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Participação nos atos golpistas pode levar a demissão por justa causa? Entenda

Postagens nas redes sociais também podem servir como prova para desligamento, avaliam especialistas.

Atos golpistas em Brasília, no dia 8 de janeiro. (Foto:Reprodução)

Os atos antidemocráticos no Congresso Nacional, Palácio do Planalto e no Supremo Tribunal Federal (STF) ocorridos no último domingo, dia 8, além de ocasionar centenas de prisões, podem acabar levando trabalhadores envolvidos no episódio a serem demitidos por justa causa de seus empregos. É o que apontam advogados especializados na área consultados pelo jornal O Globo.

Mas de que forma essa demissão poderia ser justificada? Quais direitos o trabalhador perde nesta condição? A demissão por justa causa vale também para servidores públicos? Tire suas dúvidas:

Quebra de confiança

Jorge Matsumoto, sócio do Bichara Advogados, entende que a demissão por justa causa nessa situação pode encontrar respaldo na legislação porque se trata de ofensa à ordem pública na Constituição Federal e quebra de fidúcia (confiança) diante da gravidade da conduta.

Para que a demissão por justa causa por essa razão ocorra, contudo, é preciso que o empregador tenha provas de que o trabalhador participou dos atos.

— Basta a comprovação de destruição de patrimônio público por meio de qualquer instrumento de mídia — lembra Matsumoto.

Na avaliação de Marta Alves, sócia do Galdino & Coelho, Pimenta, Takemi, Ayoub Advogados, porém, não é tão simples que seja aplicada justa causa quando se trata de empregados de empresas privadas.

Ela explica que o artigo 482 da CLT prevê a justa causa quando o empregado cometer crime, mas somente após ser condenado e não houver mais recurso (quando transitada em julgado a sentença condenatória). E quanto aos demais trechos do artigo, Marta explica que os tribunais regionais do trabalho e o Tribunal Superior do Trabalho (TST) entendem que se referem a faltas graves praticadas no trabalho ou em decorrência dele:

— Até é possível aplicar justa causa por ato do empregado praticado fora do trabalho, mas somente se esse ato possuir alguma ligação entre o empregado e seu local de trabalho ou seu empregador.

Para Renata Cavalcante, sócia do escritório Neto Cavalcante Sociedade de Advogados (NCSA), estes casos podem ser enquadrados em três das situações listadas pela CLT: má conduta, ato contra a segurança nacional ou contra a honra, e boa fama do empregador. Mas deve-se analisar a “proporcionalidade da participação do empregado nos fatos”:

— É preciso ter cautela e avaliar se o funcionário de fato participou dos atos ou apenas estava ali como “curioso”. Uma vez identificada a efetiva participação do empregado em atos violentos e ilegais, dos quais possam decorrer a vinculação da imagem do empregador a tais ações, além de prejuízos à sua reputação, a rescisão do contrato por justa causa pode ser aplicada.

Outros elementos devem ainda ser levadas em consideração, lembra Renata:

— Outra análise é que se o ato que o empregado pratica é de uma natureza tão grave que torna a convivência com os seus colegas ou a confiança do empregador impossível de manter, apesar de esses atos não resultarem em prejuízo efetivo ao empregador, sendo, recomendável uma demissão sem justa causa.

E o servidor público?

Quanto ao servidor público, a avaliação geral de especialistas é que este pode ser punido com a demissão por justa causa em razão da lei nº 8.112/90, que dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos. Entre os deveres dos servidores está o zelo pelo patrimônio público e a manutenção da conduta compatível com a moralidade administrativa.

Segundo Marta Alves, o artigo 132 permite a demissão por justa causa quando o servidor causar lesão aos cofres públicos e dilapidação do patrimônio nacional.

Antes de aplicar qualquer penalidade, no entanto, o órgão no qual o servidor é lotado deve instaurar processo administrativo para investigar a participação nos atos terroristas. Na avaliação do advogado Bruno Navega, especializado em Direito Público, a exoneração do cargo por justa causa pode ocorrer se for atestada participação direta ou indireta nos ataques, incluindo incitar os movimentos, que levaram à dilapidação do patrimônio público. Ele afirma que, se houver interesse da administração, um processo administrativo pode ser concluído em até 120 dias.

Na interpretação de Navega, se houver prova de que o servidor esteve dentro de pelo menos uma das sedes dos Três Poderes, depredadas nos ataques, é possível enquadrar, no mínimo, como coautoria e incitação aos atos. Caso contrário, valeria reunir mais provas para sustentar a acusação.

Além da demissão do serviço público, penalidade máxima e apontada por juristas como a mais cabível neste caso, o processo administrativo também pode levar a resultados mais brandos, como o recebimento de advertência por escrito ou a suspensão das atividades por um período de até 90 dias.

Para apurar o envolvimento de servidores públicos nos ataques terroristas de domingo, a Controladoria-Geral da União recomendou, nesta segunda-feira, que órgãos federais instaurem processos administrativos para investigar denúncias de participação de integrantes do funcionalismo no movimento. A CGU afirma que funcionários engajou nos atos “atentaram contra os deveres de lealdade às instituições e de moralidade administrativa e, principalmente, contra o Estado Democrático de Direito”.

A controladoria informou, ainda, que vai instaurar e coordenar as investigações caso não haja movimento por parte do órgão competente ou se for atestado que a apuração não estaria correndo como deveria. A CGU recebe denúncias pelo Fala.BR, e criou a tag “Atos terroristas de 8 de janeiro” para facilitar o compilado de informações pelo órgão.

O que pode servir como prova?

Especialistas consideram que postagens nas redes sociais — fotos e vídeos — e até documentos oficiais que comprovem que o trabalhador participou dos atos golpistas servem como provas para demissão por justa causa. No entanto, não há consenso sobre alguns aspectos da publicação.

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Para a advogada Marta Alves, somente seria possível aplicar justa causa na hipótese de o próprio empregado expor o empregador.

— Como por exemplo, se ele se identificasse na mídia ou em redes sociais como empregado da empresa X naquele ato — explica.

Demissão imediata

Por outro lado, especialistas são unânimes ao frisar que, uma vez feita a comprovação de participação nos atos golpistas, a demissão por justa causa deve ser realizada imediatamente após a ciência do empregador, “sob pena de perder a imediatidade da justa causa”, lembra Matsumoto.

Isso porque a justiça considera que a justa causa fica fragilizada caso o empregador tome conhecimento da falta cometida pelo empregado e não aplique a punição.

Renata Cavalcante, sócia da NCSA, alerta que, para que a justa causa seja aplicada sem que se torne uma dor de cabeça ao empregador, é importante que se tenha provas suficientemente claras sobre a participação de seu colaborador nos atos, além de avaliar o impacto que a imagem do mesmo pode causar ao negócio

— Caso contrário, sem que tudo esteja bem documentado, o funcionário pode reverter judicialmente a dispensa.

Direitos perdidos

Diferente da demissão sem justa causa – que é um direito do empregador independentemente da vontade da outra parte -, na demissão por justa causa, o trabalhador perde uma série de direitos. Veja a seguir quais são:

Não terá direito a multa rescisória de 40% do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS)
Não poderá sacar o FGTS que está depositado em sua conta vinculada
Não terá direito a férias e 13º
Não terá direito ao seguro-desemprego


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