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Brasil

Atraso nas mensalidades de faculdade afetou 1 em cada 3 estudantes no Brasil em 2024, diz pesquisa

Seis em cada dez universitários que se formariam até 2023 desistiram do curso.

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Um em cada três estudantes (31,15%) tinha dívida em atraso com alguma instituição de nível superior do país no ano passado — o maior índice já registrado em um levantamento feito pela plataforma de inteligência de dados Sponte/Linx, que ouviu quatro mil centros de educação do Brasil para traçar um mapa do ensino. Em apenas cinco anos, segundo a pesquisa divulgada pelo site Extra , a inadimplência na graduação subiu 8,6 pontos percentuais.

Escolher o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) foi a saída para Luana Maria de Lima, de 33 anos, para continuar o curso de Direito, que tinha seis mensalidades atrasadas. Ela concluiu a graduação em 2015, com 23 anos de idade, mas só conseguiu quitar a dívida do financiamento nove anos depois.

— Entre 2015 e 2024, não pude pagar o Fies. Cheguei a pagar R$ 10 mil, mas não fez muita diferença. Só consegui saldar tudo no ano passado, com um desconto de 90%.

Dados da Serasa também apontam que mais de 2,2 milhões de estudantes estavam com dívidas em atraso com universidades em janeiro deste ano. O valor médio devido era de R$ 272. De acordo com a Lei 9.870/1999 (a lei das Mensalidades), a rescisão do contrato universitário por falta de pagamento pode ocorrer no fim do semestre letivo.

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Para Cristopher Morais, Diretor de Negócios da Sponte, o endividamento é um fator crucial que pode levar à desistência de universitários. Na rede privada, a evasão atingiu 61% dos universitários que se formariam em 2023, segundo o último Censo da Educação Superior.

— A inadimplência está diretamente ligada à evasão escolar, pois quando uma família enfrenta dificuldades financeiras, geralmente, a mensalidade da faculdade é uma das primeiras a ser sacrificada — avalia Christopher.

Ainda segundo o Censo do Ensino Superior, apenas 21% dos brasileiros entre 24 e 34 anos têm diploma de ensino superior. Para a ex-diretora de Educação do Banco Mundial Claudia Costin, intensificar os investimentos em financiamento estudantil é importante para o crescimento do país:

— Em uma era marcada por inteligência artificial e avanços tecnológicos, não investir na qualificação da juventude significa limitar as perspectivas de crescimento do país. É fundamental garantir um financiamento acessível para quem tem alguma renda, mas não o suficiente para arcar com os custos do ensino superior.

MEC pode regular cobranças

A pedido do EXTRA, o Semesp levantou o reajuste médio nas mensalidades de 25 cursos de ensino superior entre o primeiro semestre de 2023 e o primeiro de 2024. O curso de Jornalismo, por exemplo, teve um aumento de 21,7%, passando de R$ 1.477 para R$ 1.798 (confira a lista com as maiores altas no infográfico abaixo).

Mesmo sem teto padrão para o aumento das mensalidades, a legislação estabelece regras para a cobrança de mensalidades em instituições de ensino particular, segundo Bruno Coimbra, direito jurídico da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (Abmes):

— A instituição deve calcular o impacto nos seus custos, como aumento salarial de professores e de insumos. Esse percentual determina o limite do reajuste permitido.

A planilha de cálculo do reajuste é pública e pode ser solicitada pelos alunos, pelo Procon e pelos ministérios da Educação e Público. Se houver suspeita de irregularidade, os órgãos fiscalizadores podem exigir uma documentação detalhada e tomar medidas legais para casos de irregularidades. De 2020 a 2025, os estudantes registraram 7.726 reclamações de cobranças indevidas e alterações de contratos sem aviso, na plataforma Consumidor.gov.br.

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O ministro da Educação, Camilo Santana, defendeu a regulamentação das mensalidades cobradas nos cursos de Medicina. A especialista Claudia Costin explica como seria o funcionamento:

— Essa entidade não trataria apenas das mensalidades, mas de toda a regulação, que hoje está sob responsabilidade de uma das secretarias do MEC. A ideia é interessante, pois a maior parte das instituições de ensino superior no Brasil é privada e precisa de regulação adequada.

O que dizem as universidades

A maior parte (1.822) reclamações dos estudantes citadas nesta edição no portal Consumidor.gov.br foram registradas em 2021.

O EXTRA entrou em contato com as sete instituições de ensino superior com mais reclamações registradas no portal Consumidor.gov.br.

A Estácio informou que a quantidade de queixas representa menos de 1% da base total de alunos. A empresa também declarou que mantém canais de comunicação com os alunos.

As faculdades Anhanguera, Pitágoras e Unopar — que fazem parte do grupo Cogna Educação — afirmaram que o setor responsável “já está atuando para identificar e solucionar eventuais inconsistências”. As instituições orientaram os universitários com dúvidas sobre as mensalidades a procurarem os canais oficiais de atendimento da faculdade, além das unidades ou dos pólos parceiros em suas localidades.

Já a Anhembi Morumbi disse que suas regras financeiras seguem as normativas do MEC.

Até o fechamento desta edição, o Centro Universitário Faculdades Metropolitanas Unidas e Universidade de Cuiabá (Unic) não responderam aos questionamentos.

Financiamento estudantil

O Fies é um instrumento essencial para ampliar o acesso ao ensino superior no Brasil, garantindo condições diferenciadas para estudantes de menor renda, como juros zero e prazos estendidos de pagamento.

Após perder sua bolsa do Prouni devido a questões de saúde mental, a analista de planejamento Fernanda Nascimento, de 34 anos, recorreu ao Fies. Ela acreditava que ao concluir a faculdade de Engenharia de Produção conseguiria um emprego para quitar as parcelas do financiamento, porém a realidade foi bem diferente.

— Como eu trabalhava como freelancer, a dívida foi se tornando alta. Acabei não conseguindo pagar — lembra.

Mesmo com a renegociação, Fernanda precisou juntar uma reserva com o 13º salário para conseguir sair da inadimplência. De acordo com o Ministério da Educação, o programa de renegociação de dívidas do Fies teve mais de 387.653 acordos firmados entre novembro de 2023 e dezembro de 2024. Apenas com o pagamento das entradas dos acordos, foram arrecadados quase R$ 795 milhões.

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Um dos maiores pesquisadores de financiamento de ensino superior do país, Paulo Meyer Nascimento, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), avalia que o modelo do Fies deveria ser reformulado para que o pagamento da dívida fosse vinculado à renda do ex-estudante, usando mecanismos como os da Receita Federal para garantir que as parcelas sejam descontadas na fonte:

— A ideia é que, ao terminar o curso, a pessoa pague a parcela do financiamento com base no seu salário ou outras fontes de renda, proporcionalmente à capacidade de pagamento.

EaD domina oferta de vagas no país

Em 2023, o ensino superior no Brasil atingiu a marca de 24.686.700 vagas. Desse número, mais de 19,1 milhões foram destinadas ao ensino a distância (EaD), representando quase 3,5 vezes o número de oportunidades presenciais, que somaram 5,5 milhões. O setor privado concentra a maior parte (19.046.990) dessas vagas EaD.

Esse crescimento expressivo nas matrículas gerou a necessidade de uma revisão do Marco Regulatório da educação a distância, com divulgação prevista para abril.

Rodrigo Capelato, diretor executivo da Semesp, destaca que, enquanto os cursos de licenciatura têm alta procura no EaD, o mesmo não ocorre no ensino presencial, que tem a maior concentração de jovens. Capelato levanta uma preocupação em relação à formação de professores:

— Um estudo realizado pelo Semesp, em 2022, aponta que pode ocorrer um apagão de 235 mil professores na educação básica até 2040.


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