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Amazonas

Aquecimento do Pacífico e do Atlântico em 2023 se assemelha ao do ano da maior vazante do Rio Negro, diz estudo

Fenômenos que estão ocorrendo simultaneamente no oceano inibem a formação de chuvas sobre a floresta Amazônica.

O Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) informou que dois fenômenos simultâneos podem agravar e até prolongar a seca na Amazônia. Além do El Niño, que aumenta a temperatura das águas superficiais do oceano na região do Pacífico Equatorial, o aquecimento do Atlântico Tropical Norte, logo acima da linha do Equador, inibe a formação de nuvens, reduzindo o volume de chuvas na Amazônia.

Pesquisadores do Inpa, que monitoram os rios da bacia Amazônica, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que prevê redução das chuvas para a região Norte, e do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), que acompanha os impactos do El Niño no Brasil – todas vinculados ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) – apontam para a simultaneidade dos fenômenos.

“O evento do Atlântico Tropical Norte está se somando ao El Niño. Dois eventos ao mesmo tempo são preocupantes. Tivemos isso entre 2009 e 2010, que foi a maior seca registrada na bacia do rio Negro nos últimos 120 anos”, explica o meteorologista Renato Senna, responsável pelo monitoramento da bacia amazônica no Inpa.

Apesar de o reflexo dos dois fenômenos ocorrerem em regiões diferentes da Amazônia, o aquecimento das águas do oceano desencadeia um mecanismo de ação similar sobre a floresta. Com a água do oceano mais quente, as correntes ascendentes carregam ar aquecido para a atmosfera. Esse ar segue até a Amazônia por meio de duas correntes descendentes. No caso do El Niño, o processo ocorre de leste para oeste – a partir do Pacífico. No caso do Atlântico, do norte para o sul.

“Esse ar mais quente atua inibindo a formação de nuvens e, por consequência, das chuvas”, afirma Senna.

Organismos internacionais, como a Organização Meteorológica Mundial, mostram um planeta mais quente, com recordes de temperatura nos últimos meses. Além disso, o oceano também está mais aquecido. Segundo a nota técnica do Cemaden, o Oceano Pacífico Norte e o Atlântico Tropical estão apresentando temperaturas entre 2 e 4oC graus acima. É nesse novo contexto que os fenômenos estão ocorrendo.

De acordo com o pesquisador Renato Senna, nos anos em que esses eventos ocorreram de forma simultânea, houve atraso no início da estação chuvosa na Amazônia e foram registrados recordes históricos de seca. Além da estiagem expressiva registrada entre 2009 e 2010, houve um episódio em 2005.

“As condições começam a se repetir e provavelmente teremos uma grande seca, com atraso no início da estação chuvosa”, diz Senna.

Apesar de algumas regiões estarem recebendo pancadas de chuva, no momento, o Alto Solimões e a área de extremo leste da Amazônia já apresentam criticidade para navegação. Entre setembro e outubro, é natural haver uma baixa rápida dos rios na região amazônica. “Baixa cerca de 15 centímetros, ou até mais, por dia. Realmente, a gente vê o rio baixando dia após dia”, descreve.

A baixa que ocorre em três meses leva de oito a nove meses para encher novamente. Esse processo é explicado, em parte, pelo reflexo do período seco na região Centro-Oeste do país. De acordo com Senna, os grandes rios que deságuam nas bacias do Norte, como o Araguaia e o Tocantins, ficam longos períodos sem receber chuvas. Toda a margem direita, que é a direção da nascente para foz, dos rios tributários (ou afluentes) do Amazonas, não recebe grandes volumes de chuvas.

Renato Senna observa que a bacia do rio Negro deve ser a primeira a sofrer os impactos da seca e, em seguida, as demais regiões do Solimões. A previsão meteorológica é de que as chuvas para a região amazônica fiquem abaixo da média até novembro. Ainda não é possível prever por quanto tempo o início da estação chuvosa deve atrasar.

Senna menciona que, de acordo com os registros históricos, se entre 1903 e 2000 ocorria uma cheia a cada dez ou 15 anos, a partir dos anos 2000 tem sido registrada uma cheia a cada cerca de três anos. Os recordes históricos de elevação dos rios ocorreram em 2019, 2020 e 2021. As secas aumentaram de frequência e intensidade, mas as cheias têm sido muito maiores e frequentes, alerta o pesquisador do Inpa.

Ele avalia, no entanto, que a repercussão da seca na região é mais grave pelos impactos que provoca, como a geração de energia, navegabilidade e acesso à educação e saúde. “É um processo muito caótico para a região. As pessoas estão mais resilientes para as condições de cheias na região, mas não para as secas”, ressalta.

Queimadas

A especialista do Cemaden em secas na Amazônia, Liana Anderson, destaca que a atuação dos fenômenos simultâneos sobre a região também é motivo de preocupação com relação às queimadas. “Há uma extensão grande com risco de fogo pelas chuvas abaixo da média, aumento da temperatura, e agora temos um alerta de onda de calor. Tudo isso vai deixando toda a paisagem muito mais flamável”, analisa a especialista. “As áreas que foram desmatadas no ano passado em algum momento podem queimar”, complementa.

O assunto foi abordado na reunião sobre risco de impactos promovida pelo Cemaden periodicamente, apontando as áreas com maior probabilidade em municípios e em áreas protegidas. Segundo Liana, a projeção é motivo de mobilização de estruturas como defesa civil, brigadistas, batalhões de policiamento ambiental e corpo de bombeiros. “A questão é se estruturar para agir na nas áreas prioritárias”, afirma.


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