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Amazonas

Justiça do Amazonas torna sem efeito contrato da prefeitura de Itapiranga para show de cantor nacional

Juíza considerou que o Município não oferece o mínimo em serviços públicos essenciais à população e que o pagamento no valor de R$ 180 mil reais por um único show redunda em prejuízos.

Itapiranga, Amazonas. (Foto:Reprodução)

A juíza Tânia Mara Granito, titular da Vara Única da Comarca de Itapiranga (distante 222 quilômetros de Manaus) acolheu Pedido de Tutela de Urgência em Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público do Amazonas (MPE/AM) e determinou, liminarmente, que seja tornado sem eficácia o ato de contração do show de Tierry Produção Artísticas Ltda, efetuado pela Prefeitura do Município, e marcado para este mês.

Conforme narrado pelo Ministério Público, a referida contração foi feita por meio de dispensa de licitação, no valor de R$ 180 mil. “Defiro o pleito antecipatório vindicado e concedo a tutela antecipada, com base no art. 300 do Código de Processo Civil, para determinar: ao Município de Itapiranga e a outro requerido que suspenda a realização do show do cantor conhecido como “Tierry”, marcado para ocorrer entre os dias 24 e 25 de julho de 2022 e, ainda, está vedada a contratação de outra atração artística dessa magnitude; e a obrigação de não fazer ao Município consubstanciada em se abster de ordenar e efetuar quaisquer pagamentos, se ainda não realizados, com recursos públicos para o dito show”, diz trecho da decisão da magistrada.

A juíza fixou multa diária no valor de R$ 50 mil em caso de descumprimento da liminar, a ser cobrada na pessoa da prefeita do Município. Na Ação Civil Pública, o MPE/AM argumenta que “diante da situação de inúmeros compromissos com direitos sociais essenciais não atendidos especialmente nas áreas de saúde, educação e infraestrutura, não se justificando o custeio de show de R$ 180.000,00 para o artista” pelo Município.

Sobre o pedido do órgão ministerial, a magistrada registra, no texto da decisão liminar, que “(…) Da análise minuciosa de todos os documentos acostados verifico que, de fato, o Município de Itapiranga/AM não oferece o mínimo em serviços públicos essenciais a sua população e a ocorrência do pagamento de RS 180.000,00 por um único show no contexto, redunda em prejuízos e impossibilidade de cumprimento de vários direitos essenciais. Com isso a probabilidade do direito está, em sede de cognição sumária, devidamente demonstrada”.

A juíza Tânia Mara destaca, ainda, que os atos administrativos submetem-se ao controle jurisdicional justificado, “inclusive, pelo sistema de freios e contrapesos estabelecido na Constituição Federal que viabiliza o controle das atividades de poder por cada um deles respectivamente, de forma a evitar abusos no exercício de qualquer esfera”, acrescentando que “mesmo atos discricionários, como a alocação de receitas nas diversas necessidades experimentadas pela comunidade, demandam obediência a parâmetros mínimos a respaldar a sua vinculação aos princípios reinantes no ordenamento jurídico pátrio”.

Ao citar o art. 37 da Constituição Federal, segundo o qual a administração pública direta e indireta obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, a titular da Comarca de Itapiranga abordou ainda a premissa da proporcionalidade, de que se vale o Poder Judiciário como forma de verificação da constitucionalidade dos atos administrativos, e como instrumento de defesa dos direitos e das garantias fundamentais.

“Ainda sob análise sumária dos fatos, percebo prima face que todos os princípios citados alhures encontram-se vilipendiados”, afirma a magistrada acerca do ato de contratação promovido pela Administração Municipal. “Verifico, en passant, que os gastos com o show se equivalem a grande parte dos recursos públicos transferidos para o Município, a fim de viabilizar o cumprimento de vários direitos essenciais de toda uma comunidade, como saúde, educação, investimento em infraestrutura local, dentre outros”, registra ela na decisão.

Ao destacar a importância de proporcionar à população momentos de lazer, inclusive após o período de distanciamento social imposto pela pandemia da covid-19, a juíza Tânia Mara ponderou, no entanto, que a programação, como se encontra elaborada, “apresenta aparente desvio de finalidade em razão da desproporção dos valores vertidos conforme amplamente fundamentado” na ação proposta pelo Ministério Público.