Amazonas
Aval para Amazonprev investir R$ 50 milhões no Master foi assinado 28 dias após troca de presidente, diz Estadão
Filiado ao União Brasil e contador de campanhas do partido, um gestor da Amazonprev, foi um dos responsáveis por autorizar aplicação de R$ 50 milhões em títulos sem garantias do Banco Master, liquidado pelo Banco Central após enfrentar uma crise financeira.
A troca de presidência no fundo de pensão dos servidores do Amazonas, em meados do ano passado, chama a atenção sobre as circunstâncias — e os responsáveis — por trás da aprovação que permitiu o investimento de R$ 50 milhões em letras financeiras do Banco Master. Como apontado por membros do Conselho de Administração do fundo posteriormente, a operação não seguiu o rito normal de outras decisões e avançou sem a deliberação dos conselheiros ou registro em atas de reuniões. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo (Estadão).
O caso do Amazonas não é isolado. Em Estados como Rio de Janeiro e Amapá, investimentos feitos pelos institutos
de servidores no Master, de quase R$ 2 bilhões, respectivamente, também são alvo de questionamentos, como já mostrou o Estadão/Broadcast.
Na base pública de dados do Amazonprev, um documento de junho sobre a aplicação no título do Master traz a assinatura do então recém-empossado presidente da entidade, Ary Renato Vasconcelos de Souza, com apenas
28 dias no cargo.
Souza é próximo ao governador Wilson Lima (União Brasil), foi secretário extraordinário de projetos especiais do Amazonas entre 2019 e 2022, na primeira gestão de Lima no governo do Estado, e atuou como contador da campanha que reelegeu o governador. Virou gerente de administração e finanças do Amazonprev em 2023, até ser nomeado, em 3 de julho do ano passado, para a chefia do instituto, em substituição a Maria Neblina Maraes, que estava no cargo havia pouco mais de dois anos.
Procurado, Souza disse que o Amazonprev responderia por ele. O fundo afirmou que o ex-diretor-presidente tinha capacidade técnica e estava habilitado para o cargo.
Segundo a instituição, sua gestão entre junho de 2024 e maio de 2025 gerou um retorno de R$ 864 milhões,
seguindo as normas do RPPS (ver mais abaixo).
Como novo chefe da entidade, ele consta como representante legal na Autorização de Aplicação e Resgate (APR) feita para o aporte no Master. Trata-se de um documento técnico de prestação de contas periódica dos fundos de pensão de entes públicos enviada ao Ministério da Previdência, que trazem detalhes que embasam as decisões de investimento.
Embora a assinatura do então novo presidente tenha data de 31 de julho, o documento de autorização descreve que a operação na letra do Master teria sido feita no dia 6 de junho, ainda na gestão de Maria Neblina Maraes. “A
aplicação se deu após o Comiv (Comitê de Investimentos) receber e-mail da diretoria, solicitando cotação e possível aquisição de letras financeiras desde que superassem a meta atuarial ao longo do vencimento”, diz o texto.
Nos documentos disponíveis na base de dados pública do Ministério da Previdência, Souza já assinava como
representante legal para aplicações aprovadas em junho de 2024, ainda antes da sua nomeação oficial para a presidência. Até maio, esses documentos eram assinados pela então presidente, Maria Neblina Maraes, como
representante legal. Na base de dados, no entanto, não consta registro sobre o investimento feito no Banco
Master.
Souza teve uma passagem breve no comando do Amazonprev. Deixou a presidência em maio deste ano, 10 meses após assumir, substituído por Francisco Evilazio Pereira, que era o secretário de Justiça do governo Lima.
Procurado, o instituto afirmou que os investimentos do fundo tiveram um retorno de R$ 1,6 bilhão, de julho de
2024 a outubro de 2025. A entidade diz que a aplicação na letra do Master representa menos de 0,5% do total dos
investimentos da instituição, “e não oferece nenhum risco ou interfere no pagamento de aposentados e pensionistas do Estado do Amazonas.”
Apesar disso, o instituto diz seguir acompanhando o tema junto ao Banco Central, que decretou a liquidação do Master.
O Amazonprev afirma ainda que o ex-diretor-presidente da instituição, Ary Renato Vasconcelos de Souza, tem capacidade técnica e estava habilitado para exercer o cargo. “Entre junho de 2024 e maio de 2025, período em que esteve à frente do Fundo Previdenciário, a política de investimentos resultou em um retorno de R$ 864 milhões,
sempre observando os normativos do Regime Próprio de Previdência Social (RPPS).”
Em resposta à reportagem, o governo estadual reproduziu a mesma nota enviada pelo Amazonprev, porém, com uma
diferença no período em que Souza esteve à frente do instituto. “Entre julho de 2024 e abril de 2025, período em
que esteve à frente do Fundo Previdenciário, a política de investimentos resultou em um retorno de R$ 864 milhões, sempre observando os normativos do Regime Próprio de Previdência Social (RPPS).”
Por meio de nota de seu advogado, Maria Neblina Marães respondeu que é funcionária de carreira do Governo do Estado do Amazonas há três décadas e que “todo o processo de tomada de decisão dos investimentos da Amazonprev é público e transparente”. Também declarou que, no dia 6 maio de 2024, o Master foi incluído na Lista Exaustiva de Instituições Financeiras do Ministério da Previdência Social (MPS), que contempla as instituições que atendem às condições estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional para negociar Letras Financeiras com os Regimes Próprios de Previdência Social (RPPS).
O Amazonprev tem pouco mais de R$ 10 bilhões sob gestão e compreende um universo de quase 100 mil servidores públicos.
Sob risco
Letras financeiras não têm proteção do Fundo Garantidor de Crédito (FGC). A decisão do Banco Central de liquidar o Master, em 18 de novembro, coloca o Amazonprev na fila de credores do banco, com risco real de perdas. Como mostrou o Estadão/Broadcast, 18 fundos de pensão de Estados e municípios aplicaram quase R$ 2 bilhões em
letras financeiras do Master.
O aporte do fundo de pensão do Amazonas passou a ser questionado muito antes da decisão que liquidou o Master.
O relatório de investimentos de setembro de 2024 do instituto cita que não haviam sido identificados os registros em ata de reunião ou deliberação da diretoria que autorizassem a aquisição da letra financeira do Master.
Um dos conselheiros destaca, na reunião de novembro de 2024, que as operações com letras financeiras se deram de
forma incomum e foram “uma surpresa desagradável, pois seus registros precisariam constar em atas, que deveriam
ser diligenciadas, deveriam ser decisões colegiadas.”
O tema virou alvo de apuração na entidade no ano passado. Até hoje, porém, o Conselho de Administração não
conseguiu acesso aos documentos detalhados com o caminho que levou à aplicação. Uma das suspeitas levantadas, segundo apurou a reportagem, é de que a operação tenha sido feita individualmente por um gestor
da entidade.
Em reunião do Conselho de Administração deste mês, integrantes do colegiado cobraram a divulgação dos resultados da sindicância aberta para apurar o caso, com a expectativa de que o tema seja deliberado em reunião extraordinária agendada para 29 de dezembro.
Partido
Filiado ao União Brasil e contador de campanhas do partido, um gestor da Fundação de Previdência do Estado do Amazonas (Amazonprev), entidade responsável por administrar aposentadorias de servidores locais, foi um dos responsáveis por autorizar um investimento de R$ 50 milhões em títulos sem garantias do Banco Master, liquidado pelo Banco Central após enfrentar uma crise financeira.
O negócio entrou na mira da Polícia Federal (PF), que apura indícios de fraudes em transações realizadas pela instituição financeira enquanto tentava ganhar uma sobrevida no mercado.
Documentos da Amazonprev revelam indícios de que a operação envolvendo o Master ocorreu sem autorização colegiada do fundo de previdência e sem análise de risco formal, o que contraria regras da fundação criada em 2021 para gerir a previdência dos servidores do Estado do Amazonas.
Um relatório de investimentos do instituto aponta ainda a ausência de registros formais da reunião ou deliberação da diretoria sobre a aquisição dos papéis do Master. Essa operação levou o Comitê de Investimentos da Amazonprev a abrir um “processo interno para apurar a responsabilização por eventuais descumprimentos” de normas internas do instituto.
Entre os gestores responsáveis pela aplicação financeira, ocorrida em junho de 2024, está Ary Renato Vasconcelos de Souza, que na época era gerente de Administração e Finanças da Amazonprev. Quase um mês depois da transação com o Banco Master, ele foi nomeado diretor-presidente da fundação, cargo no qual ficou por dez meses até ser exonerado em maio deste ano.
Souza já foi secretário executivo extraordinário de Projetos da Casa Civil do governo Wilson Lima (União) e atuou como contador da campanha à reeleição do governador, em 2022. Em dezembro daquele ano, ele se filiou ao União Brasil e foi nomeado para o cargo de gerente na Amazonprev em janeiro de 2023. Depois, assumiu a presidência da entidade, em julho de 2024, sendo substituído dez meses depois por Francisco Evilazio Pereira, que era o secretário de Justiça do governo Lima.
Na prestação de contas das eleições de 2022, Souza aparece como prestador do serviço de assessoria financeira à campanha de Lima, recebendo R$ 15 mil, além de também ter sido contratado por outros candidatos do União no Amazonas. A empresa de contabilidade da qual o contador é dono com outros dois sócios também presta serviços de contabilidade para o diretório estadual do União.
Em nota, o governo do Amazonas afirmou que o aporte no Banco Master corresponde a “menos de 0,5% do total de aplicações da instituição” e que o fundo previdenciário obteve um lucro de mais de R$ 1,1 bilhão. “Esse montante não precisa de aprovação colegiada, e não oferece quaisquer riscos ao pagamento de aposentados e pensionistas do estado do Amazonas”, pontua a gestão de Lima, que também destacou a “capacidade técnica” do ex-diretor-presidente responsável pela aplicação.
“A Fundação Amazonprev informa que o ex diretor-presidente da instituição Ary Renato Vasconcelos de Souza possui capacidade técnica e estava habilitado para exercer o cargo. Entre junho de 2024 e maio de 2025, período em que esteve à frente do Fundo Previdenciário, a política de investimentos resultou em um retorno de R$ 864 milhões, respeitando as regras do Regime Próprio de Previdência Social (RPPS)”, diz o texto do governo estadual.
Na sexta-feira passada, a Amazonprev já havia afirmado, em nota, que a operação financeira realizada com o Banco Master não oferecia qualquer risco ou interferia no pagamento de aposentados. “A Fundação reforça que a Amazonprev possui receita que garante o cumprimento integral de todas as obrigações junto aos seus beneficiários”, diz o texto.
A Polícia Federal apura as circunstâncias da venda de títulos do Master a fundos de previdência — que, entre outubro de 2023 e dezembro de 2024, rendeu ao menos R$ 1,867 bilhão ao banco que dependia da captação desses recursos para sobreviver no mercado. Ao todo, 14 entidades previdenciárias municipais e três estaduais fizeram aportes na instituição financeira.
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