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Autistas têm direito a benefício do INSS no valor do salário mínimo; veja como

Segundo o Ministério da Previdência, cerca de 138.889 pessoas que se enquadram dentro de algum dos Transtornos Globais do Desenvolvimento recebem pelo BPC.

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) atinge de 1% a 2% da população mundial e, no Brasil, aproximadamente dois milhões de pessoas, segundo dados publicados na agência Center of Diseases Control and Prevention (CDC) dos Estados Unidos.

Por lei, pessoas com TEA também podem ser amparadas por benefícios do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) por estarem incluídas no rol de pessoas com deficiência, logo, possuem direito a determinados auxílios, como o Benefício de Prestação Continuada (BPC). Mas, para ser um beneficiário, é necessário preencher alguns requisitos.

O BPC é um benefício assistencial, previsto na Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), de um salário mínimo (R$ 1.320) por mês para a pessoa com deficiência ou idoso, e não há restrição de uso. É importante ressaltar que os autistas apresentam sintomas em vários níveis diferentes, em outras palavras, graus de funcionalidades distintos.

É bastante comum que a pessoa com diagnóstico de TEA enfrente dificuldades para imergir na sociedade, razão pela qual a legislação determinou que sejam contemplados por proteção previdenciária.

Para solicitar o BPC (Loas) é preciso preencher alguns requisitos básicos como comprovar por meio de laudo médico — que pode ser do Sistema Único de Saúde (SUS) ou particular — que a pessoa possui o espectro, também é preciso estar inscrito no Cadastro Único (CadÚnico), junto a um Centro de Referência de Assistência Social (CRAS), comprovar renda familiar (de até 1/4 do salário mínimo), não estar recebendo outro benefício e possuir nacionalidade brasileira (nato ou naturalizado).

Além disso, precisa ser comprovada a situação de impossibilidade de prover o próprio sustento ou de tê-lo provido por sua família, acompanhado dos documentos pessoais do portador do espectro, como carteira de identidade e o CPF. Para o caso de BPC, não é necessário ter contribuído com o INSS, por isso, o benefício pode ser concedido também às crianças autistas.

A solicitação do benefício pode ser feita pelo telefone 135 ou pelo site. Através do aplicativo “Meu INSS” também é possível fazer o requerimento do Benefício de Prestação Continuada.

O advogado Wesley Santiago destaca o caso das pessoas que exercem alguma função remunerada. Ele explica que, caso o beneficiário exerça função remunerada, esse valor será acrescido no cálculo da renda familiar e com isso, essa pode ultrapassar o limite.

“Em relação a renda per capita familiar, essa sofreu uma alteração em 2022, onde em casos excepcionais, o limite da renda pode subir para meio salário-mínimo. Mas, neste caso, alguns outros requisitos são necessários: é preciso comprovar o grau da deficiência, a dependência de terceiros, condições de moradia e comprometimento do orçamento familiar com gastos médicos, ou seja, torna-se muito difícil a inclusão neste rol, visto que, um autista que consegue prover seu próprio sustento, talvez não consiga atender ao requisito em relação ao grau da deficiência, levando novamente a renda para o patamar de 25% do salário mínimo”, pontua.

De acordo com dados do Ministério da Previdência, cerca de 138.889 pessoas que se enquadram dentro de algum dos Transtornos Globais do Desenvolvimento são beneficiadas pelo BPC no Brasil. O DataSUS define o código F84, que engloba a condição do TEA, e os seus subtipos como:

“Grupo de transtornos caracterizados por alterações qualitativas das interações sociais recíprocas e modalidades de comunicação e por um repertório de interesses e atividades restrito, estereotipado e repetitivo. Essas anomalias qualitativas constituem uma característica global do funcionamento do sujeito, em todas as ocasiões”.

Já no estado do Rio de Janeiro, existem aproximadamente 156 mil Benefícios de Prestação Continuada para Pessoa com Deficiência. Segundo o INSS, “em dezembro de 2022, o tempo médio para concessão do BPC/Loas no RJ estava em 133 dias”.

Na hora de fazer a solicitação do benefício, é necessário que seja especificado o tipo de espectro no código ao qual o solicitante se enquadra. Dentro dessa classificação existem nove subtipos:
Autismo Infantil;
Autismo atípico;
Síndrome de Rett;
Outro transtorno desintegrativo da infância;
Transtorno com hipercinesia associada a retardo mental e a movimentos estereotipados;
Síndrome de Asperger;
Outros transtornos globais do desenvolvimento.

Cinthia Nascimento, advogada com atuação em direito dos autistas, aconselha que assim que a família reunir todos os documentos necessários para a solicitação do benefício, entre em contato com um profissional especializado para auxiliar durante todo o processo. “Devido a grande burocracia do sistema, recomendo que os pais procurem um advogado que trabalhe com direito previdenciário”, disse.

“Infelizmente, os servidores do INSS são preparados para analisar com o maior formalismo possível, ou seja, se a condição financeira da família for um pouco melhor do que exige o requisito da pobreza, provavelmente o benefício vai ser negado administrativamente. Para essas crianças, a solução tem sido recorrer ao poder judiciário, e através da análise das provas que a família conseguir formular dos gastos que tem com essa criança, poderá lograr êxito em conseguir o benefício”, aponta.

Segundo a advogada, a família deve procurar um advogado para conversar detalhadamente sobre a sua realidade financeira. Cada família tem uma realidade específica, com contornos muito específicos que podem gerar diferentes tipos de provas.

“A título de exemplo, o valor que a família paga de plano de saúde, quando comparado a renda familiar que recebe, pode ser uma prova fundamental, bem como os gastos com deslocamento como combustível, por exemplo, para que a criança tenha acesso às terapias. Tudo isso tem que ser rigorosamente analisado e conversado, por um profissional competente”, destaca.

Nos caso que o pedido do auxílio é negado o Instituto de Seguro Social informa que a família pode dar entrada em um Recurso Administrativo, que será encaminhado pelo INSS ao Conselho de Recursos da Previdência Social (CRPS), órgão colegiado e autônomo, integrante da estrutura do Ministério da Previdência Social, a quem compete o controle das decisões do instituto.

“Neste caso, não são os servidores do INSS que vão analisar o requerimento, mas um membro da Junta de Recursos. Outra opção para quem teve o BPC negado, é dar entrada em um novo pedido de Benefício de Prestação Continuada”, informou o órgão.

Cinthia Nascimento pondera que o solicitante deve procurar um especialista para recorrer a Justiça. “Se o benefício for negado ainda no INSS, o solicitante deve procurar um advogado para que ele promova a judicialização do caso. Caso ele seja negado já na justiça, em primeiro grau, são inúmeras as possibilidades de recursos para os tribunais superiores”, revela a advogada.

Segundo a especialista, uma das maiores dificuldades encontrada pelos seus clientes é o tempo de análise para a concessão do benefício. “Não é por acaso que essas famílias solicitam esses benefícios. Geralmente, são pessoas que estão com dificuldades extremas para manter o seu sustento e o tratamento do seu filho autista”.

“Se o benefício é solicitado de maneira indevida e sem instrução, ele pode perdurar por um tempo mais longo que o necessário. Ou seja, uma análise que poderia durar entre 6 e 8 meses, pode levar mais de um ano. E nesse período essas famílias continuam muitas vezes correndo risco do que se convencionou chamar de insegurança alimentar”, acrescenta.

Nascimento ainda chama a atenção para as pessoas que encontram dificuldade no acompanhamento do requerimento. Principalmente quem busca o benefício sozinho, porque geralmente não sabe que tem que ficar atento às etapas do procedimento.

“O sistema da internet não é de fácil acesso ao público com baixo nível de escolaridade. E dar preferência pelo atendimento através do número de atendimento é muito problemático. As ligações só são gratuitas quando você liga através de um telefone fixo, prática que está em desuso hoje em dia. O meio mais comum de acessar ligações é através das linhas de telefone móvel, e quando se recorre esse meio, essas pessoas gastam até R$ 50,00 em 15 minutos de ligação. Essa forma de atendimento precisa urgentemente ser revista pelas autoridades públicas”, pondera.

Já Wesley Santiago destaca que a falta de inclusão e atenção a casos específicos pelo sistema acabam prejudicando muitas pessoas que precisam ser atendidas pelo benefício. “A inclusão, por si só, já é uma grande dificuldade, sem contar a dificuldade que os autistas ainda encontram em relação ao diagnóstico correto e preciso, laudos e etc”.

“A maioria dos meus clientes enfrenta uma enorme dificuldade em relação aos indeferimentos de pedidos junto ao INSS, no geral. Há uma grande limitação do sistema para análise de casos isolados, casos que não se enquadram 100% nos requisitos, que não podem ser analisados de uma maneira geral e precisam de análise específica”, aponta o advogado.

Para evitar ter algum tipo de problema em relação ao benefício, o especialista aconselha “manter sempre laudos e exames médicos atualizados”, assim como “ter sempre documentado tudo sobre medicamentos, consultas médicas e demais despesas de saúde”, além dos ddos atualizado no CadÚnico, isso pode ajudar em algumas situações.
“Busque sempre informações e atualizações quanto aos seus direitos e os direitos de seus familiares. Quando tiver dúvidas, ou achar que algum direito possa estar sendo violado, não hesite em contatar o seu advogado de confiança”, conclui Santiago.

Cinthia Nascimento aconselha mais conscientização na hora de escolher os representantes políticos. “Julgo que é importante saber votar bem, em pessoas que se comprometam com a causa das crianças e adolescentes autistas. Pessoas que levem ao conhecimento do público e dos políticos brasileiros as dificuldades que essas famílias passam”, afirma.

Kelvin Batista de Oliveira, de 25 anos, é autista e beneficiado pelo BPC há 17 anos. Sua mãe, Genilsa Henrique Batista, 59, conta que ficou sabendo do auxílio através da assistente social da escola em que seu filho estudava e por conhecidos. “Não tinha fonte de renda, necessitava, daí dei entrada. Tem ajudado em tudo, o pai dele deixou de pagar pensão há mais de 13 anos, nem a justiça o acha”, explicou.

A dona de casa ainda disse que Kelvin realiza todo o seu acompanhamento terapêutico pelo Sistema Único de Saúde e que, como não pode trabalhar para dar assistência ao jovem, utiliza o dinheiro do benefício para ajudar com as contas básicas como luz, água, alimentação, roupas e etc.

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