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Mudanças climáticas e não o El Niño foram a principal causa da seca da Amazônia, aponta estudo
O trabalho sobre a Amazônia reuniu 18 cientistas de Brasil, Reino Unido, Holanda e Estados Unidos.
As mudanças climáticas e não o El Niño foram a principal causa da seca histórica da Amazônia em 2023. Um estudo apresentado nesta quarta-feira (24/01)pela World Weather Attribution (WWA) revela que as mudanças climáticas fizeram a seca até 30 vezes mais provável no período de junho a novembro. As informações são do jornal O Globo.
A grande seca de 2023 foi a pior da História no Rio Negro e uma das mais severas já registrada em toda a região amazônica, com impacto em Brasil, Peru, Bolívia, Colômbia, Venezuela e Equador. No Brasil, o estado do Amazonas foi o mais afetado e teve praticamente todos os seus municípios atingidos.
Calor e estiagem extremos reduziram os mais volumosos rios da Terra a filetes d’água, espalharam doença e fome, isolaram milhões de pessoas, afetaram a economia e devastaram a fauna aquática.
O El Niño costuma ser associado a períodos de seca em parte da Amazônia, notadamente o Norte e o Leste. Mas em 2023 um evento extremo de seca e calor afetou quase toda a região. A análise do WWA revela que as condições para a seca começaram em abril, antes do El Niño. E a seca se espalhou por uma área fora da influência dele.
Assim, quando o El Niño se configurou no Pacífico, em junho, a Amazônia já estava em regime de seca. O El Niño se caracteriza pela elevação da temperatura da água do Pacífico Equatorial e influencia o sistema climático global. O El Niño agravou um cenário que já era muito ruim e reduziu ainda mais as chuvas, diz o estudo.
“O fator determinante para a seca foi o aumento das temperaturas na atmosfera, o calor. As temperaturas elevadas aumentaram a evaporação, esgotaram a umidade do solo, da vegetação”, explica Regina Rodrigues, uma das autoras do estudo e coordenadora do grupo que investiga o Oceano Atlântico e suas ondas de calor na Organização Meteorológica Mundial (OMM).
Regina acrescenta que a Zona de Convergência Intertropical (ZCIT), um imenso canal de umidade do oceano para a floresta, não se formou no início do ano passado, adicionando mais um elemento para produzir uma seca recorde.
O Atlântico Norte excepcionalmente quente por todo o ano de 2023 adicionou combustível extra para o calor e a seca, que dominaram o clima da maior floresta tropical úmida a partir de abril.
“É um resultado muito preocupante porque, diferentemente do El Niño, que é um fenômeno temporário, as mudanças climáticas não têm prazo para acabar e secas extremas podem se repetir com frequência maior”, destaca Regina, que é professora de Oceanografia da Universidade Federal de Santa Catarina.
A WWA é uma rede internacional de cientistas que, por meio de análises numéricas, analisa a chance de um determinado evento ter sido causado por mudanças climáticas associadas a ação humana ou se são parte da variabilidade natural do planeta. A grosso modo, os cientistas comparam o que aconteceria com ou sem emissões de gases-estufa provenientes de atividades humanas.
A rede já realizou mais de 60 estudos de extremos no mundo e tem seus dados usados pelo Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC). O trabalho sobre a Amazônia reuniu 18 cientistas de Brasil, Reino Unido, Holanda e Estados Unidos.
Uma das fundadoras da WWA, Friederick Otto, pesquisadora sênior de climatologia do Imperial College, em Londres, frisou que as mudanças climáticas e o desmatamento já alteram de forma significativa um dos ecossistemas mais importantes da Terra e alertou que, se as emissões de gases-estufa continuarem a crescer, as projeções indicam que a Amazônia poderá passar por secas antes previstas como essa a cada 13 anos – o esperado seria meio século.
Tipos de seca
No estudo da seca amazônica, os pesquisadores da WWA investigaram dois tipos de seca. A chamada seca agrícola, relacionada à temperatura e avaliada pela medição da umidade do solo e na vegetação. Neste caso, as mudanças climáticas tornaram a seca 30 vezes mais provável. A temperatura, explica Regina, é o indicador mais preciso porque existe uma bem estabelecida de base de dados.
Mas também foi avaliada a seca meteorológica, onde a chuva é medida. Nesse caso, a probabilidade de seca foi 10 vezes maior. Porém, os cientistas não têm dados de chuva tão consistentes quanto os de temperatura.
A seca evidenciou toda a fragilidade da Amazônia. Até o Rio Amazonas, o mais volumoso do mundo, virou riacho em alguns trechos. Os botos-cor-de-rosa, um dos símbolos da floresta, foram literalmente cozidos vivos no Lago Tefé e tiveram a maior mortalidade já registrada, com 150 animais mortos. Queimadas se alastraram e deixaram o ar de cidades como Manaus irrespirável, com nível de poluição muito acima do limite de perigo estabelecido pela Organização Mundial de Saúde (OMS).
“As florestas mais duramente atingidas foram justamente as mais bem preservadas. Isso mostra que estamos cutucando a besta do clima com a vara muito curta “, enfatiza Rodrigues.
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