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Brasil

Proprietários rurais são responsáveis pelos maiores incêndios florestais registrados no país em 2024

Fazendeiros, empresários e advogados donos de propriedades rurais foram identificados pelo governo federal como responsáveis pelos megaincêndios florestais no Brasil este ano.

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Levantamento do jornal O Globo  revela que o Ibama aplicou R$ 451 milhões em multas contra 138 alvos por queimadas na Amazônia e no Pantanal. É o maior valor já cobrado pelo órgão. A maioria dos autuados é acusada de destruir e danificar vegetação nativa com o fogo e sem autorização da autoridade ambiental.

A Advocacia-Geral da União entrou com cinco ações civis contra infratores ambientais por destruir áreas em Altamira (PA), Boca do Acre (AM), Buritis (RO), Lábrea (AM) e São Felix do Xingu (PA), sobretudo com fogo. A AGU cobra um total de R$ 89 milhões. A Polícia Federal abriu 83 inquéritos em 2023 e 2024 para apurar a autoria dos incêndios.

Uma das maiores queimadas neste ano, em uma área de 333 mil hectares, equivalente a duas vezes a cidade de São Paulo, foi atribuída ao advogado Luiz Gustavo Battaglin Maciel e ao fazendeiro Ademir Aparecido de Jesus, que possuem fazendas em Corumbá (MS). Procurados, ambos não se manifestaram.

No mês passado, cada um foi multado em R$ 50 milhões (o teto máximo permitido por lei, que define R$ 5 mil por hectare destruído). Nos autos, eles negaram a responsabilidade pelo fogo.

Segundo um relatório do Ibama, o incêndio começou em uma área reivindicada pelos dois e demorou 110 dias para ser controlado, além de atingir outros 135 imóveis rurais. Os fiscais afirmaram que “não há vestígios de combate ao incêndio” da parte dos dois e houve negligência na adoção de “medidas de prevenção e controle do uso do fogo”, como a colocação de aceiros (faixa de terra que serve como barreira para propagação de incêndios).

Para o instituto, Battaglin e Aparecido não tomaram nenhuma providência porque o fogo possibilitou a abertura de pastagem para gado. “Nenhum dos dois supostos proprietários informou estar utilizando a área por meio de atividade pecuária”, diz o relatório. “Contudo, ficou constatado que existe gado distribuído de forma esparsa pela área”.

Outra prova apontada pela agência é que o local não é uma área de passagem de terceiros a quem se pudesse atribuir o foco inicial do fogo. O Ibama fez uma vistoria na área em setembro e compartilhou os laudos com o Ministério Público Federal.

Multado desde 1995

Na Amazônia, um dos fazendeiros que levou a maior multa (R$ 13,9 milhões) é o pecuarista Delmir José Alba, conhecido como Nego Alba. O Ibama o acusa de impedir a regeneração natural de 2.792 hectares de área embargada pelo uso do fogo.

Nascido em Santa Catarina, Alba se estabeleceu entre Novo Progresso e Altamira, no Sul do Pará, nos anos 1990, com o objetivo de tocar empreendimentos do agronegócio. Desde 1995, se tornou alvo de multas do órgão ambiental. Em 2020, o pecuarista foi intimado pela Polícia Civil a dar explicações sobre um dos maiores desmatamentos contínuos, de 4.350 hectares, feitos na Amazônia.

Aos policiais, Alba admitiu que começou a desmatar a área para a criação de gado e produção agrícola, e tinha o objetivo de derrubar “80% da propriedade”. Segundo o depoimento, o pecuarista também contratou trabalhadores para limparem a área com uma motosserra. Mas alegou que “não pretendia fazer queimada” nem vender a madeira derrubada.

Os fiscais do governo paraense encontraram pelo menos uma castanheira, árvore considerada a rainha da Amazônia, que pode chegar a 50 metros de altura, derrubada nas terras de Alba. “A estrutura atual do desmatamento indica que a área está sendo preparada para ocorrer uma intensa queima florestal que posteriormente será utilizada como pasto”, registraram os agentes da Secretaria de Meio Ambiente do Pará, contradizendo a versão do produtor. Procurado por meio da sua defesa, ele não se manifestou.

Em 2023, a Justiça estadual atendeu ao pedido do governo do Pará para bloquear R$ 100 mil das contas de Alba. O estado ainda pediu uma indenização de RS 46,9 milhões a ser paga pelo produtor, o que ainda não foi avaliado pelo juiz encarregado do caso.

A seca ajudou Alba a obter da Justiça Federal um prazo maior para retirar o gado de uma área embargada pelo Ibama. O pecuarista multado por queimadas argumentou que a profusão de incêndios atrapalha o cumprimento da ordem.

Multas judicializadas

O diretor de Proteção Ambiental do Ibama, Jair Schmitt, avalia que apenas 20% das multas ambientais são efetivamente pagas sem que o caso seja judicializado.

— Isso é pouco, mas veja quantas pessoas são condenadas por crimes de incêndio no Brasil: menos de 1%. Essa ainda é uma das melhores ferramentas para coibir esse tipo de infração — conclui Schmitt.

Geralmente, cada multa aplicada pelo Ibama gera um embargo na área degradada. Segundo o dirigente do órgão de proteção ambiental, a sanção costuma ter um impacto mais dissuasório.

— O embargo tem um efeito mais eficiente por ser mais temido. Ele restringe a pessoa a utilizar a área, cria barreiras para ela ter vantagens econômicas, como o crédito rural. Quem compra produtos de áreas embargadas também fica sujeito à lei, como se fosse um crime de receptação — explica.

O Ibama montou uma força-tarefa na Amazônia e no Pantanal para identificar os autores dos incêndios. Como houve um recorde nos focos de incêndio em 2024, é natural que haja um volume maior na quantidade de multas.

— Quanto você tem uma epidemia de dengue, você concentra todos os esforços para acabar com ela. É o que aconteceu com as queimadas — disse.

O professor da Faculdade Mackenzie Brasileira Pedro Abi Eçab, autor do livro “Direito Ambiental”, avalia que o Estado tem dificuldade de receber as multas não só por causa da judicialização das autuações, mas pela falta de funcionários para acompanhar os casos.

— Não é só a área ambiental. O processo de execução fiscal é ruim para todo mundo. O ideal seria dar meios de cobrança para que o próprio órgão público penhore o valor ou oficie o sistema bancário, como ocorreu com as multas de trânsito — avalia.

Os supermultados

-Luiz Gustavo Battaglin Maciel: O advogado é um dos defensores do traficante Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar, e é dono da Fazenda Astúrias, em Corumbá (MS). Battaglin foi multado pelo Ibama em R$ 50 milhões em setembro por não ter tomado medidas para deter o fogo que devastou 333 mil hectares a partir de uma área que disputa com o fazendeiro Ademir Aparecido de Jesus. No mês passado, no início das investigações pelo fogo, ele alegou em nota que era vítima da queimada.

-Ademir Aparecido de Jesus: Proprietário da Fazenda Vitória, disputa com Battaglin a área onde teria começado o incêndio em junho que levou 110 dias para ser controlado e chegou a outros 135 imóveis rurais. O fazendeiro foi multado também em 50 milhões. Segundo o Ibama, a disputa é comprovada pela autorização buscada por Aparecido para “executar atividades na gleba” na área, contestadas por Bataglin, por “denúncias formais a vários órgãos”, incluindo o instituto. Para o Ibama, os dois cruzaram os braços diante do fogo porque ambos estavam interessados em abrir pastagens.

-Delmir José Alba: Nascido em Santa Catarina, o fazendeiro multado em R$ 13,9 milhões por usar o fogo para impedir a regeneração de 2.792 hectares de área embargada se estabeleceu nos anos 1990 entre Novo Progresso e Altamira, no Sul do Pará. O objetivo na época já era tocar empreendimentos do agronegócio. Desde 1995, Alba se tornou alvo de multas do órgão ambiental. Em 2020, foi intimado pela Polícia Civil a dar explicações sobre um dos maiores desmatamentos contínuos feitos na Amazônia, de 4.350 hectares.


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