Brasil
Conselho da OAB aprova parecer que avalia texto como inconstitucional
Em sessão nesta segunda-feira, 81 membros votaram sobre documento elaborado por comissão formada somente por mulheres
Os 81 membros do Conselho Pleno do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) votaram a favor de um parecer técnico-jurídico que avalia pela inconstitucionalidade do projeto de lei (PL) que equipara o aborto acima de 22ª semana ao crime de homicídio. O documento foi elaborado por uma comissão formada somente por mulheres e apresentado durante a sessão desta segunda-feira.
O presidente da OAB Nacional, Beto Simonetti, afirmou que o presidente da Câmara dos Deputados, Artur Lira, se comprometeu a ouvir a entidade a respeito do PL.
“Acabo de receber um comunicado do presidente da Câmara dos Deputados, Artur Lira, ciente do papel que a Ordem exerce na sociedade brasileira, nos reconhecendo como timoneiros da sociedade civil, estará pronto para receber o resultado da votação, obviamente que comporá o relatório aqui a ser debatido, e disposto está a construir a solução para esse PL ouvindo a OAB. Essa é a importância do diálogo honesto, frontal, que a Ordem tem mantido com os poderes ao longo do tempo”, disse Simonetti, na abertura da sessão.
O Projeto de Lei nº 1.904/2024 fixa em 22 semanas de gestação o prazo máximo para abortos legais. Atualmente, não há no Código Penal um prazo máximo para o aborto legal. No Brasil, o aborto é permitido por lei em casos de estupro, de risco de vida à mulher e de anencefalia fetal (quando não há formação do cérebro do feto).
“Todo o avanço histórico consagrado através de anos e anos de pleitos, postulações e manifestações populares e femininas para a implementação da perspectiva de gênero na aplicação dos princípios constitucionais é suplantado por uma linguagem punitiva, depreciativa, despida de qualquer empatia e humanidade, cruel e, indubitavelmente, inconstitucional”, destacam as advogadas, no parecer.
A comissão da OAB pondera que a criminalização da interrupção da gestação acima de 22ª semana, nos casos excluídos atualmente pela legislação, incidirá de forma absolutamente atroz sobre a população mais vulnerabilizada, incluindo pretas, pobres, de baixa escolaridade, perfil onde também incide o maior índice de adolescentes grávidas:
“O aspecto da desigualdade social, educacional e racial não pode ser invisibilizado pelo PL. O princípio da proporcionalidade, também conhecido como princípio da adequação dos meios aos fins, utilizado para resolver a colisão de princípios jurídicos, impõe às iniciativas legislativas a adequação, a observância dos desnivelamentos existentes.
É evidente que o meio utilizado pelo PL para coibir o aborto no Brasil não se encontra em razoabilidade com o fim perseguido, quando nos deparamos com dados como esse da retromencionada pesquisa ou quando, por exemplo, resta diagnosticado que a continuidade da gravidez representa risco iminente à vida da gestante, à sua saúde física e mental”.
O grupo frisa ainda que, quando uma criança ou mulher violentada sexualmente não consegue acesso à rede pública de Saúde, sendo obrigada a levar a gestação indesejada adiante ou praticar a interrupção insegura, colocando em risco sua vida, resta comprovado que falhou o Estado e a sociedade. Por isso, programas preventivos devem ser implementados e aprimorados constantemente para que se possa fazer cumprir os princípios constitucionais.
O documento aponta que a Constituição Federal institui como um dos princípios fundantes do Estado Democrático de Direito a dignidade da pessoa humana, além da não-discriminação, do direito à vida, da liberdade e da igualdade.
“De plano, não é o que se vislumbra no texto de lei proposto, eis que a possibilidade de criminalização de meninas e mulheres que realizem o aborto após 22ª semana de gestação, em especial no caso de estupro, com o crime equiparado ao homicídio, cuja pena é de até 20 anos de reclusão, está em absoluto descompasso com realidade social atual do Brasil. (…) Em verdade, se revela uma medida atroz, degradante, retrógrada e persecutória às meninas e mulheres, semelhante àquelas adotadas nos séculos XVII e XVIII, onde mulheres eram queimadas em fogueiras por serem consideradas bruxas”, diz a comissão, no parecer.
As informações são do O Globo.
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