Economia
Inflação até abril de itens da cesta básica já consome aumento de R$ 112 do salário mínimo
É a primeira vez desde 2016, até onde retrocede a pesquisa do órgão de defesa do consumidor, que o salário mínimo só dá para comprar a cesta básica.
A cesta básica de São Paulo subiu 6,38% em abril. Agora, quem ganha salário mínimo vai gastar praticamente toda a renda em itens de primeiríssima necessidade, que são os 39 produtos acompanhados pelo Procon-SP. Em dezembro do ano passado, a cesta custava R$ 1.088 e o salário mínimo era de R$ 1.100, sobravam R$ 12. Em abril, essa sobra caiu para R$ 2,29. O salário passou para R$ 1.212 e a cesta subiu para R$ 1.209,71.
É a primeira vez desde 2016, até onde retrocede a pesquisa do órgão de defesa do consumidor, que o salário mínimo só dá para comprar a cesta básica. Em abril de 2019, ainda sobravam R$ 259,15.
“Estamos vendo um aumento persistente dos produtos da cesta básica, não estamos vendo arrefecimento dessa crise. Não há perspectiva de fim da guerra da Ucrânia e ainda tem a escalada do preço do diesel e do petróleo”, afirma Marcus Vinicius Pujol, diretor de Estudos e Pesquisas do Procon-SP.
A correção anual do mínimo de R$ 112 não aguentou um quadrimestre de inflação este ano. Somente em abril, a cesta subiu R$ 72.
Esse é só um aspecto que mostra o arrocho salarial sendo o impeditivo para que a inflação fique ainda maior do que os 12% atuais. O rendimento médio real do trabalhador brasileiro de R$ 2.483 quando se desconta a inflação está no mesmo nível de 2011, de acordo com os cálculos da MB Associados.
“O salário real está em queda importante nos últimos dois anos, com inflação próximo de 10%. Em 2020, o auxílio emergencial aumentou a renda, mas assim que deixou de ser pago, a queda da renda ficou maior. O salário mínimo não tem aumento real. A inflação está corroendo não só a renda da população mais pobre, mas da classe média também”, afirma Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, lembrando que a inflação dos alimentos ficou em 35% nos últimos três anos.
No setor de serviços intensivo em mão de obra, a situação é pior. Os trabalhadores nos serviços de alojamento e alimentação estão com salários reais 11,7% abaixo de 2012. No Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), os serviços pessoais subiram só 3,91% nos últimos 12 meses, frente a uma inflação média de 12,13%.
A cabeleireira e microempreendedora Maria Claudimere Bezerra, de 50 anos, abriu o seu salão de beleza no fim de 2019.
“Foi complicado porque não tinha como voltar atrás da decisão de abrir o salão e tive que segurar a onda porque havia um contrato. Quem sobreviveu à pandemia está pagando a conta agora. Estou faturando mais, minha clientela aumentou, porém, as contas também subiram. E, com isso, estou sempre por um triz de entrar no vermelho”, afirmou a carioca, que já iniciou um plano de racionamento para fechar as contas.
Maria Claudimere não reajusta o preço do serviço de manicure desde que abriu o salão e, agora, ainda faz promoções para manter a clientela: pé e mão pagos à vista saem a R$ 45 em qualquer dia da semana, em vez dos R$ 55 cobrados em outro tipo de pagamento.
“Estamos tentando sobreviver de alguma forma. Manter o negócio funcionando. Eu tento garantir o salário das minhas funcionárias e o bom preço para as minhas clientes que entendem a minha situação. É difícil, admito, mas a gente tenta ir empurrando com a barriga até onde der”, completou.
Apesar de a microempreendedora não ter conseguido repassar o aumento dos custos do salão, os preços começam a aumentar. Ainda bem abaixo da inflação média de 12%: o serviço de manicure subiu 8,81% e de cabeleireiro 8,08%.
A alimentação fora do domicílio mostra como os repasses estão mais difíceis nos setores que empregam mais. Esse grupo que agrega serviços subiu somente 6,63% nos últimos 12 meses, apesar de a alimentação dentro de casa ter subido 16,12%.
“Mas os serviços estão em aceleração, perto de 7%. Tem uma pressão que está começando a aparecer. Efeito da saída da pandemia”, diz Vale.
Uma análise da inflação por grupos, desde março de 2020 até fevereiro deste ano, mostra que a alimentação no domicílio aumentou 30%, os administrados (gasolina, energia) subiram perto de 20%. Na outra ponta, os serviços em geral subiram 8% e os serviços prestados às famílias, mais intensivo em mão de obra, ficaram 4% mais caros desde a pandemia, segundo levantamento da Tullet Prebon Brasil.
“É a maior inflação com a pior composição. Não há como fugir de tarifas e alimentos. Comida e administrados sobem desde a pandemia. Os serviços intensivos em trabalho estão na lanterna. É uma inflação carregada de efeitos distributivos muito duros”, observa a Tullett Prebon Brasil em trecho da análise.
Altas recorrentes
Maria Claudimere diz que seus custos no salão de beleza mais do que dobraram em cinco meses. Ela vem substituindo marcas para não precisar mexer no preço do serviço. Acostumada a gastar em média R$ 1.500 comprando esmaltes de marcas líderes, optou por outras mais baratas:
“Gastei R$ 1.400 mesmo procurando promoções. Estou fazendo desse jeito para tentar ganhar na quantidade e não ter que passar o aumento para as clientes nem ter que mandar minhas manicures embora.”
Segundo Patricia Costa, economista do Dieese, essa situação de inflação alta e localizada, desemprego e queda da renda do trabalho estão “levando famílias a ter que escolher entre comprar comida e gás”:
“As famílias estão comendo menos ou comendo mal, reduzindo a qualidade e a quantidade.”
Ela lembra que a inflação alta dos alimentos básicos não vem de hoje:
“Temos falado dessa questão desde 2020. Avisamos que isso uma hora ia acabar se espalhando. No fim de 2020, o INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor, que calcula a variação de preços de famílias com renda até cinco mínimos) foi de 4,45%, com os alimentos subindo 15%.”
A informação é do site IG.
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