Brasil
Governo Bolsonaro autoriza pesca esportiva em áreas de conservação ambiental
Uma portaria do ICMBio, instituto vinculado ao Ministério do Meio Ambiente, autorizou a pesca esportiva em unidades de conservação ambiental em todos os biomas do país, incluindo Amazônia e Pantanal.
A medida foi publicada no “Diário Oficial” desta quarta-feira. A portaria assinada pelo presidente do órgão, o coronel da Polícia Militar de São Paulo Homero de Giorge Cerqueira, condiciona a pesca esportiva à aprovação de um plano de manejo e permite a criação de um sistema de “prestadores de serviços de apoio”.
No artigo 27, atribui aos próprios pescadores e prestadores a necessidade de “atentarem à legislação vigente” sobre questões como “uso de petrechos autorizados para utilização na pesca esportiva, espécies (de peixes) cuja captura seja proibida na localidade”, entre outros pontos. A portaria também abre a possibilidade de pesca em unidades de conservação chamadas de integrais, as mais sensíveis sob o ponto de vista da proteção do meio ambiente, desde que a atividade ocorra “em território de população tradicional, em área regulada por Termo de Compromisso ou sob dupla afetação”.
A bióloga Ângela Kuczach, diretora-executiva da organização não governamental Rede Nacional PróUnidades de Conservação, criada em 1998, considera a portaria ilegal, porque seus poderes não devem estar acima da lei federal 9985, de 2000, a chamada Lei do SNUC (Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza). Segundo Ângela, a lei de 2000 serve para preservação da biodiversidade e não permite a extração de qualquer recurso nas unidades de proteção integral.
“A gente tem parques como Fernando de Noronha, Parque Nacional do Pantanal, Lagoa do Peixe que já são pressionados para esse tipo de extração de recursos e que agora ficam muito mais vulneráveis. A pressão se torna ainda mais forte. Nitidamente [a portaria] é um instrumento que fragiliza o sistema nacional de unidades de conservação”, disse Ângela. A bióloga alertou para “precedente sério para extração de outros tipos de recursos naturais”.
Flávio Lontro, coordenador-geral da Confrem (Comissão Nacional de Fortalecimento das
Reservas Extrativistas e Povos Tradicionais Extrativistas Costeiros e Marinhos), considerou
positiva a publicação da portaria, desde que ela venha acompanhada de outras leis e
regulamentos que detalhem como seria executada a pesca esportiva. Algumas comunidades
veem a pesca esportiva como uma oportunidade de negócios para aumento da renda. “Não é
porque publicou a portaria que já amanhã vai entrar gente para pescar. A gente espera que o
ICMBio cumpra os trâmites para poder efetivar a lei”, disse Lontro.
Segundo Lontro, há unidades de conservação “que terão pesca e outras não, isso ainda vai ser
detalhado”. “A portaria não é um documento definitivo, por si só ele não sustenta”, disse o
coordenador da Confrem. Ele disse que a entidade participou de conversas com o ICMBio no ano
passado, mas não da redação final do texto da portaria.
Júlio Barbosa, da associação dos moradores da Reserva Extrativista Chico Mendes, no Acre,
disse que a pesca esportiva, “dentro de um plano de sustentabilidade, pode dar um retorno
financeiro para as famílias”. Porém, disse que a regulamentação da atividade precisaria ser
instituída “por meio de uma lei, não de uma portaria”. “Essa atividade deve estar regida por um
plano de manejo, com prioridade para as comunidades tradicionais. Não pode ser simplesmente
para alguém que venha de fora e entre na unidade”, disse Barbosa.
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