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Economia

Banco Central eleva Selic para 12,25% e promete mais duas fortes altas

Na última reunião do ano, taxa básica anual de juros sobe um ponto percentual.

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O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) entregou o “choque de juros” esperado pelo mercado financeiro em meio à disparada do dólar e das expectativas de inflação. O Copom não só acelerou novamente o ritmo de alta da taxa Selic, agora para 1 ponto percentual, como prometeu um aumento da mesma magnitude nas próximas duas reuniões do comitê.

O anúncio foi feito na noite de despedida do presidente Roberto Campos Neto.

Na noite desta quarta-feira, a Selic subiu de 11,25% para 12,25% ao ano. Se a promessa se materializar, o escolhido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para comandar o BC a partir de 2025, Gabriel Galípolo, vai levar a Selic em março para 14,25%, o pico dos juros no governo de Dilma Rousseff, em março. E pode até ir além. Nesse caso, poderia se igualar aos patamares de 2006.

Ciclo de aperto

“Diante de um cenário mais adverso para a convergência da inflação, o Comitê antevê, em se confirmando o cenário esperado, ajustes de mesma magnitude nas próximas duas reuniões”, disse o BC.

A autoridade monetária destaca ainda que a magnitude total do ciclo de aperto monetário será ditada “pelo firme compromisso de convergência da inflação à meta”.

Maior patamar em um ano

O patamar atual da Selic é o maior em um ano. Na mesma época em 2023, a taxa estava em trajetória de queda e foi de 12,25% para 11,75%. O atual ciclo de aperto monetário começou em setembro com uma elevação de 0,25 ponto e em novembro já havia passado para 0,50 ponto. A forte aceleração vinha crescendo nas probabilidades traçadas pelos analistas nos últimos dias, embora ainda fosse majoritária a expectativa por um aumento de 0,75 pp.

Em pesquisa do Valor Pro com 117 instituições financeiras, 89 projetavam alta de 0,75 ponto percentual. Outras 24 esperavam um aumento maior, de 1 ponto, para 12,25%. Só quatro casas previam outra alta de 0,5 ponto, para 11,75%.

Alta de 1 pp não é comum

Levantamento do Bradesco mostra que a elevação de 1 ponto é bastante incomum na história do Copom. Nos últimos 20 anos, representaram apenas 7% das decisões de aperto da taxa (ou quatro de 51 reuniões), todas durante a pandemia de Covid-19.

Mas, para a maioria dos economistas, não havia como fugir de um aumento de velocidade no aperto dos juros diante da deterioração significativa do cenário inflacionário desde a última reunião do Copom, em novembro.

No comunicado desta quarta, o Copom reconhece que o cenário se mostra menos incerto e mais adverso que na reunião anterior. Mesmo assim, diz que o risco maior ainda é o de uma inflação mais elevada que a prevista atualmente.

As projeções oficiais do Copom já aumentaram significativamente entre o encontro de novembro e o deste mês. Para 2024, a estimativa de inflação passou de 4,6% para 4,9%, bem acima do teto da meta, que permite um resultado até 4,5%. O centro da meta é 3,0%.

Inflação

Confirmada uma inflação acima dos 4,5% neste ano, Galípolo iniciará seu mandato tendo de escrever uma carta para explicar os motivos pelo qual o BC não conseguiu cumprir sua missão de controlar a inflação.

O avanço da projeção oficial para 2025 foi ainda pior, de 3,9% para 4,5%, no limite da meta. No segundo trimestre de 2026, atual horizonte a política monetária, a projeção avançou de 3,6% para 4,0%.

“O cenário mais recente é marcado por desancoragem adicional das expectativas de inflação, elevação das projeções de inflação, dinamismo acima do esperado na atividade e maior abertura do hiato do produto, o que exige uma política monetária ainda mais contracionista”, reconhece o Copom no comunicado desta quarta. A expressão “hiato do produto” refere-se a um cenário em que a demanda cresce acima da expansão da oferta de produtos e serviços, estimulando alta de preços.

Dólar na máxima histórica influencia

Desde novembro, a mudança mais marcante foi a do dólar, cuja cotação superou pela primeira vez a marca de R$ 6, maior marca da história do real e vem se mantendo ao redor desse nível em reação ao pacote fiscal do governo Luiz Inácio Lula da Silva e à promessa de isenção do Imposto de Renda a quem ganha até R$ 5 mil.

As medidas foram consideradas insuficientes para colocar as contas públicas no lugar e corroboraram a avaliação de que o governo não quer se indispor politicamente para entregar o ajuste fiscal. Além disso, a ampliação da isenção do IR é considerada inflacionária, porque tende a aumentar o consumo.

Em relação a esse quesito, a autoridade monetária foi sucinta, mas afirmou que o efeito dos desenvolvimentos fiscais no dólar e nas expectativas de inflação “contribuem para uma dinâmica inflacionária mais adversa”.

“A percepção dos agentes econômicos sobre o recente anúncio fiscal afetou, de forma relevante, os preços de ativos e as expectativas dos agentes, especialmente o prêmio de risco, as expectativas de inflação e a taxa de câmbio. Avaliou-se que tais impactos contribuem para uma dinâmica inflacionária mais adversa.”

Risco anunciado

No último Copom, o BC já havia listado como risco para o aumento da inflação o efeito de “políticas econômicas externa e interna” por meio de uma taxa de câmbio persistentemente mais depreciada. A autoridade monetária também vinha acompanhando com atenção os desenvolvimentos fiscais e havia alertado em novembro sobre a necessidade de apresentação e execução de medidas fiscais estruturais.

Também pesam negativamente para a inflação futura a atividade econômica sobreaquecida e o cenário externo mais incerto com a eleição de Donald Trump para a presidência dos Estados Unidos.

BC quer mostrar ‘disposição’, diz analista

Para o economista-chefe do Banco Daycoval, Rafael Cardoso, o BC foi mais duro que o esperado e sinalizou que prefere fazer um ajuste mais rápido na taxa de juros. Nas suas contas, porém, para entregar a inflação na meta de 3,0% em 2026, o Copom terá de ir além de 14,25% ao ano e entregar uma alta final de 0,50 ponto em maio, para 14,75%. Neste caso, seria o maior nível dos juros básicos desde agosto de 2006.

— Para alcançar a meta em 2026, o BC precisaria de uma alta residual no segundo trimestre de 2025. Portanto, mais do que contratar 14,25%, a Selic deve se aproximar dos 15%, com mais uma alta de 0,50pp em maio.

Apesar de o BC mostrar “disposição grande” em fazer seu trabalho para controlar a inflação, sua postura mais dura deve ajudar a estancar a deterioração das expectativas de inflação, que estão muito afastadas da meta de 3% até 2027,avalia Cardoso. Porém, ele diz que isso não deve “resolver” o problema (conter a inflação), considerando o risco fiscal.

Helena Veronese, economista-chefe da B.Side Investimentos, também avalia ser difícil o BC encerrar o ciclo de aperto dos juros em um ritmo forte de 1 ponto. Por isso, diz ser provável que a Selic supere 14,25%. Segundo a economista, a sinalização de mais duas altas de 1 ponto confere credibilidade ao BC na busca pela meta de 3,0% e traz um “refresco” para o mercado.

Mas o comportamento do dólar e das expectativas de inflação dependem da evolução da discussão fiscal, agora à espera de uma conclusão no Congresso. De qualquer forma, a economista avalia que ao chamar a responsabilidade para si, o BC afasta um cenário de dominância fiscal, quando o aperto dos juros perde efeito para controlar a inflação diante de uma dívida pública muito elevada.

—Tem muita gente discutindo dominância fiscal, não é o cenário base, mas é um risco. Com essa sinalização, o BC chama a responsabilidade para si e afasta esse risco, que significaria a perda de credibilidade do BC.

Dinamismo

No comunicado desta quarta, o BC afirma que o conjunto dos indicadores de atividade econômica e do mercado de trabalho segue apresentando dinamismo, com destaque para a divulgação do PIB do terceiro trimestre. Em relação aos indicadores recentes de inflação, diz que têm se situado acima da meta e apresentaram elevação nas divulgações mais recentes.

Em 12 meses até novembro, o IPCA, índice oficial de inflação, está em 4,87%, fora do teto de 1,5 ponto percentual da meta de 3%. Além disso, segundo o Copom, as expectativas de inflação para 2024 e 2025 apuradas pela pesquisa Focus elevaram-se de forma relevante. Elas se encontram em torno de 4,8% e 4,6%, respectivamente.

No Copom passado, em outubro, a autoridade monetária já havia indicado que o distanciamento das expectativas de inflação da meta era um fator de desconforto comum a todos os membros do colegiado, mas havia sinalizado uma preferência por um “alongamento do ciclo” se houvesse deterioração adicional.

Quanto ao cenário externo, o comitê afirmou que permanece desafiador, em função, principalmente, da conjuntura econômica nos Estados Unidos, “o que suscita maiores dúvidas sobre os ritmos da desaceleração, da desinflação e, consequentemente, sobre a postura do Fed”. “O Comitê avalia que o cenário externo segue exigindo cautela por parte de países emergentes”, concluiu.

A partir de janeiro, o colegiado passará por mudança significativa. Além da passagem de bastão de Campos Neto para Galípolo, entram três novos diretores no BC. Eles completarão um total de sete indicados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva na cúpula do BC e do Copom, que têm nove cadeiras.

Já aprovados pelo Senado, Nilton David entra na vaga de Galípolo na diretoria de Política Monetária, Izabela Correa substitui Carolina Barros na diretoria de Relacionamento, Cidadania e Supervisão de Conduta e Gilneu Vivan sucede Otávio Damaso na Regulação.


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