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Países pedem COP fora de Belém: Brasil tem até 11 de agosto para resolver crise de hospedagem 

Desde o anúncio da escolha da capital paraense como sede, proprietários de imóveis e hoteleiros locais viram uma oportunidade única de maximizar lucros

Belém, capital do Pará. (Foto:Reprodução)

Uma reunião de emergência agitou os corredores do Secretariado da Convenção do Clima das Nações Unidas na última terça-feira, 29, e representou mais um capítulo de uma tensão que se arrasta – e agrava – há meses. As informações são da Exame.

O encontro, solicitado pelo Grupo Africano de Negociadores, teve por objetivo tratar da questão que os organizadores da COP30 tentam contornar desde que Belém foi confirmada como sede: os preços de hospedagem, que atingiram patamares que ameaçam transformar a conferência climática mais importante do ano em privilégio de poucos.

Desde o anúncio da escolha da capital paraense como sede, proprietários de imóveis e hoteleiros locais viram uma oportunidade única de maximizar lucros.

O resultado chegou aos gabinetes internacionais na forma de cotações que alcançam até US$ 700 por pessoa por noite. Um valor que dois representantes da ONU revelaram à Reuters para ilustrar dimensão do problema que enfrentam.

O montante supera em quase cinco vezes a ajuda de custo diária de US$ 149 que a organização oferece para Belém, deixando nações em desenvolvimento em posição insustentável para participar das negociações.

Também em entrevista à Reuters, Richard Muyungi, líder do Grupo Africano de Negociadores, declarou: “Não estamos prontos para reduzir os números [de negociadores]. O Brasil tem muitas opções para termos uma COP melhor. Por isso, estamos forçando que o país forneça respostas melhores, em vez de nos dizer para limitar nossa delegação”.

Muyungi carrega em suas palavras o peso de representar um continente que historicamente sofre as maiores consequências das mudanças climáticas, mas enfrenta barreiras sistêmicas para influenciar as decisões globais sobre o tema.

E uma das maiores delas é justamente a menor capacidade de arcar com custos elevados de participação.

Soluções experimentais em múltiplas frentes
Atuando em conjunto, as esferas federal e estadual do governo dizer estar operando em várias direções, testando alternativas que vão do convencional ao inédito, em uma sucessão de medidas para equilibrar a limitada capacidade hoteleira de Belém com a magnitude do evento que se aproxima.

“Estruturamos uma estratégia instituindo comitês específicos para acompanhar todos os processos relacionados à COP30, que inclui alinhar prioridades, somar esforços e viabilizar a infraestrutura necessária”, disse Valter Correia da Silva, secretário extraordinário da COP30, sobre a complexa operação logística.

O esforço já passou por diversas fases. Passou pelo anúncio de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com a rede hoteleira, tentativa de criar um teto de tarifas que se mostrou insuficiente diante da demanda. E também pela antecipação da Cúpula de Líderes, estratégia para diluir a concentração de participantes. Agora, alternativas mais ousadas ganharam espaço.

Bruno Chagas, secretário de Estado de Cultura do Pará, detalha os números que revelam tanto avanços quanto a magnitude do problema. “Só de hotel nós teremos quase 15.000 leitos. Com o Airbnb, saímos de 700 leitos que estavam disponíveis pré-COP para 17.000 leitos”, explica.

“E temos esses cruzeiros com cerca de 5.000 opções nos padrões A e B, que eram a principal demanda”, complementa Chagas, referindo-se à contratação emergencial dos navios MSC Seaview e Costa Diadema por 263 milhões de reais; saída que poucos anos atrás seria impensável para uma conferência climática.

Sobre os limites do poder público diante da especulação imobiliária, o secretário pondera:

“Temos certa dificuldade de agir pelos preços abusivos, porque existe a livre-iniciativa, mas seguimos dialogando tanto da parte do governo estadual quanto do federal”

Em entrevista para EXAME por email, Helder Barbalho, governador do Pará, acrescenta que, além dos “hotéis flutuantes”, houve reforma de escolas no padrão hostel, a construção da Vila COP 30 para chefes de estado, ampliação da rede hoteleira com novos empreendimentos internacionais e modernização das instalações atuais através de incentivos fiscais.

“Com programas como o Capacita COP30, permitimos ainda que o setor produtivo tenha mão de obra qualificada ao mesmo tempo que milhares de pessoas ganham novas oportunidades de emprego e renda antes, durante e depois da conferência da ONU”, avalia o governador.

Barbalho lembra ainda que embora o Governo do Pará não tenha recebido denúncias formais, há ações educativas em curso para monitorar preços e orientar sobre direitos e obrigações.

Dilema atinge também nações ricas
A crise habitacional não faz distinção econômica. Representantes de seis governos, incluindo outras nações europeias, confirmaram à Reuters que ainda não garantiram acomodações devido às tarifas elevadas.

Um porta-voz do governo holandês revelou que o país avalia reduzir pela metade sua tradicional delegação de 90 pessoas.

Para a Polônia, o cenário é mais crítico. “Não temos acomodação. Provavelmente teremos que reduzir a delegação ao osso. Ou, em um cenário extremo, talvez tenhamos que não comparecer”, declarou Krzysztof Bolesta, vice-ministro do clima polonês.

Em uma conversa para a imprensa internacional na tarde desta quinta-feira, 31, o embaixador André Corrêa do Lago, presidente da COP30, que “revoltados com a falta de sensibilidade sobretudo com nações mais pobres, países pediram que a conferência não aconteça em Belém”.

De acordo com ele, é fato que em outras COPs o custo de oportunidade aplicado às tarifas tenha sido cerca de três vezes acima de valores praticados em outras ocasiões.

“Contudo, aqui chega a dez, quinze vezes mais. Creio que os hotéis não tenham percebido a crise que está se gerando”, ponderou o diplomata. “Mas há um esforço grande coordenado pela Casa Civil, para convencer a baixar os preços, visto que a legislação brasileira não pode impor isso”, explicou.

A pressão internacional forçou o Brasil a assumir um compromisso público durante a reunião de emergência.

Segundo Richard Muyungi, os representantes brasileiros se comprometeram a fazer uma nova análise e verificar possíveis medidas adicionais para garantir a participação de todos os países nas negociações climáticas.

O prazo é apertado: 11 de agosto. Nessa data, em nova reunião com o Secretariado da ONU, o Brasil deverá apresentar alternativas concretas que possam reverter o cenário de exclusão que se desenha.


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