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Adotado na Ufam, bônus a alunos locais no Sisu é utilizado em outros estados e tem contestações na Justiça

A lista de chamada de novos alunos da Universidade Federal do Amazonas chegou a ser suspensa pelo auxílio aos estudantes locais.

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Medida que ganhou relevância ao longo dos anos, a aplicação de um bônus na nota do Sistema de Seleção Unificada (Sisu) para candidatos que moram na mesma área da universidade tem gerado contestações na Justiça. Enquanto Sergipe está proibido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) de aplicar o benefício, outros 13 estados o utilizaram este ano e o número de cursos só cresce a cada ano, segundo informações do jornal O Globo. A lista de chamada de novos alunos da Universidade Federal do Amazonas chegou a ser suspensa pelo auxílio aos estudantes locais.

Em 2010, apenas 98 cursos adotaram o benefício, de acordo com Pedro Borges, doutorando da USP que pesquisa o tema. Em 2024, de acordo com os microdados da adesão das universidades ao Sisu, foram 1,3 mil — um aumento de 1.246%. Mesmo considerando o curto período de 2022 a 2024, o salto foi significativo, de 61%.

O bônus regional é uma medida que nasceu em 2010 e ganhou tração no Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Ele aumenta a nota dos candidatos de ampla concorrência — um aluno não pode escolher concorrer pela cota e ganhar o auxílio — que moram na mesma área da universidade. O acréscimo é de 3%, 5%, 10%, 15% ou 20%, dependendo da instituição. A abrangência geográfica dos beneficiados também varia a cada universidade. Algumas aumentam a nota apenas para moradores da cidade, mas também há aquelas que consideram uma região administrativa ou o estado inteiro.

Segundo Borges, a medida começou a ser aplicada nos campi de cidades do interior e atualmente já chegou às capitais. Em dois estados (Pernambuco e Rio Grande do Norte), as universidades federais protegem apenas o curso de Medicina para os seus cidadãos.

— A primeira descoberta da pesquisa foi que, de fato, cursos com bônus regionais recebem menos alunos de outros estados do que outros com perfil semelhante. Isso significa que eles são eficientes no objetivo de reservar essas vagas — afirma Borges. — O próximo passo será analisar o perfil socioeconômico dos beneficiários.

Na ampla concorrência, competem majoritariamente alunos de escolas privadas, brancos e que possuem renda per capita maior do que um salário mínimo e meio. Esses são os grupos que não são beneficiados em nenhuma cota. Com isso, uma hipótese é de que os bônus regionais estejam beneficiando estudantes de escolas particulares em relação a seus colegas com perfil semelhante ao de outros estados.

Um dos argumentos usados pelas instituições é de que os bônus em áreas com menor desenvolvimento socioeconômico garantem que os campi de universidades nessas localidades tenham vagas preenchidas por alunos locais, que, em tese, teriam desvantagens sobre competidores de áreas mais desenvolvidas, como o Sul e o Sudeste.

No entanto, os bônus regionais podem estar um pouco acentuados demais, na avaliação do pesquisador Pedro Borges. Segundo ele, a média em 2022, ano dos dados analisados, era de um acréscimo de 13% na nota. Isso significa, na maior parte dos casos, algo em torno de 85 pontos de vantagem. Nos cursos mais concorridos, então, quando qualquer vantagem conta ainda mais, o efeito é acentuado.

— A mobilidade estadual desapareceu em 20% das turmas que foram formadas com bônus. Isso significa que os aprovados da ampla concorrência foram apenas daquele estado ou região. Não sei se a política pública busca atingir esse nível de efeito — avalia.

O tema chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF). Em fevereiro, o ministro Cristiano Zanin negou um pedido da Universidade Federal de Sergipe para aplicar um bônus de 10% à nota final de candidatos que cursaram o ensino médio em escolas de Sergipe (para o vestibular do Campus Professor Antônio Garcia Filho) ou em municípios do Semiárido Sergipano (para o vestibular do Campus do Sertão) e adicional de 5% caso a escola seja pública. A análise, no entanto, não chegou a apreciar o mérito. O pedido da instituição foi rejeitado apenas por falta de um pressuposto processual.

Em outra decisão, o tribunal analisou um outro tipo de benefício que instituições de ensino superior pública tentaram dar a moradores de suas áreas. A Universidade do Estado do Amazonas determinou que 80% das vagas seriam preenchidas por egressos de escolas amazonenses. Alexandre de Moraes, redator do acórdão, alegou no caso que “não pode o ente federativo criar discriminações regionais infundadas, de forma a favorecer apenas os residentes em determinada região”. O caso não gerou repercussão geral por falta de consenso se vetava-se toda reserva de vaga ou apenas uma parte do oferecido.

A Justiça Federal do Amazonas chegou a interromper as matrículas da Universidade Federal do Amazonas por considerar ilegal o bônus de 20%, o que gerou um enorme temor entre os aprovados. Se a decisão tivesse sido mantida, toda a lista de selecionados teria que ser refeita. A ação foi movida por um candidato do Distrito Federal, que questionou 13 universidades públicas que têm essa política. Somente essa chegou a ser aceita, mas foi derrubada neste ano.

No meio dessa disputa jurídica, o senador Alessandro Vieira (MDB-SE) apresentou um projeto de lei para proibir o uso de critérios geográficos em ações afirmativas.

— Uma vez decidido que o bônus regional é inconstitucional, permitir que ele seja aplicado em um estado e não em outro prejudica os candidatos em regiões onde esses critérios são proibidos. Esses candidatos não podem se beneficiar de critérios regionais em suas localidades e são prejudicados ao competir com candidatos em outras instituições que ainda utilizam esses critérios — alega o parlamentar.

Na Câmara, um outro projeto, de 2015, tenta o caminho contrário. Ele prevê que o candidato de instituições federais de ensino que comprovar ter domicílio há pelo menos cinco anos na macrorregião do país em que se encontra a instituição em que pede a vaga “terá direito a um adicional de 10% na sua pontuação final no respectivo processo seletivo”. O texto é de autoria do ex-deputado Victor Mendes (MDB-MA) e a tramitação avançou no fim do ano passado. No entanto, a última movimentação foi um recurso, que ainda não foi apreciado, da deputada Julia Zanatta (PL-SC) contestando a legalidade da medida.


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