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Trump e Biden trocam ataques pessoais com menos agressividade em último debate antes da eleição

O presidente dos EUA e o candidato democrata à vaga na Casa Branca responderam, principalmente, questões sobre a pandemia da Covid-19, racismo e negócios obscuros de ambos no exterior.

Donald Trump e Joe Biden se enfrentaram na noite desta quinta-feira (22) no segundo e último debate antes da eleição, num duelo menos agressivo e mais controlado do que o primeiro encontro, no fim de setembro, mas que não deixou de ser marcado por ataques pessoais e críticas duras entre os dois candidatos.

Após um primeiro debate caótico, lembrado pela agressividade e interrupções contínuas, houve mudanças nas regras para esta quinta, incluindo a possibilidade de o microfone dos candidatos ser desligado durante a resposta inicial de dois minutos do adversário em cada um dos temas.

A moderadora Kristen Welker conseguiu controlar o debate ao mesmo tempo em que fez perguntas duras. Como mulher negra, levantou a discussão sobre racismo nos EUA, elencando diversas vezes em que Trump criticou o movimento Black Lives Matter ou se envolveu com supremacistas brancos.

O presidente se defendeu: “Sou a pessoa menos racista neste recinto”.

Em seguida, o presidente questionou Biden —junto com a moderadora— sobre leis anticrime que o democrata apoiou nos anos 1980 e 1990, e que atingiram desproporcionalmente a população negra.
“Foi um erro”, admitiu Biden. “As pessoas não devem ir para a cadeia por terem um problema com álcool ou drogas”, completou o ex-vice de Barack Obama.

Além da questão racial, a pandemia do coronavírus e acusações mútuas sobre possíveis ligações obscuras dos dois políticos com negócios no exterior foram a principal tônica do debate.

Em um dos ataques mais agudos sobre a condução errática e ineficaz do presidente diante da pandemia que já matou mais de 222 mil pessoas nos EUA, Biden afirmou que o povo americano não está aprendendo a lidar com o vírus, como diz o republicano, mas a morrer com ele, e pediu a responsabilização do presidente.

“Ele [Trump] diz que estamos aprendendo a viver com isso, mas as pessoas estão aprendendo a morrer com isso”, afirmou o democrata.

Trump respondeu que acatava a responsabilidade, para em seguida repetir a ideia de que o vírus veio da China, e que não tem culpa sobre a tragédia de saúde pública. “Assumo total responsabilidade. Não é minha culpa que esse vírus chegou, é culpa da China”, disse o presidente.

Biden subiu ao palco com a missão de não deslizar ao defender sua ampla liderança na corrida, que chega em média a dez pontos, enquanto Trump buscava o que poderia ser sua última chance de mudar a narrativa da campanha e conseguir uma virada histórica rumo à reeleição.

“Vocês sabem quem eu sou, sabem quem ele é, conhecem meu caráter e minha reputação por falar a verdade”, disse Biden resumindo sua estratégia. Trump rebateu: “Vocês sabem que ele é um político corrupto”.

Quando o democrata disse como lidaria com a reforma do sistema judicial, o republicano criticou: “Por que você não fez [enquanto estava no poder]? Você teve oito anos com Obama. Sabe por quê, Joe? Porque você só fala e não faz”.

A 12 dias do pleito, não deve haver outro momento em que os poucos eleitores ainda indecisos —menos de 5%— se voltarão com tanta atenção às mensagens do presidente e de seu adversário, em uma disputa polarizada, na qual cerca de 47 milhões de pessoas já votaram de forma antecipada.

Segundo o site FiveThirtyEight, que compila as principais pesquisas dos EUA, Biden tem 52,1% ante 42,2% de Trump. O democrata também lidera em vários estados considerados chave para a vitória no Colégio Eleitoral, sistema indireto que escolhe o presidente americano.

Em contrapartida aos ataques mais severos de Biden no âmbito da pandemia, Trump acusou o rival de enriquecer de forma ilícita e se esconder no porão durante os picos da crise, enquanto o democrata disse que nunca pegou dinheiro de países estrangeiros e atacou o presidente por não divulgar suas declarações de imposto de renda ou esclarecer seus negócios com a China.

“Acabei de pagar bilhões de dólares aos nossos produtores”, disse Trump, falando sobre regulações de comércio exterior e alegando que o dinheiro estava sendo pago pela China. “Dinheiro do contribuinte”, retrucou Biden, sem perder tempo.

“Nunca peguei dinheiro de nenhum país”, disse Biden, defendendo-se. “Você não mostrou nenhum ano da sua declaração de impostos de renda. O que está escondendo? Os países estão te pagando muito, a China está te pagando, a Rússia está te pagando, a China está te pagando.”

O presidente disse ainda que a família do democrata “era como um aspirador de pó, pegando dinheiro de todo lado”, e Biden respondeu: “Isso não é sobre a família dele ou minha família. É sobre a sua família”, tentando retomar a pauta da pandemia, uma seara em que Trump leva desvantagem.

“Divulgue suas declarações de impostos de renda ou pare de falar sobre corrupção”, completou o ex-vice-presidente.

A tática de Trump era explorar mais uma vez o envolvimento de um dos filhos do democrata, Hunter Biden, em uma empresa de gás na Ucrânia. Como era esperado, o presidente incluiu no bojo de seus ataques a reportagem do tabloide New York Post, divulgada na semana passada e envolta em controvérsias.

O artigo sugere que Biden usou o cargo de vice-presidente para enriquecer seu filho Hunter. O tabloide, que pertence a Rupert Murdoch desde 2007, baseou o texto em fotos e documentos que, segundo a publicação, foram tirados de um laptop que supostamente pertencia a Hunter.

O jornal The New York Times, por sua vez, revelou que a reportagem foi escrita por um repórter do tabloide que se recusou a assiná-la porque tinha dúvidas sobre a credibilidade da apuração.

Auxiliares diziam que Trump não deveria repetir o desempenho raivoso do primeiro debate, que não agradou para além de sua base eleitoral cativa, e o presidente chegou a dizer que poderia mudar a postura.

Mas mesmo seus assessores não acreditavam que ele abriria mão de sua habitual estratégia diversionista, defendendo seu governo com informações falsas e ataques pessoais para desconcentrar Biden —aos 74 anos, o republicano costuma questionar a idade e a capacidade mental do rival para governar. Biden completa 78 anos no próximo mês.

Em sua espiral ofensiva, mais controlada pela moderadora e novas regras, Trump insistiu na tese de que Biden é ligado ao que chama de esquerda radical do Partido Democrata, apesar de o ex-vice de Barack Obama ser um candidato moderado. O presidente vocifera que o adversário vai levar o socialismo aos EUA caso vença em novembro, numa tentativa de assustar eleitores moderados dos subúrbios, que costumam variar o voto entre democratas e republicanos nas eleições.

Realizado em Nashville, o debate desta quinta ocorreu em meio a dois temas cruciais para o presidente: o aumento de casos do coronavírus nos EUA —as transmissões têm piorado com a chegada do clima mais frio— e a confirmação pelo Senado da juíza conservadora Amy Coney Barrett para uma vaga na Suprema Corte.

Como o voto não é obrigatório nos EUA, o candidato precisa motivar mais eleitores às urnas para vencer, e Trump conta com a indicação de Barrett como trunfo entre os mais conservadores. A pandemia, porém, é o calcanhar de aquiles do presidente, e o esforço de Biden sempre foi deixar o tema no centro da discussão.

O desafio do democrata era mais uma vez centrar a pauta na condução errática e ineficaz de Trump diante da pandemia, enquanto evitava cair nas provocações do presidente. No primeiro debate, Biden perdeu a paciência logo início, ao ser interrompido diversas vezes por Trump, e o mandou calar a boca.

Dessa vez, Biden gaguejou algumas vezes sob pressão.

O presidente mais uma vez prometeu a vacina contra a Covid-19 para as próximas semanas. “Temos uma vacina que está pronta.”

Ao ser questionado pela moderadora, o presidente afirmou que não poderia garantir uma data, mas disse que havia “boas chances” de haver vacina até o fim do ano, ao contrário do que dizem muitos especialistas.

Biden, por sua vez, chamou a atenção para o aumento dos casos de Covid-19 com a chegada do outono e previu “um inverno sombrio.”

Em resposta, Trump diz que não é possível fechar o país novamente –ele diz que o democrata vai parar todas as atividades dos EUA caso seja eleito, o que tem impacto em parte dos eleitores, preocupados com a economia– mas o rival retrucou que vai “parar o vírus e não o país.”

Levantamentos mostraram que a postura agressiva de Trump naquele duelo e seu diagnóstico de Covid-19, divulgado dois dias após o debate, prejudicaram o republicano, e Biden abriu boa vantagem nas principais pesquisas nas últimas semanas.

Os temas do embate desta quinta eram: luta contra a pandemia, famílias americanas, questão racial nos EUA, mudanças climáticas, segurança nacional e liderança. Essa foi a segunda vez na história que uma mulher negra mediou um debate entre os candidatos —a primeira foi em 1992. Antes do evento, transmitido ao vivo pela TV americana, Trump atacou a moderadora, acusando-a de ser parcial.

A campanha de Trump criticou a escolha dos assuntos, feita pela jornalista, argumentando achar que o debate seria sobre política externa. O presidente se esforça para desviar a pauta de terrenos nos quais ele tem sido mal avaliado, como a pandemia, e sempre que pode vira os holofotes para sua postura anti-China, que tem ressonância entre boa parte dos americanos.

Assim como no primeiro debate, o encontro desta quinta teve plateia reduzida, de 80 a 90 pessoas, todas precisavam usar máscaras e fazer teste para o diagnóstico de Covid-19 previamente. As duas campanhas, porém, concordaram em eliminar a separação de vidro que haveria entre os candidatos após ambos terem teste negativo para Covid-19.

No duelo de setembro, familiares de Trump retiraram a proteção facial ao chegarem ao estúdio, o que gerou críticas inclusive por parte do moderador, o jornalista Chris Wallace. Desta vez, a regra passou a ser: se não usasse máscara, seria retirado do local.

Havia ainda um debate marcado para o dia 15 de setembro, que teria sido o segundo encontro entre os candidatos, mas o evento foi desmarcado depois que Trump disse que não participaria virtualmente, como havia proposto a comissão —o presidente ainda estava no prazo de quarentena após ter sido infectado pelo coronavírus.


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