 15 mil novas vagas destinadas ao atendimento da população nas periferias dos centros urbanos e nos municípios do interior do país.

Em nota, o Ministério da Saúde informou que tem o compromisso de fortalecer a atenção primária e ampliou as vagas do Mais Médicos e os incentivos profissionais do programa.

A cidade de Guaribas (PI), que ficou conhecida nacionalmente por apresentar perspectiva de vida nos padrões de países pobres da África no início dos anos 2000, sofre com o problema. Distante 660 quilômetros de Teresina, o município que foi palco do lançamento do Programa Fome Zero, em 2003, sofre para atrair médicos — chegou a ficar sem atendimento no fim de 2018, depois que Cuba decidiu sair do Mais Médicos após as condições anunciadas pelo então presidente eleito Jair Bolsonaro.

A Prefeitura de Santarém confirmou que há dificuldades para contratação de médicos em áreas remotas. Em nota ao UOL, a gestão municipal informou que há três vagas ociosas na área urbana, porque os profissionais que atendiam ali foram classificados pelo Programa Mais Médicos e vão para áreas remotas. “A Secretaria Municipal de Saúde já está agilizando a contratação de novos médicos”, diz a nota.

O médico Marcelo Averbach, fundador da ONG Zoé, diz que a fixação de médicos em locais remotos esbarra na falta de condições para o trabalho ou relacionadas à vida familiar. “É preciso pensar em estratégias de planos de carreira para esses profissionais que se dispõem a ir trabalhar nesses locais”, diz ele, comparando o trabalho com o de juízes, que começam em comarcas menores e que migram para centros maiores com o decorrer do tempo.

O médico César Eduardo Fernandes, presidente da Associação Médica Brasileira (AMB), faz a mesma analogia e destaca a importância de um plano de carreira. “Eu acho que os médicos de atenção primária deveriam ser profissionais com carreira de Estado, mais ou menos o que existe na magistratura. Se fixa num pequeno município, mas a depender da sua vontade, do acúmulo de experiência, pode pleitear mudança para centros maiores. Ele presta um concurso e não vai ser admitido desde o início numa grande cidade, tem que fazer uma carreira.”

Para o médico Artur Oliveira Mendes, diretor de Projetos e Pesquisas do Sindicato dos Médicos de Minas Gerais, que trabalha há quase 20 anos na atenção primária, os dados de que faltam médicos de família não são uma novidade.

“Muito pouco tem sido feito para resolver os problemas que já são apontados que causam essa má fixação dos profissionais. As cidades, em sua maioria, não têm um plano de carreira. Não oferecem condições para que desempenhem bem seu trabalho. Não tem tido ações que promovam segurança dos profissionais naquelas unidades. A violência verbal é a mais comum, mas tem a violência física. Nenhum profissional vai se fixar em condições adversas”, disse.

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