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Amazonas

MPC investiga relação da política do Estado do Amazonas com desmatamento e queimadas ilegais

O procedimento diz que que não há transparência sobre a devida gestão de risco e governança no âmbito da Sepror de modo a evitar que as palavras, ações e medidas não sirvam de fomento a grileiros.

O procurador do Ministério Público de Contas (MPC) do Amazonas Ruy Marcelo de Mendonça instaurou procedimento para apurar a legalidade e legitimidade das ações da Secretaria de Produção Rural (Sepror) no incentivo à agropecuária no sul do Estado e sua eventual relação com o desmatamento e queimadas ilegais, com destaque para a região do Distrito de Matupi, no município de Manicoré.

O procurador considera a política de incentivo à pecuária e agricultura no município, pelo sistema Sepror, que, no último dia 20 de agosto de 2020, fez circular amplamente nas mídias a notícia de distribuição de implementos agrícolas à Associação dos Produtores Amigos de Santo Antônio do Matupi (Apasam), para atender os pequenos e médios produtores locais, associados ou não, com o sistema mecanizado de preparação do solo para a próxima safra a partir de setembro.

Ele cita informações de satélite onde o município de Manicoré, no sul do Amazonas, figura como município brasileiro com maior número de queimadas ilegais em 20 de agosto de 2020, estudo da Nasa indicando que a maior parte das queimadas corresponde a consequência imediata de desmatamento ilegal na Amazônia, e as elevadas taxas anuais de desmatamento ilegal no município de Manicoré na série histórica, que equivalente a mais de 11 mil campos de futebol.

O procedimento diz que que não há transparência sobre a devida gestão de risco e governança no âmbito da Sepror de modo a evitar que as palavras, ações e medidas não sirvam de fomento a grileiros, desmatadores ilegais e produtores irregulares da agropecuária nociva, em detrimento do fomento estadual devido exclusivamente às iniciativas dotadas comprovada sustentabilidade.

História

Bem ao sul do estado do Amazonas, perto das fronteiras de Rondônia e Mato Grosso, o vilarejo de Santo Antônio do Matupi, à beira da BR-230, a Transamazônica, é também conhecido pelo apelido de 180, em referência ao quilômetro da rodovia em que se localiza.

Matupi registra uma das maiores taxas de desmatamento do Amazonas, o que explica o disparate entre sua pequena população em comparação com sua abundante atividade econômica. Nas madeireiras, a fumaça sai das chaminés de grandes fornalhas e árvores gigantescas transformam-se em pilhas de madeira. A estrada é poeirenta quando faz sol e barrenta quando chove, mas o trânsito de caminhões carregando gado e madeira não para.

A origem do vilarejo reflete uma história comum da Amazônia nos últimos 50 anos. Os primeiros moradores chegaram junto com a Transamazônica, nos anos 1970, atraídos pela oferta infinita de terras. Naquela época, para ganhar o título de propriedade bastava marcar uma área e desmatá-la. Em 1995, o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) criou o assentamento Santo Antônio do Matupi, que deu nome à localidade e atraiu migrantes vindos principalmente do sul do país.

Moradores contam que Matupi já teve mais de 50 madeireiras, a maioria ilegais. Os altos índices de desmatamento colocaram o distrito no radar da fiscalização ambiental. Houve operações do Ibama em 2009 – quando o órgão apreendeu 160 caminhões de madeira – em 2011 e 2013. Outras 9 ações de fiscalização ocorreram desde 2017. A mais recente foi em setembro de 2019, quando duas serrarias foram desmontadas. A repressão não conseguiu acabar com a atividade, mas reduziu o número de madeireiras à metade. Hoje, segundo o Ibama, existem 26 autorizadas no distrito.

Nem por isso a economia de Matupi parou de crescer. Faz alguns anos, a pecuária tomou a frente como principal atividade econômica. O distrito concentra praticamente todo gado de Manicoré – mais de 115 mil cabeças – o que o torna o quarto maior rebanho do Amazonas. Entre 2004 e 2018, o número aumentou 800%, passando de 12,8 mil para 115 mil animais. No mesmo período, foi desmatada uma área equivalente a 82 mil campos de futebol.