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Moradores de comunidades nas margens do rio Amazonas enfrentam falta de água, mostra site

No Estado do Amapá, vizinhos ao Amazonas, maior rio do mundo, com vazão de 209 mil metros cúbicos (m³) por segundo, os moradores das comunidades locais têm sede boa parte do ano.

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Comunidade no Bailique, rio Amazonas, no Amapá. (Foto:Reprodução)

São 13h e o termômetro marca 32°C. Está quente no dia que teve mínima de 26°C, às 6h. Falta água potável para beber, banhar, escovar os dentes e cozinhar. É um dia típico do fim de junho e a escassez hídrica vai perdurar até janeiro. O líquido transparente, incolor, geralmente insípido e inodoro, estará praticamente indisponível, como mostra reportagem no site Metrópoles.

Esta descrição poderia se aplicar a muitos municípios de regiões áridas do Nordeste brasileiro, mas estamos nos referindo ao arquipélago do Bailique, no Estado do Amapá. Vizinhos do Amazonas, maior rio do mundo, com vazão de 209 mil metros cúbicos (m³) por segundo, os moradores das comunidades locais têm sede boa parte do ano.

A água que corre por rios e canais das oito ilhas do arquipélago fica salgada boa parte do ano. Tão salgada que prejudica, além do dia a dia das pessoas, a saúde e a economia local. A salinização é um fenômeno natural na região, mas que se agravou nos últimos anos, estendendo a duração dele, conforme relatos dos ribeirinhos.

Das oito ilhas do arquipélago, seis são habitadas e as demais não. Há aproximadamente 2,5 mil famílias. Emprego e renda não são para todos. É uma região empobrecida. A sensação de insegurança é grande, devido aos recorrentes crimes violentos.

Moradora da Vila Progresso, na Ilha do Marinheiro, a tabeliã Josielma Maciel Vilhena, de 43 anos, é uma das pessoas cercadas por água, mas que enfrenta dificuldades para realizar as atividades diárias que dependem dela.

A mulher, que está desempregada, reside com três filhos, de 14 a 25 anos, e uma nora. Ela se considera relativamente privilegiada por poder retirar a água sem custos em um projeto social. Antes, pagava R$ 12 por um galão que durava dois dias. Embora tenha água de boa qualidade para beber, as outras atividades ficam prejudicadas.

“A água que a gente pega no projeto é só para consumo mesmo, fazer comida e bater o açaí (…) “(A água salgada) causa irritação, causa alergia. Quando começaram a dar água salgada, que eu comecei a escovar os dentes, minha boca ficou toda alérgica. Tenho de escovar com a água mineral. Agora imagina as crianças?”, se queixa.

Nascida e criada no arquipélago, ela conta que o problema começou há 4 anos. A água para lavar roupas e banhar vem do Rio Marinheiro, retirada por uma bomba hidráulica. A situação influencia até no aspecto emocional. “É uma situação muito ruim e ao mesmo tempo triste, porque até então nunca tinha enfrentado algo assim. É muito constrangedor”, lamenta.

Sanilização intensificada

Pesquisador do Instituto de Pesquisas Cientificas e Tecnológicas do Estado (Iepa) do Amapá, Orleno Marques Junior afirma que a intensificação do fenômeno é atribuída a uma combinação de fatores, entre elas o fechamento da antiga foz do rio Araguari.

“A vazão média mensal despejada pelo rio no Oceano Atlântico variava entre 190 m³/s (novembro) e 1.916 m³/s (março). Com o cessamento da vazão do Araguari que chegava ao Oceano Atlântico, a intrusão salina foi facilitada, o que pode ser uma das causas para a intensificação da salinização da água no arquipélago. Outra questão são as mudanças climáticas globais, que afetam os padrões de precipitação, aumento da radiação solar e a elevação do nível do mar, exacerbando a salinização das águas costeiras”, explica Marques Junior.

O pesquisador, que também é doutor em Planejamento Energético do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-graduação e Pesquisa de Engenharia (Coppe), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), detalha a relação da salinização com a emergência climática. “Estudos indicam que a elevação do nível do mar, causada principalmente pelo aquecimento global e pelo derretimento das geleiras, permite que a água salgada do oceano invada aquíferos e sistemas de água doce, exacerbando o problema da salinização”, completa, além de ressalvar ser necessário um monitoramento adequado.

O sal na água a torna desagradável. Se banhar com ela pode causar feridas na pele. As roupas que se lava na água salgada levam consigo o sal para o contato com o corpo e diminui a durabilidade das peças. Aqueles que precisam dela para extração da polpa do açaí envolta do caroço, uma atividade importante na região, têm o negócio inviabilizado.

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Saúde

Um agente de saúde da região, que pediu para não ser identificado, afirma que a falta de água livre de contaminantes para beber leva a vários problemas de saúde causados por parasitas. “O que mais acarreta a ida dessas pessoas para a unidade de saúde é o tratamento das parasitoses. O paciente apresenta problemas gastrointestinais.” Os relatos são de cólicas abdominais, dores e vômito.

Quando chove, os moradores captam água da chuva. Apenas uma comunidade tem acesso à água que passa pelo processo de dessalinização. Aos demais, resta usar hipoclorito de sódio para tornar a água potável, mas não livre do sal. No entanto, o recurso não é suficiente para todos. O deslocamento é difícil, e buscar a água que foi dessalinizada é tarefa difícil para muitos, que não conseguem carregar os galões de 20 litros.

“As informações do comércio local é que a produção de água de garrote (galões) não é suficiente para atender a toda a demanda neste período de salinização”, afirma consultora do Instituto Bempescado, Pollyana de Freitas Andrade.

A consultora conta que o mais adequado é promover a disponibilidade de equipamentos dessalinizadores, como o instalado na Comunidade Vila Progresso. O dispositivo tem capacidade de produzir até 125 garrafões de 20 litros por hora.

“As comunidades entram muito no rio. Por conta desta logística, a solução mais adequada é ter dessalinizador no local, em vez de ficar dependendo dos barcos de linha (que fazem trajetos regulares) ou do translado de barcos menores para levar galões que não são suficientes. Mesmo porque esses barcos dão conta de parte da demanda, não de tudo”, explica Pollyana.

O Metrópoles procurou a Secretaria de Estado do Meio Ambiente (Sema) e a Secretaria da Saúde do Amapá. No entanto, nenhum dos órgãos respondeu até a última atualização desta matéria.


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