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Oito em cada 10 delegacias da mulher do País não funcionam 24 horas por dia

Estrutura para atender vítimas de violência ainda é falha, apontam dados do Ministério da Justiça e da Segurança Pública.

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Nos últimos dias, casos recorrentes de feminicídios ocuparam o noticiário, expondo a realidade das mulheres brasileiras. Diante do cenário cada vez maior de insegurança, o País ainda tem dificuldade em ofertar uma rede de proteção eficaz para o combate à violência de gênero.

Dados do Ministério da Justiça e da Segurança Pública (MJSP) mostram que questões estruturantes como o horário de funcionamento das delegacias especializadas e a composição do efetivo profissional que atua nessas unidades ainda são desafios a serem superados.

Um diagnóstico concluído pela pasta em março deste ano com base na resposta de 509 delegacias especializadas de atendimento à mulher mostra que 80,4% das unidades não têm atendimento 24 horas. Os dados usam como referência o ano de 2023, mas compõem o levantamento mais recente da pasta, encaminhado em setembro ao Senado.

Em 2024, segundo dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, foram registrados 1.492 feminicídios no Brasil. Neste ano, segundo dados do MJSP, até o momento foram 1.184 casos registrados no País. O crime de feminicídio foi tipificado pela Lei 13.104/2015 e é classificado como assassinato de mulheres em decorrência do gênero.

Uma lei sancionada em 2023, determina que todas as delegacias especializadas de atendimento à mulher tenham funcionamento 24 horas. Considerando o recorte por regiões, o Centro-Oeste detém a situação mais crítica, com 85% das delegacias avaliadas sem atendimento contínuo. Em seguida aparece o Sudeste, com 83,3%; o Sul, com 81,5%; o Nordeste, com 78,6%; e o Norte, com 63,2%.

A falta de atendimento 24 horas não é a única falha da rede de proteção a mulheres. Outro dado expõe a lentidão com que as autoridades conseguem emitir medidas protetivas a vítimas de violência. Segundo o estudo do governo, somente em 36,74% das delegacias as autoridades policiais conseguem conceder medida protetiva em até 24 horas.

Apesar de especialistas apontarem a necessidade de que o combate à violência não se restrinja à punição, mas também inclua um trabalho de reeducação do agressor, a pesquisa do governo federal mostra que isso ainda é uma realidade distante.

Segundo os dados, 73,9% das delegacias especializadas não encaminharam os agressores para atendimentos como apoio psicológico, psiquiátrico, assistência social, tratamento para dependência química ou grupos de reflexão e reeducação.

Coordenadora do Núcleo de Atendimento a Vítimas de Violência do Ministério Público de São Paulo, Silvia Chakian aponta que a alta está ligada às redes sociais e ao efeito “backlash” (retaliação). Com a maior reivindicação de direitos por mulheres, segundo ela, há “uma reação violenta” a essas conquistas.

“Não tem como dissociar o recorde de feminicídios do crescimento de um discurso misógino, que lá na frente vai justificar essa violência. O feminicídio não é um ato isolado de loucura, mas o fim de uma escalada contínua de controle e violência do homem sobre a mulher”, diz a promotora. “O ‘Disque 180′ ou ‘Ligue 190′ não ajuda as mulheres que vivem em relacionamentos com dependência econômica e financeira. Denunciar o companheiro agressor pode significar para elas ter de morar na rua com três filhos sem ter como se sustentar”, afirma Silvia Chakian.

Secretária de Acesso à Justiça do ministério, Sheila de Carvalho defende que as práticas nas delegacias especializadas sejam aprimoradas. Ela cita, por exemplo, a cartilha de Padronização Nacional das Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (Deams), lançada em março pelo governo para orientar os serviços nessas unidades. O documento orienta, entre outros pontos, como deve ser o primeiro atendimento às vítimas, “evitando abordagens inquisitórias ou constrangedoras”, e a forma de organizar o ambiente para garantir a proteção e o acolhimento da mulher.

“Temos o entendimento de que as delegacias especializadas devem funcionar 24 horas, mas a gente sabe que criar um aparelho de funcionamento 24 horas, 7 por 7, tem uma dificuldade operacional dentro dos Estados. Mas isso não deve ser de nenhuma forma desincentivado. A gente tem que lutar para criar estruturas e condições propícias para tanto”, diz.


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