Brasil
Fundamental para firmar COP30, Declaração de Belém formaliza apenas 4% dos compromissos, mostra estudo
Pesquisa da Plataforma Cipó mostra que, embora cerca de 1.700 ações tenham sido registradas desde 2023, em torno de 70% das medidas ainda são preliminares.

Fundamental para firmar a capital paraense como sede da COP30, a Declaração de Belém tem implementação que avança de forma desigual e ainda repleta de desafios. É o que revela um diagnóstico do instituto de pesquisa Plataforma Cipó que será lançado no próximo dia 19. Os dados mostram que, entre agosto de 2023 e junho de 2025, os oito países amazônicos — Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela — registraram cerca de 1.700 ações relacionadas à execução do documento, que prevê a consolidação de uma agenda comum para a região e enumera objetivos a serem alcançados em relação aos recursos hídricos. Entretanto, a maior parte delas permanece em fases iniciais.
O levantamento mostra que em torno de 70% das medidas registradas são preliminares, enquanto 4% resultaram em compromissos formalizados e 12% alcançaram à implementação prática. Para chegar ao resultado, os pesquisadores analisaram o cumprimento dos 113 parágrafos do acordo, organizados em 16 eixos temáticos. A Declaração de Belém foi assinada em agosto de 2023, durante a Reunião de Presidentes dos Estados Partes no Tratado de Cooperação Amazônica (TCA), na capital paraense.
As cerca de 1.700 ações mapeadas pelos pesquisadores abrangem desde grupos de trabalho, conferências e encontros técnicos até medidas concretas, como plano de trabalho da Rede Integrada de Manejo do Fogo, voltado ao combate a incêndios florestais, além da atuação do Mecanismo dos Povos Indígenas da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA).
A plataforma utilizou uma metodologia que acompanha cada ação em cinco níveis de implementação, que vão do interesse político até a geração de impacto para a biodiversidade e comunidades locais. Entre esses extremos estão as medidas preliminares, que criam condições para a execução, mas ainda não geram impacto direto; a formalização de compromissos, como criação de órgãos e aprovação de leis; e a operacionalização, quando programas, projetos ou operações conjuntas passam a funcionar na prática.
Os dados mostram que, apesar do discurso político alinhado dos representantes das oito nações, o avanço prático das ações ainda é limitado e aproximadamente 13% delas correspondem apenas a manifestações de interesse político, como declarações em eventos e diálogos informais.
Coordenadora de projetos da CIPÓ e responsável pelo estudo, Marília Closs avalia que a assinatura do decreto “marcou um ponto de virada na cooperação pan-amazônica justamente porque consolidou uma visão comum para evitar o ponto de não retorno da floresta”.
— Na prática, o decreto “reavivou” um olhar internacional para o bioma. São 113 compromissos que avançam, inclusive, em temas sensíveis que historicamente dividiram a região, como o combate a atividades ilícitas transnacionais. Desde então, muita coisa foi adiante e houve avanço em todos os eixos temáticos. Algumas agendas, por outro lado, ainda avançam mais lentamente — diz Closs.
Os eixos temáticos que concentram o maior número de ações são ciência, educação e inovação (cerca de 500), mudança no clima (aproximadamente 420) e proteção das florestas (em torno de 190). O instituto pondera, no entanto, que volume não significa impacto imediato. No caso do tema com mais propostas, por exemplo, a maior parte delas se concentra no fortalecimento do diálogo com redes acadêmicas e na realização de encontros técnicos, sem desdobramentos práticos até o momento.
O levantamento destaca o “papel central da OTCA” ao liderar mais de três quartos (77,5%) das ações registradas e revela uma “inércia preocupante diante de eventos extremos”. “Mesmo com enchentes, secas e incêndios florestais, não houve aumento proporcional de ações no eixo de mudança do clima, o que evidencia lacunas na capacidade de resposta regional.
Closs aponta que a pesquisa mostra, por exemplo, que os compromissos ligados à proteção social e ao reconhecimento das culturas amazônicas ainda estão em fase inicial de implementação. Outras propostas que geraram muita expectativa e permanecem em etapas primárias de implementação são o Painel Intergovernamental Técnico-Científico da Amazônia, que teria o intuito de promover a troca de conhecimentos, e o debate aprofundado sobre estudos, metodologias, monitoramento e alternativas para reduzir o desmatamento e evitar que o desequilíbrio ambiental na Amazônia se aproxime de um ponto de não retorno.
Outro exemplo de iniciativa que ainda não saiu do papel é o Observatório das Mulheres Rurais para a Amazônia, que “teria um papel importante para informar o desenvolvimento de estratégias, projetos e políticas públicas para as mulheres que atuam em atividades agrícolas, florestais e aquícolas e apoiar a organização de redes de conhecimento para o empreendedorismo feminino”.
Closs entende que o texto da Declaração de Belém passa por desafios-chave na região – como o desmatamento e a mudança do clima. Para ela, esses são temas que atravessam fronteiras e que, por isso, serão mais bem endereçados se tratados em coletivo.
— Nesse sentido, a COP30, a primeira a ser realizada em território amazônico, representa, portanto, uma oportunidade estratégica para fortalecer o protagonismo dos países da região e aprofundar a cooperação pan-amazônica. Até porque a implementação plena da Declaração de Belém, por meio de políticas públicas e ações concretas, podem ajudar a realizar a ambição da presidência brasileira não apenas de transformar a conferência na COP da implementação, mas de fazer com que a conferência global deixe um legado duradoura para a região amazônica e seus povos.
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