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ONU propõe criar Tribunal Internacional de Justiça Climática com sede na Amazônia

Proposta foi acrescentada à Declaração de Belém – Pacto para o futuro da Amazônia, documento que reúne conclusões e contribuições para a Cúpula do Clima.

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Durante a Conferência de Alto Nível sobre Segurança Humana e Justiça Climática da ONU, realizada nesta segunda (7) em Belém (PA), juristas apresentaram a proposta de criação de um Tribunal Internacional de Justiça Climática com sede na Amazônia. O evento foi uma realização do Comitê Permanente da América Latina para a Prevenção do Delito (COPLAD), membro da Rede de Soluções para o Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas, em parceria com o Ministério Público do Pará (MPPA). Ao final da programação, a proposta da criação da Corte na região foi acrescentada à Declaração de Belém – Pacto para o futuro da Amazônia, documento que reúne conclusões e contribuições para a Cúpula do Clima.

“Espera-se que a Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas crie o Tribunal Climático Internacional, a fim de decidir sobre controvérsias, riscos, crises, desastres, calamidades e desafios inerentes ao meio ambiente, à segurança humana e às variedades de ecossistemas que compõem a biodiversidade, seguindo o disposto na Resolução 77/276 adotada pela Assembleia Geral da ONU, em Nova York, em 29 de março de 2023”, diz o texto.

A ideia, que deve ser apresentada oficialmente na COP30, foi defendida pela ministra do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Nancy Andrighi, e pelo advogado geral da República Francesa junto à Suprema Corte da França em Paris, Gilles Charbonnier, como uma resposta à ausência de mecanismos jurídicos eficazes para responsabilizar governos e empresas por crimes ambientais.

Para a ministra Andrighi, a criação de uma corte especializada em questões climáticas e ambientais é urgente. Ela lembrou que, apesar dos avanços em acordos internacionais, as violações ambientais continuam se intensificando. “É necessário garantir proteção jurisdicional ao meio ambiente, com um tribunal próprio para isso”, afirmou.

A ministra destacou que o meio ambiente é um direito de terceira geração — ou seja, que transcende indivíduos e se estende à coletividade e às futuras gerações —, mas que os sistemas jurídicos internacionais não acompanham essa lógica. “A violência ambiental afeta toda a humanidade. Mas hoje, nem a Corte Internacional de Justiça nem o Tribunal Penal Internacional têm competência para julgar adequadamente crimes contra o planeta”, explicou.

Ela relembrou que já houve uma tentativa de criar uma instância voltada ao meio ambiente, com a Câmara de Assuntos Ambientais da Corte Internacional de Justiça, extinta em 2006 por inatividade. “Nossa Constituição é ambientalista. Temos um dever jurídico e ético com o bem-estar ambiental. A criação de um tribunal internacional específico é uma resposta concreta a esse dever”, defendeu.

A proposta prevê que o novo tribunal tenha acesso ampliado: além dos Estados, poderiam apresentar ações individuais, organizações da sociedade civil, povos indígenas, entidades supranacionais e órgãos da ONU. “O reconhecimento de que o meio ambiente é um direito humano exige um modelo de responsabilização à altura dessa complexidade”, concluiu.

Sistema internacional é falho

O magistrado francês Gilles Charbonnier, justificou a necessidade de uma nova Corte afirmando que o atual sistema internacional sofre de falhas estruturais. “Falta coordenação entre Estados, falta velocidade, falta vontade política — e às vezes, falta capacidade. Precisamos de um tribunal internacional que corrija essas falhas e torne efetivos os direitos da natureza e das futuras gerações”.

Charbonnier também propôs que o tribunal seja sediado na Amazônia, e não em capitais tradicionais como Haia ou Paris. “Francamente, faz mais sentido que esse tribunal esteja na Amazônia. Se queremos proteger a floresta e os povos da floresta, a corte precisa estar próxima de quem é afetado”, defendeu. Para ele, o modelo não precisa seguir os moldes tradicionais da justiça internacional. “Não proponho uma corte clássica. Proponho algo mais adaptado, mais flexível, mais pragmático. O importante é começar”.

O magistrado defendeu ainda que o novo tribunal possa, além de julgar, emitir pareceres e injunções a partir de consultas feitas por cortes nacionais. Ele citou como exemplo a possibilidade de o Supremo Tribunal Federal (STF) brasileiro pedir um parecer consultivo sobre o direito da natureza. “Precisamos agir agora. Se nos encontrarmos em 2050 no mesmo estágio em que estamos hoje, será um fracasso global”, finalizou.

Declaração de Belém

O documento reúne compromissos assumidos por autoridades e representantes da sociedade civil para fortalecer a governança ambiental, combater o crime organizado na região e impulsionar políticas sustentáveis com foco na proteção da floresta e dos povos amazônicos. A declaração será encaminhada à ONU e à Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima como contribuição oficial da COPLAD à COP30.

Entre as propostas apresentadas, o documento destaca a necessidade de um novo modelo de segurança ambiental plural, baseado no diálogo entre saberes e tecnologias, para orientar a transição ecológica na região. Também propõe a criação de um Monitor da Criminalidade na Amazônia, com foco em crimes ambientais como desmatamento, garimpo ilegal, biopirataria e trabalho análogo à escravidão. Outro ponto importante é o reconhecimento prático dos Direitos da Natureza, em sintonia com a resolução aprovada pela ONU em 2022, que considera a natureza como sujeito de direitos e parte fundamental para garantir o bem-estar das presentes e futuras gerações.

A declaração ainda recomenda a valorização de políticas urbanas inovadoras e sustentáveis, a inclusão do esporte como instrumento de desenvolvimento humano em territórios vulneráveis e o estímulo a cidades amazônicas inteligentes, que integrem soluções ecológicas, tecnológicas e culturais. Redigido em português e inglês, o texto reforça a importância da Amazônia como centro estratégico das decisões climáticas globais e busca mobilizar compromissos multilaterais concretos para o futuro da região.

 


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