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Espanha aprova a lei da eutanásia e se torna o quinto país do mundo a regulamentá-la

Somente poderão fazer o pedido pessoas que “sofram de uma doença grave e incurável ou uma condição grave, crônica e incapacitante

Espanhóis pedem lei sobre eutanásia(Foto: Andrea Comas/El País)

A Espanha se juntou nesta semana à Holanda, Bélgica, Luxemburgo e Canadá como um dos primeiros países do mundo a regulamentar a eutanásia. A Câmara dos Deputados, com 202 votos a favor, 141, contra e duas abstenções, aprovou a lei apresentada pelo PSOE, que entrará em vigor dentro de três meses.

>Para solicitar a eutanásia, a pessoa terá que “sofrer de uma doença grave e incurável ou de um quadro grave, crônico e incapacitante” que lhe cause “sofrimento intolerável”. Embora tenha sido retirada do título da proposta durante o debate parlamentar, a norma regula tanto a própria eutanásia ―“administração direta de uma substância ao paciente pelo profissional de saúde competente”― como o que tem sido chamado de suicídio medicamente assistido ―”a prescrição ou fornecimento ao paciente, pelo profissional de saúde, de uma substância para que ele próprio possa administrá-la, causando a própria morte”.

Com a aprovação da norma, a Espanha passará a integrar um breve grupo de países nos quais a eutanásia é regulamentada. Em Portugal, o Tribunal Constitucional se opôs à lei, enquanto na Colômbia a prática é legal, de acordo com uma sentença do Tribunal Constitucional, mas não está regulamentada. Na Nova Zelândia está prevista a entrada da lei em vigor em novembro. Em partes dos Estados Unidos e da Austrália, a prática também é permitida.

Processo garantista

Na comparação com as demais leis em vigor, a espanhola, muito mais garantista, estabelece uma série de etapas que podem atrasar o processo em mais de um mês, a partir do momento em que o paciente o solicita. Este começa com o pedido da parte afetada, que deve ser manifestado por escrito duas vezes em 15 dias. Neste requerimento tem que ficar claro que a decisão não é “o resultado de nenhuma pressão externa”. Além disso, para garantir que seja a clara vontade do solicitante, este deve ter disposto por escrito “as informações que existem sobre o seu processo médico, as diferentes alternativas e possibilidades de ação, entre as quais o acesso a cuidados paliativos integrais incluídos no portfólio comum de serviços e atendimentos a que tem direito nos termos da regulamentação sobre cuidados a dependentes”.

Uma vez iniciado o processo, o interessado pode mudar sua decisão a qualquer momento e, uma vez que receba a autorização pertinente, adiar sua aplicação pelo tempo que desejar. A partir da segunda solicitação, o médico do paciente deverá encaminhar o pedido à comissão regional correspondente, que definirá os dois profissionais, fora do caso, que examinarão a solicitação. Posteriormente, a comissão aprovará ou rejeitará a decisão desses dois especialistas. A lei não fixa a composição desta comissão, que será determinada por cada comunidade autônoma, apenas especifica que deve ser composta por, no mínimo, sete pessoas, com especialistas médicos, jurídicos e de enfermagem. Essa comissão deve responder ao pedido em 19 dias.

Emoção e alívio

A norma foi encaminhada pela bancada socialista, mas teve forte impulso de parentes de pessoas que pediram ajuda para morrer, agrupadas pela plataforma Change.org, que há pouco mais de um ano apresentou um milhão de assinaturas em favor dos iniciativa: as famílias de Maribel Tellaetxe, que pediu ao marido e aos filhos que a ajudassem a morrer quando o mal de Alzheimer a fez esquecer seus nomes; de María José Carrasco, a mulher com esclerose múltipla avançada cujo marido é processado por lhe fornecer medicamentos para o suicídio e, entre outras, Asun Gómez, mulher de Luis de Marco, que morreu após mais de um mês de agonia até conseguir uma sedação terminal . “Hoje vou para a cama deixando um peso para trás”, disse antes da sessão Danel Lorente, filho de Maribel, em frente à escadaria da Câmara. “É uma emoção e um alívio”, acrescentou seu irmão David. “Amatxu não pôde desfrutar este direito.”

“Tive que escutar me chamarem de assassina, mas esta luta também é uma forma de amor”, disse Asun Gómez. “No total, 87% dos cidadãos apoiam a eutanásia, e isso sem contar que há quem a faça sem ousar dizer”, insistiu, referindo-se a pesquisas como as da Metroscopia, que confirmam um apoio crescente e sustentado à medida.

Os interessados não puderam acompanhar o debate da galeria de convidados em razão das medidas de segurança contra a covid-19. O debate já passou no Legislativo, com PP, UPN e Vox pedindo uma lei de paliativos que nenhum apresentou e afirmando que com esta norma se legaliza o assassinato. E os demais, apoiando o texto com nuances no sentido de que o direito a uma vida digna deve estar vinculado ao de uma morte digna. O Vox já anunciou que vai apelar contra a norma no Tribunal Constitucional e avisou que, se chegar ao poder, irá revogá-la.

A norma teve a rejeição da Ordem dos Médicos, que alerta que vai fiscalizar a forma como é regulamentada a objeção de consciência dos profissionais e afirma que a eutanásia não é um ato médico, embora a lei preveja que é um direito convertido em um benefício do sistema de saúde. O Comitê de Bioética da Espanha também discorda que seja considerada um direito.

Os defensores da lei também não acreditam que seu trabalho esteja concluído. Asun Gómez expressou seu temor de que as comissões regionais tenham vieses que tornem mais fácil em alguns lugares receber a ajuda solicitada do que em outros. Ángel Hernández, o marido de María José Carrasco, a quem ele ajudou a morrer, aponta na mesma direção: “Agora nos resta a implementação”, observa.

O presidente da associação Direito de Morrer Dignamente (DMD), Javier Velasco, declarou que a lei “vai poupar muito sofrimento a muita gente. Poucas eutanásias serão pedidas, mas a lei vai beneficiar toda a sociedade”. Em países onde a eutanásia é legal, informa a DMD, sua prática é responsável por entre 1% e 4% de todas as mortes anuais. “Em um ano normal (sem uma pandemia) na Espanha morrem pouco mais de 420.000 pessoas, então é razoável estimar que entre 4.000 e 17.000 pessoas decidam antecipar sua morte a cada ano, uma vez que a lei seja estabelecida. A experiência internacional sugere que os números serão menores no início e aumentarão à medida que o conhecimento sobre a lei for crescendo entre os cidadãos, os profissionais de saúde e as próprias administrações.’

Com informações do El País.


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