Brasil
Na pandemia, governo reduz Farmácia Popular, que trata comorbidades da Covid
Em 2020, primeiro ano da pandemia, foram 20,1 milhões de beneficiários no programa. Isso representa 1,2 milhão a menos que no ano anterior. A cobertura de 2020 foi a menor desde 2014.
Criado para distribuir remédios gratuitos ou com descontos à população de baixa renda, o programa Farmácia Popular foi reduzido na gestão de Jair Bolsonaro mesmo durante a pandemia da Covid-19. A informação é da Folha.
A rede de farmácias atende a pessoas com doenças crônicas, como asma e hipertensão, e que, portanto, estão no grupo de risco do coronavírus.
Em 2020, primeiro ano da pandemia, foram 20,1 milhões de beneficiários no programa. Isso representa 1,2 milhão a menos que no ano anterior. A cobertura de 2020 foi a menor desde 2014.
Os dados são do Ministério da Saúde, obtidos pela Folha por meio da Lei de Acesso à Informação.
Criado em 2004, a Farmácia Popular distribui medicamentos básicos gratuitamente para hipertensão, diabetes e asma por meio de farmácias privadas conveniadas. Remédios para controle de rinite, mal de Parkinson, osteoporose e glaucoma, além de anticoncepcionais, são vendidos com desconto de até 90%.
Para o presidente do Conasems (Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde), Willlames Freire Bezerra, a Farmácia Popular amplia o acesso a medicamentos de pessoas com comorbidades, que, sem o programa, têm que ir a um local de tratamento de Covid, como hospitais públicos, para tentar conseguir o remédio pela rede pública de saúde.
“O programa reduz o valor dos medicamentos para os mais carentes e também melhora o acesso [aos remédios] num momento de pandemia em que a população está com dificuldade financeira e de locomoção”, disse Bezerra, que é secretário municipal de Pacatuba (CE).
A quantidade de farmácias também caiu no ano passado para 30.988 unidades. Esse é o menor patamar desde 2013. Em 2015, auge da rede de atendimento, eram 34.625 farmácias.
Novas farmácias estão impedidas de se cadastrarem no programa desde dezembro de 2014. Na época, o governo da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) suspendeu o credenciamento por já ter atingido a meta de rede de cobertura daquele ano.
O processo, porém, não foi reaberto até hoje. Procurado, o Ministério da Saúde informou que não há prazo para retorno do credenciamento.
As unidades conveniadas recebem reembolso do governo federal pelos medicamentos distribuídos por meio do programa.
Desde o início do governo, a equipe de Bolsonaro coloca a Farmácia Popular na lista de programas a serem encerrados. O objetivo, segundo integrantes do time do ministro Paulo Guedes (Economia), é usar esse recurso público em outras ações.
Quando o governo buscava verba para bancar um novo programa social, após eventual reformulação do Bolsa Família, uma das possibilidade foi acabar com a ação da Farmácia Popular. Esses estudos foram feitos no ano passado, ou seja, em meio à pandemia do coronavírus.
“A Farmácia Popular não pode acabar. É o tratamento de doenças que precisam de medicação contínua. Sem a medicação, o quadro pode se agravar e chegar a uma internação hospitalar, que tem um custo muito mais elevado para o sistema de saúde”, disse a deputada, Carmen Zanotto (Cidadania-SC), que preside a Frente Parlamentar Mista da Saúde no Congresso.
Para 2021, o orçamento do programa sofreu uma redução. No ano passado, foram reservados R$ 2,7 bilhões, em valores corrigidos pela inflação. Para este ano, a verba é de R$ 2,5 bilhões mesmo com o agravamento da pandemia.
O corte contrasta com a verba turbinada aprovada pelo Congresso para emendas parlamentares, no valor de R$ 48,8 bilhões, principalmente na área de obras do governo. Emendas são formas de um deputado ou senador direcionar recursos para projetos com impacto direto nas bases eleitorais e, assim, conquistar capital político para as próximas eleições.
O Ministério da Saúde afirmou que a “Farmácia Popular não substitui as ações e os programas de responsabilidade dos gestores de saúde estaduais e municipais, quanto à disponibilização de medicamentos para a população”.
Segundo a pasta, o acesso aos medicamentos pelo programa é complementar à ação desses entes e o atendimento deve ser garantido nas unidades básicas de saúde e farmácias municipais.
O governo declarou ainda que, apesar do recuo no número de pessoas atendidas pela Farmácia Popular, adotou regras mais flexíveis no ano passado, em caráter excepcional e temporário, como ampliação do prazo de validade das prescrições médicas, laudos e atestados para 365 dias a partir da data de emissão. Isso, de acordo com o ministério, gerou um aumento no número de remédios liberados pelo programa.
Atualmente, o programa opera em 4.394 municípios —cerca de 80% das cidades brasileiras.
O Plano Nacional de Saúde, que traça estratégias para a pasta até 2023, prevê como meta a expansão da cobertura nas cidades com até 40 mil habitantes. O objetivo é que a rede atenda a 90% desses municípios pequenos.
O documento destaca que “evidências demonstraram que o PFPB [Programa Farmácia Popular do Brasil] reduziu as internações hospitalares e mortalidade em relação à hipertensão e diabetes”.
Mas o tamanho do programa vem registrando sucessivos recuos. Em 2016, por exemplo, eram 4.467 municípios atendidos.
Em 2017, o governo do ex-presidente Michel Temer (MDB) fechou todas as unidades próprias do programa Farmácia Popular bancadas com recursos do Orçamento público.
Eram cerca de 400 pontos de atendimento, inclusive em cidades que não tinham farmácia privada credenciada na outra modalidade. A rede própria da Farmácia Popular, além disso, distribuía uma variedade maior de medicamentos —112 medicamentos, contra 32 disponíveis nas drogarias privadas conveniadas.
O argumento, na época, foi que os repasses para as unidades próprias da Farmácia Popular acabaram para melhorar a gestão, porque dos R$ 100 milhões gastos por ano, R$ 80 milhões eram custos administrativos. O valor, porém, é pequeno em relação ao total disponível para o programa. O corte nas cidades atendidas se deu principalmente nas regiões Norte e Nordeste.
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