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Brasil

Quantas igrejas evangélicas abrem por dia no Brasil?; veja o número oficial

Só em 2019, foram abertas 6.356 igrejas evangélicas no Brasil

O técnico de refrigeração Alcione Cavalcante, de 46 anos, é um dos obreiros e professores da escola bíblica da igreja evangélica Assembleia de Deus Ministério do Sopro Divino, em Mauá, Grande São Paulo.

“Onde moro é periferia, a gente tem acesso às regiões mais humildes e conversa muito sobre a realidade dessas pessoas”, diz.

“Elas vêm para a igreja, compartilham dificuldades e não só são ouvidas, como as pessoas da igreja se identificam com os problemas delas e ajudam”, continua ele, que se converteu quando era jovem. A Assembleia de Deus é a que mais cresceu entre as evangélicas, abrindo 9.348 templos de 2010 a 2019, alta de 115%.

Os dados são do estudo do cientista político Victor Araújo, pesquisador associado ao Centro de Estudos da Metrópole (CEM), ligado à Fapesp. Só em 2019, foram abertas 6.356 igrejas evangélicas no Brasil, média de 17 novos templos por dia. O Espírito Santo é o Estado mais evangélico do país, com 93 templos por 100 mil habitantes. Já o Nordeste tem a menor adesão a essa tendência.

O estudo registrou a existência, no País, de 109,5 mil igrejas evangélicas de diversas denominações, ante cerca de mil em 2015. O predomínio é das pentecostais (48.781 templos). Entre os motivos para esse boom, está o enfraquecimento do catolicismo, que perdeu alcance com a formação das periferias urbanas após o êxodo rural.

“Eram populações católicas, mas as paróquias não estavam nesses locais, e eles foram rapidamente ocupados pelas evangélicas, que têm estruturas menos engessadas, às quais a cultura das periferias se adaptou melhor”, diz Araújo. O Vaticano também não abriu espaço para o protagonismo das mulheres em postos de liderança, movimento feito pelas evangélicas.
A Lei 10.825/2003 tornou livre a criação, organização e funcionamento das organizações religiosas, possibilitando que as evangélicas pudessem abrir mais templos com novas denominações. “A lei deu grande impulso a um processo que já havia começado na década de 60″, afirma o pesquisador, também ligado à Universidade de Zurique (Suíça).

A consolidação do protestantismo no Brasil, a partir da primeira igreja evangélica registrada, em 1922, foi lenta. Em 1960, havia oficialmente só 18 igrejas evangélicas missionárias no Brasil. Daquele ano até 1980, o total aumentou mais de 170 vezes, atingindo a marca de 3.087.

A linguagem acessível também é vista como vantagem, segundo a pastora Romi Bencke, secretária-geral do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (Conic). “Essas igrejas têm linguagem mais simples e fácil de entender, até porque geralmente a pessoa que abre (a igreja) já faz parte do bairro. Por ter identificação forte com o lugar, a liderança é legitimada pela comunidade”, diz.

A dona de casa Alexya Veríssimo, de 23 anos, diz que sua igreja a acolheu quando mais precisava. “Hoje, Deus é tudo para nós.” Ela é mãe de duas meninas, de 2 e 3 anos, e vai à Igreja Pentecostal Deus É Eterno às quintas-feiras e domingos no bairro onde mora em Sorocaba, interior de São Paulo. “Muita gente vai, é uma referência no bairro”, conta.

É comum, segundo o obreiro Alcione Cavalcante, a busca de ajuda na igreja por dependentes químicos ou pelos parentes deles. “Estamos próximos dessas pessoas. Elas ouvem a mensagem, se convertem e passamos a apoiá-las o tempo todo junto aos familiares”, diz.

“Se é o caso, a igreja encaminha a uma clínica terapêutica, mas muitas vezes é resolvido ali mesmo na comunidade, de forma prática. Não ficamos esperando ajuda do governo”, relata. Cavalcante vai à igreja nos fins de semana, com a mulher e a caçula, de 21 anos. Ainda tenta convencer os filhos mais velhos a frequentar os cultos.

Os cinco Estados com mais igrejas evangélicas por 100 mil habitantes são Espírito Santo, Rio de Janeiro, Mato Grosso do Sul, Rondônia e São Paulo. Essas regiões têm mais de 60 igrejas por 100 mil habitantes.
No Espírito Santo e no Rio, são mais de 80 templos por 100 mil: é uma igreja evangélica para cada 1.250 moradores.
No segundo bloco, estão Rondônia, Mato Grosso do Sul, São Paulo, Distrito Federal e Minas, que variam de 30 a 50 igrejas evangélicas por 100 mil. Para Araújo, o Centro-Oeste e o Norte estão em processo acentuado de evangelização.
No outro extremo, diz o estudo, Estados do Nordeste, como Ceará, Maranhão, Piauí e Rio Grande do Norte, têm menos de 20 igrejas por 100 mil moradores.

 

Para o estudo, as igrejas evangélicas foram divididas em quatro grupos: missionárias, pentecostais, neopentecostais, e de classificação não determinada. Araújo usa como fonte de dados o Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) que, como qualquer empresa, as igrejas precisam para operar.

“Ainda que os dados sejam subestimados, pois muitos estabelecimentos religiosos operam sem CNPJ, essa base é importante porque permite acompanhar a abertura dos estabelecimentos desde os anos 20 do século passado”, diz o pesquisador. Um método computacional permitiu detectar e analisar a razão social de mais de 150 mil templos evangélicos inscritos na Receita Federal.
Categorias de igrejas*:

Evangélicas Missionárias: Adventista, Anglicana, Batista, Congregacional, Luterana, Metodista, Presbiteriana.
Evangélicas Pentecostais: Assembleia de Deus, Casa da Bênção, Congregação Cristã do Brasil, Maranata, Nova Vida, Deus é Amor, Quadrangular.
Evangélicas Neopentecostais: Bola de Neve, Renascer em Cristo, Mundial do Poder de Deus, Universal do Reino de Deus, Tabernáculo de Jesus, Internacional da Graça de Deus.
Classificação não determinada: Fonte de Vida, Comunidade Cristã Paz e Vida, Casa de Oração, Apostólica, Betel, Nova Vida, Aliança com Cristo, Igreja da Bênção, Evangelho Pleno.

*A lista não esgota todas as denominações e deve ser tomada como exemplo.

O boom no segmento também está ligado a divergências no interior das evangélicas, que resultam na abertura de “congregações irmãs”. “O meio evangélico tem essa característica de a igreja não precisar de estrutura nacional, de não seguir uma diretriz como a Católica, que segue os preceitos do Vaticano. Isso facilita a abertura de novas igrejas”, diz a pastora Romi Bencke, mestre em Ciência da Religião.

O estudo aponta que, apesar do protagonismo midiático da Igreja Universal do Reino de Deus, liderada por Edir Macedo, os neopentecostais, surgidos no fim da década de 1970, não tiveram crescimento suficiente para ultrapassar numericamente as igrejas pentecostais e missionárias, nem mesmo aquelas de classificação não determinada.

Outra das neopentecostais mais famosas é a Mundial do Poder de Deus, do pastor Valdemiro Santiago. Ex-liderança da Universal, ele fundou a própria igreja. Mas, como o Estadão mostrou, a Mundial acumula dívidas e problemas judiciais, além de pede dinheiro do dízimo a fiéis para evitar a falência.
Pastor Valdemiro Santiago é o fundador da Igreja Mundial do Poder de Deus. Foto: Eduardo Pinto/Divulgação

Há muitos casos, segundo ela, em que um desentendimento entre pastores de uma igreja leva o outro a se desligar e criar sua própria comunidade, o que não é possível na católica e em algumas evangélicas tradicionais. Essa facilidade, aponta Romi, também tem um lado negativo: possibilita a abertura de igrejas de fachada, que podem eventualmente servir para a lavagem de dinheiro.”

“Sou cautelosa em falar sobre isso, porque existem igrejas muito sérias, que contabilizam e registram as doações, mas não se pode ignorar que existem as que não prestam contas e se convertem em uma possível fachada para lavar dinheiro”, diz.

Movimento muda a demografia e causa reação na Igreja Católica

Para o sociólogo Edin Sued Abumanssur, professor de Sociologia da Religião da PUC-SP, alguns segmentos católicos no Brasil se movimentam para também angariar mais seguidores.

“Quem perde fiéis é a Igreja Católica ortodoxa, que segue de perto as diretrizes do Vaticano. Já o segmento carismático católico está crescendo. É um segmento que tem padres cantores e um jeito de pensar a religião muito parecido com o dos evangélicos pentecostais.”

Para o especialista, embora várias projeções apontem grande crescimento das evangélicas nos últimos dez anos, é preciso aguardar os números do Censo do IBGE sobre as religiões, que só deve sair em 2024. “Se os dados mostrarem que a taxa de crescimento entre 2010 e 2020 se manteve, podemos prever que, em 2030, a população evangélica estará muito equilibrada à católica, se não for maior. Minha impressão, porém, é de que o crescimento, nesta década, foi menor.”

Na esteira disso, estão a expansão para o exterior, o que ocorre com a Universal, a Mundial do Poder de Deus, a Renascer, a Deus é Amor, entre outras. “Elas crescem principalmente na África e nas periferias das grandes cidades da Europa, sobretudo entre imigrantes.”

Outra tendência, segundo ele, é a maior ocupação dos espaços políticos pelas igrejas, que já acontece desde os anos 1990. Para ele, as bancadas nos parlamentos surgiram porque os partidos políticos não dão conta de todos os interesses que permeiam a sociedade civil. “Os interesses dos evangélicos são tão legítimos quanto os de outras bancadas, da bola, da bala, dos índios, da indústria e do agro.”

O deputado estadual Carlos Cézar (PL), da Igreja do Evangelho Quadrangular em Sorocaba, vê na capilaridade o motivo desse avanço. “É natural que o crescimento das igrejas evangélicas tenha maior proporção nas áreas periféricas. Vale lembrar que a Quadrangular atua no Brasil desde 1951, possui mais de 17 mil templos e promove projetos de evangelização e sociais em todos os Estados”, diz ele, pastor há 23 anos.

As informações são do Estadão.


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