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Número de nascimentos no Brasil em 2023 foi o menor dos últimos 45 anos, aponta IBGE

Desaceleração aconteceu em todas as regiões do país, com exceção do Centro-Oeste, onde houve aumento de 1,1%.

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Em 2023, o Brasil teve o menor número de nascimentos dos últimos 45 anos. O resultado, divulgado nesta sexta-feira pelo IBGE, confirma a tendência de queda de natalidade que vem acontecendo no país. Foram 2.523.267 bebês nascidos vivos há dois anos (o dado mais recente disponível), número menor apenas do que o observado em 1974, quando começou a série histórica, 1975 e 1976.

A quantidade, que faz parte da série Estatísticas do Registro Civil 2023, representa uma redução de 0,7% em comparação com 2022. Se contraposta à média anual de 2015 a 2019, a diminuição foi de 12%, evidenciando que na década atual a curva de queda se intensificou ainda mais.

As pesquisadoras do IBGE explicam que é possível que a estatística de 2023 seja o recorde em toda a série histórica. No entanto, nas décadas passadas havia uma subnotificação considerável de nascimentos de bebês, portanto, os registros oficiais apontam números ainda menores nos anos 70 do que os atuais.

A diminuição de nascimentos aconteceu em todas as regiões do país, com exceção do Centro-Oeste, onde houve aumento de 1,1%. A principal redução foi no Sudeste (menos 1,4%). Os cinco estados com mais nascimentos, em números absolutos, foram São Paulo, Minas, Rio, Bahia e Paraná. Na outra ponta estão estados da Amazônia: Roraima, Amapá, Acre e Tocantins. Percentualmente, a maior queda foi em Rondônia (3,7%).

Entre as variações percentuais, as maiores quedas foram em Rondônia (-3,7%), Amapá (-2,7%), Rio de Janeiro (-2,2%), Bahia (-1,8%) e São Paulo (-1,7%). Já os maiores aumentos aconteceram no Tocantins (3,4%), Goiás (2,8%), Roraima (1,9%), Sergipe (1,7%) e Alagoas (1,6%). Em 18 Unidades Federativas houve diminuição, comparando com 2022, e em nove houve aumento de nascimentos.

Mulheres têm filhos cada vez mais tarde

Os dados também mostram mudanças profundas nas faixas-etárias das mães. Entre 2003 e 2023, houve redução de bebês gerados por mães com até 29 anos, diante do aumento de progenitoras com mais de 30 anos. Em 2023, 39% dos recém nascidos do país tinham mães com pelo menos 30 anos. No Distrito Federal, a maior incidência, quase metade (49,4%) tinha essa idade.

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A porcentagem de mães que têm filhos com mais de 40 anos dobrou em 20 anos. Em 2003, apenas 2,1% dos nascidos foram gerados por mães nessa faixa etária. Esse índice passou a ser de 4,3% em 2023. A principal faixa-etária da maternidade segue sendo de 20 a 29 anos: 49,1% dos nascimentos.

A quantidade de mães menores de idade continua significativa, apesar da redução recente. Em 2023, 11,8% dos nascidos vivos foram gerados por jovens de até 18 anos, a maioria na Região Norte. Vinte anos antes, essa taxa era de 20,9%, mais de um quinto do total.

O IBGE também apurou variações regionais sobre locais dos nascimentos. No caso de cidades com mais de 500 mil habitantes, por exemplo, 10,2% das mães tiveram seus filhos em outro município. No Brasil, onde mais aconteceu essa situação foi em Aparecida de Goiânia (GO), com 80,8% das mães deixando a cidade para o parto. Em segundo lugar está Belford Roxo (79,5%), no Rio de Janeiro.

Outra análise foi sobre o tempo de registro do bebê. Piauí, Pará e Maranhão são os estados onde há mais casos em que se leva mais de 15 dias para registrar o recém-nascido. No Brasil, há 222 cidades onde mais da metade dos registros ultrapassam esse tempo médio.

O mês que teve mais nascimentos em 2023 foi março, com 233.432 partos de bebês vivos. Em segundo lugar, vem maio (230.394). Assim, é possível afirmar que a maioria dos bebês são gerados durante o inverno anterior. Os nove meses após o carnaval, período que domina o imaginário popular como o mais “fértil”, na verdade é quando menos houve nascimentos. Em novembro, foram 188.411, o menor resultado do ano.

Maior inserção no mercado de trabalho e dificuldades econômicas, explica especialista
Há vários fatores que explicam a queda de fertilidade, afirma Julia Amin, doutoranda em Comunicação e Cultura na UFRJ e que pesquisa sobre maternidade no século XXI. Os motivos passam pela ascensão da mulher no mercado de trabalho e também pelas dificuldades econômicas diante do aumento dos custos.

— Não há um único fator, mas a queda passa muito pela conquista de direito das mulheres. Elas estão mais inseridas no mercado de trabalho e têm mais planos profissionais. Enquanto isso ainda há uma discrepância enorme em relação à divisão sexual do trabalho doméstico, e ainda recai mais sobre as mulheres o cuidado com os filhos. Isso é um fator que também determina na escolha de número de filhos — explica Julia.

Enquanto isso, os altos custos associados às dificuldades financeiras se tornam obstáculos mais importantes atualmente.

— Outro fator relevante são as incertezas socioeconômicas, como precarização dos empregos, ausência de direitos trabalhistas, aumento do custo de vida. Em meio a esse cenário, faltam creches e escolas públicas de qualidade. Hoje as escolas privadas são muito caras, esse fator econômico interfere muito na decisão sobre ter ou não filhos, ou quantos e quando — diz a pesquisadora. — E aí a partir dos 35 anos a fertilidade da mulher começa a cair. Isso não significa que ela não vai ter filhos, mas pode ser mais difícil.

A queda de natalidade não é exclusividade do Brasil, mas sim um fenômeno global, com exceção da África Subsaariana. Em todo o mundo, a queda da taxa de fertilidade está bastante associada aos processos de industrialização e urbanização, que promoveram a maior participação da mulher no mercado de trabalho e mudanças muito rápidas de valores e costumes, como o questionamento sobre a divisão das tarefas domésticas e a difusão dos métodos contraceptivos.

O Centro-Oeste ainda é uma região predominantemente rural, onde prevalecem relações mais tradicionais e religiosas, que priorizam famílias mais numerosas com papeis de gênero bem definidos conforme o modelo patriarcal, o que pode impactar na taxa de natalidade ainda em alta, na contramão da tendência nacional.

Julia aponta que até a China, país mais populoso do mundo e que ficou conhecido pela sua política de filho único já está tentando reverter essa curva, diante da queda dos nascimentos. Lá, o governo hoje lança mão até de propagandas explícitas para incentivo à gestação.

— Em Wuhan, há uma estátua famosa representando uma família, com um pai, uma mãe e um filho. Recentemente, o artista renovou a obra e acrescentou mais duas crianças — afirma a especialista.

Julia ainda lembra que a economista americana Claudia Goldin, vencedora do Prêmio Nobel de Economia de 2023 por seu trabalho sobre a desigualdade salarial entre homens e mulheres, argumenta, em sua pesquisa, que, nos processos de desenvolvimento dos países emergentes, as mulheres tomaram ciência dos seus direitos e do que querem para suas vidas de forma muito mais rápida, enquanto os homens não se adaptaram completamente a essas mudanças e se beneficiam do modelo patriarcal

— Isso faz com que tenha discrepância entre ideologias das mulheres e dos homens, que ainda estão mais apegados aos costumes conservadores. Enquanto mulheres se distanciam um pouco disso —explica Julia Amin.

 


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