Economia
Banco Central mantém taxa Selic 2% ao ano em última reunião de 2020 do Copom
A taxa básica de juros permaneceu inalterada pela terceira reunião seguida do Comitê de Política Monetária; definição ocorreu em meio à pressão inflacionária.
Na última reunião deste ano, o Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central, decidiu manter a taxa básica de juros (Selic) a 2% ao ano. A definição desta quarta-feira (9) ocorre em meio à pressão inflacionária, especialmente com a alta nos preços de alimentos e combustíveis. As informações são do jornal Folha de S.Paulo.
Esta é a terceira reunião seguida em que não há alteração na taxa Selic depois de longo ciclo de queda, iniciado em julho de 2019. O comitê sinalizou que deve manter a taxa neste patamar na próxima reunião, mas anunciou que abandonará em breve o compromisso de não subir juros.
Com o choque recente nos preços, o mercado tem aumentado as expectativas de inflação para o fechamento deste ano e para o próximo. Isso poderia levar o BC a aumentar os juros.
A decisão, no entanto, ficou em linha com a expectativa do mercado. Analistas consultados pela Bloomberg previram a manutenção da taxa, conforme indicado pelo comitê na reunião anterior.
“Apesar da pressão inflacionária mais forte no curto prazo, o Comitê mantém o diagnóstico de que os choques atuais são temporários, mas segue monitorando sua evolução com atenção, em particular as medidas de inflação subjacente”, completou.
O BC revisou as projeções para a inflação no cenário básico, com a taxa de juros a 2% a.a. em 2020, 3% a.a. em 2021 e 4,50% a.a. em 2022, e o dólar a R$ 5,25, as projeções do Copom para a inflação são de 4,3% para 2020, 3,4% para 2021 e 3,4% para 2022.
Já no cenário com taxa de juros constante a 2% a.a. e taxa de câmbio a R$ 5,25, as projeções para a inflação são de torno de 4,3% para 2020, 3,5% para 2021 e 4% para 2022.
Segundo o relatório Focus do BC desta semana, os economistas esperam que os preços subam 4,21% no ano, acima da meta de 4% fixada pelo CMN (Conselho Monetário Nacional), mas dentro do limite de tolerância de 1,5 ponto para baixo ou para cima. Há um mês, a projeção era de 3,20%.
Desde o início da crise gerada pelo novo coronavírus, as estimativas vinham abaixo de 2%. Na semana da reunião anterior do Copom, no fim de outubro, o mercado esperava inflação de 2,99%.
“O comunicado traz maior preocupação com a inflação, embora tenha reiterado que se trata de um choque temporário”, disse Breno Martins, economista da MAG Investimentos.
No comunicado, o comitê repetiu que a inflação permanece com fatos de risco em duas direções. A baixa atividade econômica pode puxá-la para baixo. “Esse risco se intensifica caso uma reversão mais lenta dos efeitos da pandemia prolongue o ambiente de elevada incerteza e de aumento da poupança precaucional”, disse.
Por outro lado, a piora nas contas públicas com o prolongamento das políticas fiscais de resposta à pandemia podem puxar os preços para cima. Além disso, o BC destacou que “frustrações em relação à continuidade das reformas, podem elevar os prêmios de risco”.
“O risco fiscal elevado segue criando uma assimetria altista no balanço de riscos, ou seja, com trajetórias para a inflação acima do projetado no horizonte relevante para a política monetária”, completou.
Segundo o texto, o BC manteve o compromisso de não subir juros a menos que as expectativas de inflação sejam elevadas acima da meta ou que o regime fiscal seja alterado, mas anunciou que o instrumento deve ser retirado em breve.
Essa indicação é um instrumento secundário de política monetária, chamado de “forward guidance”, ou prescrição futura. Como o comitê avalia que a taxa Selic está próxima do seu limite mínimo, o BC teve que recorrer ao recurso para tentar diminuir a especulação em torno da taxa básica de juros futura e aumentar o estímulo à economia sem cortar ainda mais os juros.
“A manutenção desse cenário de convergência da inflação [à meta] sugere que, em breve, as condições para a manutenção do forward guidance podem não mais ser satisfeitas, o que não implica mecanicamente uma elevação da taxa de juros pois a conjuntura econômica continua a prescrever estímulo extraordinariamente elevado frente às incertezas quanto à evolução da atividade”, disse o texto.
“No cenário de retirada do forward guidance, a condução da política monetária seguirá o receituário do regime de metas para a inflação, baseado na análise da inflação prospectiva e de seu balanço de riscos”, pontuou o Copom. Apesar da sinalização de que não usará mais o instrumento, o comitê avalia que seu efeito foi positivo.
“A decisão veio sem surpresas, mas o comunicado foi mais hawk, especialmente com a indicação de retirada do forward guidance”, avaliou Martins. Para ele, no entanto, a sinalização deve aliviar a pressão cambial.
Com maior tendência a subir juros no próximo ano, o país pode atrair mais capital estrangeiro, fazendo com que o real se valorize. Hawk significa falcão em inglês e é um jargão usado entre economistas para apontar postura contracionista do BC, mais agressiva e com tendência a subir juros.
Ao contrário, quando é considerado dove, pombo em inglês, a autoridade monetária adota um discurso mais brando e expansionista, com intenção de cortar juros. Martins considerou o movimento do BC prematuro, já que alguns economistas já trabalham com expectativa de deflação para o início do próximo ano.
“O BC cedeu à pressão do mercado, mas pode ser que tenhamos surpresas para baixo nos índices de preços”, analisou.
O economista-chefe da Ativa Investimentos, Étore Sanchez também considerou o comunicado mais duro. “O parágrafo inesperado foi a abertura de porta para remoção do forward guidance por um motivo relativamente neutro. O timing acaba atribuindo para um caráter relativamente hawk”, disse. “Ainda que na direção que alguns alarmistas sobre a hiperinflação apontaram, o BC sinalizou para remoção do instrumento, mas não citou a pressão inflacionária das expectativas de 2021. Deu prazo de validade curto”, explicou Sanchez.
“Em outras palavras, a ação do BC, em dar prazo de validade curto é hawk, ainda que por aspectos “operacionais” do regime de metas. Na contramão, o BC buscou ressaltar que não há relação mecânica entre a queda do forward guidance e a elevação de juros”, pontuou o analista. O economista-chefe da Messem Investimentos, Gustavo Bertotti, afirmou que o BC não deve subir juros na próxima reunião, mesmo com possível retirada do fowrard guidance.
“Isso deve ocorrer depois do segundo trimestre de 2021”, disse o analista. Ele destaca ainda que o BC fechou a porta para novo corte de juros. “No comunicado passado ainda tínhamos a parte que falava sobre espaço para utilização de política monetária, que se houvesse, seria pequeno. Esse trecho foi retirado”, comparou.
Marcela Rocha, economista-chefe da Claritas Investimentos, ponderou que o comitê deixou claro que a retirada do instrumento não leva à alta automática de juros. “A mensagem mostra que o BC está se preparando para não ter mais o compromisso de não subir juros, mas fez questão de enfatizar que as condições [da economia] ainda necessitam estímulo elevado e que não implicará em aumento mecânico da taxa”, analisou.
“O Copom vai voltar para o modo antigo de analisar o balanço de risco. Pelo comunicado, o comitê mostrou conforto com a taxa de juros neste patamar, acredito não deve mudar por um longo período, somente no quarto trimestre de 2021”, completou.
O economista do Santander, Maurício Oreng, concorda que o tom adotado foi mais duro. “É uma questão de ano-calendário, quando 2022 começa a ganhar mais peso. Com isso, passa a não fazer tanto sentido manter o forward guidance”, disse.
Com a mudança, a instituição deve mudar sua projeção para a Selic no próximo ano. “Estávamos prevendo que a Selic ficaria estável até o fim de 2021, mas vamos rever”, afirmou. “Consideramos que as sinalizações dadas pelo BC são compatíveis com nosso cenário de alta de juros a partir de agosto do ano que vem, levando a Selic para 3%”, afirmou o economista do Banco Votorantim, Carlos Lopes. Apesar da sinalização de que não usará mais o instrumento, o comitê avalia que seu efeito foi positivo.
“O Copom avalia que, desde a adoção do forward guidance, observou-se uma reversão da tendência de queda das expectativas de inflação em relação às metas para o horizonte relevante. Além disso, ao longo dos próximos meses, o ano-calendário de 2021 perderá relevância em detrimento ao de 2022, que está com projeções e expectativas de inflação em torno da meta”, ressaltou.
O BC cita ainda a segunda onda em outros países como desafio para a retomada da economia, mas fala sobre o surgimento das vacinas como positivo. “No cenário externo, a ressurgência da pandemia em algumas das principais economias tem revertido os ganhos na mobilidade e deverá afetar a atividade econômica no curto prazo”, disse.
“No entanto, os resultados promissores nos testes das vacinas contra a Covid-19 tendem a trazer melhora da confiança e normalização da atividade no médio prazo”, ponderou o texto. Além disso, o comitê destaca que a baixa atividade econômica favorece a manutenção dos juros em patamares baixos. “A presença de ociosidade, assim como a comunicação dos principais bancos centrais, sugere que os estímulos monetários terão longa duração, permitindo um ambiente favorável para economias emergentes.”
Em relação à economia brasileira, o BC diz que indicadores recentes sugerem a continuidade da recuperação desigual entre setores, “em linha com o esperado”. “Contudo, prospectivamente, a incerteza sobre o ritmo de crescimento da economia permanece acima da usual, sobretudo para o período a partir do final deste ano, concomitantemente ao esperado arrefecimento dos efeitos dos auxílios emergenciais”, colocou.
A Selic é um dos instrumentos usados pelo BC para controlar a inflação. Quando o índice está alto, a autoridade monetária sobe os juros com o objetivo de reduzir o estímulo na atividade econômica, o que diminui o consumo e equilibra os preços. Caso contrário, o BC pode reduzir juros para estimular a economia.
Antes da pandemia, em fevereiro, a autoridade monetária havia indicado que a taxa ficaria em 4,25% ao ano nas reuniões seguintes, depois de cinco reduções seguidas.
O BC retomou o ciclo de queda da Selic com a deterioração do cenário econômico. Até agosto, os juros caíram em todas as reuniões, mas o ciclo de queda foi interrompido em setembro.
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