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Brasil mostra desaceleração no contágio pela Covid-19, analisa Imperial College

Desde abril, é a primeira vez que a taxa de contágio no País está menor que 1 (0,98), conforme a instituição britânica; especialistas pregam cautela e evitam otimismo no decréscimo da doença.

Pela primeira vez desde abril, o ritmo de transmissão da Covid-19 está em desaceleração no Brasil. De acordo com dados do centro de controle de epidemias do Imperial College, de Londres (ING), a taxa de contágio (Rt) no País foi de 0,98, número que indica para quantas pessoas um paciente infectado consegue transmitir o novo coronavírus. Os dados foram verificados na semana que começou no domingo (16). As informações são do jornal O Estado de S.Paulo.

O dado significa que 100 pessoas contaminadas contagiam outras 98 que, por sua vez, passam a doença para outras 96. Essas contaminam 94 e assim sucessivamente, o que comprova a desaceleração do contágio. Em julho, o País apresentou taxas de 1,01, situação definida como “fora de controle”. O Brasil deixou a zona vermelha pela primeira vez depois de 16 semanas consecutivas de taxa de transmissão acima de 1.

De acordo com o virologista Eduardo Flores, da Universidade Federal de Santa Maria (RS), a nova configuração indica estabilidade da pandemia e pode apontar um decréscimo lento. “O número 0,98 ainda não permite um grande otimismo. Se ele estivesse  em 0,60, a certeza de queda seria maior. Mas existe uma leve tendência de decréscimo. Nas próximas semanas e nos próximos meses, o número de casos e mortes deve cair”, diz o especialista.

Para relativizar a importância do número, Paulo Lotufo, epidemiologista da USP, faz uma analogia com uma partida de futebol. “É uma boa notícia. Mas estamos ganhando de um a zero e ainda temos o segundo tempo para jogar”, compara. Na mesma linha, Flavio da Fonseca, virologista e pesquisador do Centro de Tecnologia em Vacinas (CT Vacinas), prefere aguardar mais algumas semanas. “É certamente uma boa notícia, mas é preciso avaliar do que mais uma semana. Essa tendência precisa ser sustentada”, diz o especialista da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

A taxa de contágio traz uma média nacional, sem abordar as particularidades de cada estado ou região. Isso precisa ser destacado, na visão dos especialistas. Existem estados, como Minas Gerais, por exemplo, que ainda apresenta alta de casos e de mortes. “Estamos olhando o Brasil como um todo. Esse é um retrato nacional. Existem regiões com alta de casos, como aqui, no Rio Grande do Sul. Nós temos várias pandemias”, complementa Flores.

Alexandre Naime Barbosa, chefe da infectologia da Universidade Estadual Paulista (Unesp) também adota um discurso cauteloso. Países como Espanha, Rússa e França haviam conseguido reduzir os índices, mas registraram nova fase de aceleração. Na América do Sul, o mesmo aconteceu com Bolívia e Equador. Na região, o Chile é o único outro país da América Latina com taxa de contágio abaixo de 1 (0,85).

“A gente deve olhar esse resultado com bastante cuidado, não é para comemorar efusivamente. Lógico que é uma notícia positiva, mas essa desaceleração pode ser apenas a descida de um platô. Pode ser uma queda momentânea mas não sustentada. Precisamos de uma queda sustentada ladeira abaixo”, compara.

Mesmo com o momento de queda, Naime alerta para a necessidade da continuidade do uso do equipamentos de proteção individual (EPIs) e do isolamento social. “Uma coisa é flexibilizar, usando máscara, mantendo distanciamento social e higiene das mãos; outra coisa é fazer aglomeração, festa, reunião, abolindo completamente o uso de máscara. Na minha equipe de infectologistas da Unesp, que está trabalhando com Covid há seis meses,  nenhum médico se infectou. Sempre estamos protegidos. (Charles) Darwin já dizia vence quem se adapta. Então, fazer reunião em bar, festa, aglomeração em locais em que ninguém está usando máscara não é flexibilização é uma irresponsabilidade que vai levar ao aumento do número de casos”, alerta.

Outros dados reforçam o momento de desaceleração da pandemia no Brasil. Esta também é a primeira vez nos últimos quatro meses em que o Brasil deixou a liderança no número de mortes semanais. Agora, o primeiro lugar está com a Índia, com 7,2 mil mortes por semana. No País, a expectativa é de 6,9 mil óbitos. Os EUA adotam uma metodologia diferente de cálculo por semana e não fazem parte do levantamento. Além disso, o Brasil deixou de ser o líder na relação de novos casos pelo total população. Com 295 novos casos na quinzena por 100 mil habitantes, a Colômbia está na ponta do ranking entre os sul-americanos.

“Já poderíamos ter chegado a esse patamar em junho se tivéssemos tido um esforço federal mais concentrado. Por outro lado, também poderíamos estar numa situação muito pior se não fossem os esforços de estados e municípios e o trabalho do SUS”, avalia Lotufo.

Platô prolongado

O Brasil é o segundo país com mais casos e mais mortes por Covid-19 no mundo. Só perde para os Estados Unidos, que somam 5.478.502 contaminações confirmadas, de acordo com dados da Universidade Johns Hopkins. O terceiro país mais afetado é a Índia, com 2.702.742 casos. Os três juntos são responsáveis por quase metade de todos os casos registrados no mundo. No final de maio, a média móvel de sete dias se aproximou de mil mortes por dia. Desde então, ou seja, há treze semanas, os números têm se mantidos próximos a esse patamar.

Eliseu Alves Waldman, professor do Departamento de Epidemiologia da Escola de Saúde Pública da USP, aponta alguns fatores que serão importantes para a formatação das curvas de mortes e de casos nas próximas semanas. “Ainda estamos vivendo o processo de interiorização da doença. Muitos municípios não têm UTI, o que ainda vai continuar pressionando as capitais. Além disso, estamos vivendo uma fase mais aguda de reabertura da economia e das atividades. Precisamos acompanhar os impactos desses movimentos”, alerta.

Especialistas apontam diferenças importantes entre as curvas de casos e morte no Brasil e na Europa. “Lá, tivemos um pico seguido de uma diminuição significativa. Aqui, tivemos um platô prolongado, com mais de mil mortes por dia durante quase três meses”, avalia Waldman.

Na opinião do especialista, essas diferenças se devem à estrutural social do País. “Nós fizemos um distanciamento social da ordem de 50% na maioria dos estados. A periferia não tem condições de fazer isolamento, o que aumenta o risco de contaminação”, explica.


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