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Amazonas

Pesquisa: poluição em Manaus afeta chuvas e fotossíntese na Amazônia

Uma das soluções para amenizar os danos da poluição urbana de Manaus na floresta amazônica, segundo os pesquisadores, é investir em tecnologias limpas de transporte urbano e de produção de energia renováveis.

A poluição emitida no ar diariamente em Manaus tem alterado a composição química da atmosfera da floresta amazônica, modificando a formação de nuvens, a ocorrência de chuva, a incidência de luz solar na mata e o processo de fotossíntese da vegetação, atividades essenciais ao ecossistema da Amazônia. As informações são da BBC Brasil.

A descoberta é de um grupo de pesquisadores brasileiros, alemães e americanos do GoAmazon 2014/2015, um projeto científico internacional que estuda como as mudanças promovidas pelo homem no meio urbano afetam a atmosfera limpa da região amazônica.

“Buscamos entender a transição que ocorreu entre as condições primitivas nos tempos pré-industriais para as condições atuais, impactadas pelas emissões urbanas”, conta o professor Henrique Barbosa, do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (IF-USP), integrante do GoAmazon.

Em março, 36 cientistas do GoAmazon, entre eles oito brasileiros, publicaram artigo na revista Nature Communications explicando por que, apesar de ser uma das poucas regiões continentais que ainda conservam uma atmosfera limpa semelhante a situações pré-industriais, o ar da Amazônia tem apresentado elevados níveis de aerossóis secundários (SOA), gases atmosféricos altamente poluentes e tóxicos ao meio ambiente e à saúde das pessoas.

“Ao observar o entorno de Manaus, cidade cercada por 1.500 quilômetros de floresta pristina (virgem), constatamos que os ventos conseguem carregar e espalhar a poluição urbana metropolitana sobre centenas de quilômetros da Amazônia”, explica Barbosa, que é um dos autores do artigo.

Uma vez em contato com o ar extremamente limpo da Amazônia, as partículas dos poluentes urbanos reagem com compostos orgânicos voláteis produzidos naturalmente pela floresta, formando altos níveis de aerossóis secundários.

“As emissões urbanas são compostas de poluentes gasosos e material particulado. Por meio de uma complexa química atmosférica, essas emissões influenciam a formação natural de aerossóis secundários na floresta, aumentando a quantidade de material particulado naquela atmosfera limpa”, explica Barbosa.

Em outras palavras, ao sofrer interferência das emissões urbanas, a própria floresta, que já produzia naturalmente níveis baixos de aerossóis, passou a produzir altos níveis do aerossol secundário, modificando a composição química natural da sua atmosfera.

O aerossol secundário – formado por partículas que podem ser sólidas, líquidas ou gasosas – age para desequilibrar a formação de chuvas na região da mata. “Essas partículas têm impacto na convecção (quando um fluído, como a água ou o ar, é aquecido e seu tamanho é expandido), formação e desenvolvimento de nuvens”, afirma Barbosa. Ele explica que, quanto maior a taxa desses aerossóis no ar, mais partículas ultrafinas vão compor as nuvens, o que dificulta a condensação do vapor d’água. Como resultado, demorará mais tempo para as chuvas se formarem.

Além dessa interferência, as partículas também participam do “balanço radiativo (troca de calor entre o planeta e a atmosfera) e da transmissão de radiação solar da atmosfera para as folhas”, afirma Barbosa. Por isso, quanto mais partículas do aerossol secundário houver na atmosfera, mais difícil será para a luz do sol alcançar as camadas mais baixas da floresta. Tal fator diminui a quantidade de energia disponível para as folhas mais baixas, já que as plantas dependem da absorção da radiação solar para a fotossíntese.

O próximo passo do estudo do GoAmazon, programado para ocorrer em 2020, será entender em detalhes os efeitos desses aerossóis tóxicos para as florestas tropicais. Com isso, o grupo pretende aprofundar o entendimento da comunidade científica sobre o papel das florestas tropicais nas mudanças climáticas globais.

“Nosso estudo se aplica a outras regiões de florestas tropicais no mundo, existentes na África e Sudoeste da Ásia. Ou seja, os mesmos processos devem estar acontecendo em todas as florestas tropicais que sofrem influência de poluição produzida pela atividade humana”, pontua Barbosa, se referindo a outras gigantes tropicais, Floresta do Congo, na África Central, e Floresta da Indonésia, na Ásia.

Laboratório a céu aberto

Fundada em 1669 no coração da floresta amazônica – em outubro a cidade fará 350 anos – Manaus passou por um intenso processo de urbanização e industrialização na década de 1960, com a criação da Zona Franca de Manaus, uma área de livre comércio de importação e exportação e de incentivos fiscais estabelecida com a finalidade de criar no interior da Amazônia um centro industrial, comercial e agropecuário.

“Com a criação da Zona Franca, a população de Manaus passou a aumentar 40% a cada 10 anos desde a década de 1960. Hoje, a capital reúne mais de 2 milhões de habitantes e cerca de 710 mil veículos, um aumento da frota de 250% na última década”, aponta Barbosa, citando dados do IBGE de 2019.

Atualmente, a zona franca manauara é um dos maiores polos industriais do Brasil, reunindo aproximadamente 600 indústrias, cercadas por importantes rios para a floresta, como o Rio Negro e o Rio Solimões, e por vegetação amazônica.

Soluções

Uma das soluções para amenizar os danos da poluição urbana de Manaus na floresta amazônica, segundo os pesquisadores, é investir em tecnologias limpas de transporte urbano e de produção de energia renováveis.

De acordo com a tese de doutorado de 2018 desenvolvida no Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia (Inpa), intitulada “Efeitos da mudança de combustíveis das usinas termelétricas de Manaus na qualidade do ar”, cerca de 65% da produção de energia em Manaus se dá a partir do gás natural.

Antes da chegada do gás natural, o estudo mostrou que as termelétricas da região metropolitana manauara emitiam 16 toneladas de monóxido de carbono e 129 toneladas de óxidos de nitrogênio por dia. Com 65% da produção de energia a partir do gás natural, as emissões caíram para 12 toneladas de monóxido de carbono e 52 toneladas de óxidos de nitrogênico.

Se 100% da energia gerada em Manaus fosse substituída por gás natural, segundo os resultados do estudo, as emissões de óxidos de nitrogênio e gás carbônico diminuiriam em 89% e 55%, respectivamente. A mudança total para gás natural na matriz energética também reduziria as concentrações máximas de ozônio em mais de 70% nos dias mais poluídos, quando as concentrações desse gás são maiores.


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