Brasil
Assassinatos caem 3% nos primeiros nove meses de 2022 no Brasil, diz site
Em média, 111 brasileiros foram assassinados por dia entre janeiro e setembro deste ano.
O número de assassinatos no país continua em queda em 2022, segundo o índice nacional de homicídios criado pelo g1, com base nos dados oficiais dos estados e do Distrito Federal.
Foram 30,2 mil assassinatos nos primeiros nove meses deste ano, o que representa uma queda de 3% em relação ao mesmo período de 2021. Mesmo assim, o número é elevado: em média, 111 brasileiros foram assassinados por dia entre janeiro e setembro deste ano.
Estão contabilizadas no número as vítimas dos seguintes crimes:
-homicídios dolosos (incluindo os feminicídios)
-latrocínios (roubos seguidos de morte)
-lesões corporais seguidas de morte.
Mesmo com a queda, os números do terceiro trimestre do ano acendem um alerta, pois eles mostram que a diminuição de assassinatos no país desacelerou.
O levantamento, que compila os dados mês a mês, faz parte do Monitor da Violência, uma parceria do g1 com o Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (NEV-USP) e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
Veja os principais destaques:
-Houve 30,2 mil assassinatos nos primeiros nove meses deste ano, mais de mil mortes a menos que no mesmo período de 2021;
-Na contramão do país, 11 estados registraram alta nas mortes;
-Amapá teve a maior queda: 34%;
-Rondônia teve o maior aumento nos crimes: 29%;
A queda desacelerou no terceiro semestre do ano, período em que 17 estados tiveram alta de assassinatos.
Segundo especialistas do FBSP e do NEV-USP, o menor número de mortes é motivado por um conjunto de fatores, incluindo: mudanças na dinâmica do mercado de drogas brasileiro; maior controle e influência dos governos sobre os criminosos; apaziguamento de conflitos entre facções; políticas públicas de segurança e sociais; e redução do número de jovens na população.
A queda ao longo de 2022 até o momento está seguindo a mesma tendência do ano passado. Em 2021, o Brasil teve uma queda de 7% no número de assassinatos. Foram 41,1 mil mortes violentas intencionais no país no ano passado, o menor número de toda a série histórica do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, que coleta os dados desde 2007.
Queda generalizada e destaques regionais
A maioria das regiões do país registrou queda nos indicadores de mortes violentas intencionais entre janeiro e setembro deste ano.
Este fato deve ser celebrado, segundo Bruno Paes Manso, do NEV-USP. “A redução dos homicídios, que já era observada desde 2018, continua mesmo com a volta das pessoas às ruas depois da vacinação contra a Covid”, diz.
Veja alguns destaques regionais:
A queda mais expressiva foi a da região Nordeste, com uma diminuição de quase de 5%. Foram mais de 700 mortes a menos, puxadas principalmente pela Bahia (-11% de mortes) e pelo Ceará (-8%). Vale notar que três estados da região tiveram alta: Piauí (9%), Alagoas (7%) e Pernambuco (2%).
Já a região Sudeste teve uma queda de 4% nos primeiros nove meses do ano. No balanço semestral, o Sudeste tinha sido a região com a maior queda, de 7% — mas o terceiro semestre do ano teve um aumento considerável de mortes em Minas Gerais (9%) e em São Paulo (11%), o que fez com que a queda da região desacelerasse no apanhado geral.
Os pontos de atenção são para as regiões Centro-Oeste, que teve uma queda de 1%, e Sul, que registrou alta de 3%.
No Centro-Oeste, os indicadores são puxados por Mato Grosso (13%) e Mato Grosso do Sul (5%), estados marcados por conflitos nas fronteiras.
Já no Sul, Rio Grande do Sul e Paraná tiveram aumento nas mortes de 2% e 6%, respectivamente.
Norte: região de extremos
O Norte teve uma queda de 3% entre janeiro e setembro deste ano — mas chama a atenção que a região comporta dois extremos do país: os estados com a maior alta e com a maior queda de mortes do país.
De um lado, está o Amapá, estado que teve uma redução de 34% de assassinatos em comparação com o ano passado. Foram 242 casos em 2021, contra 159 neste ano.
Vale lembrar que, após dois anos seguidos de queda, o estado fechou 2021 com uma alta de 19% nos assassinatos, um aumento que aconteceu em meio à disputa entre facções criminosas na região — onde grupos armados disputam as atividades ilegais de tráfico de drogas e armas.
Amapá fecha 2021 com alta de 19% nos assassinatos em meio à disputa entre facções criminosas
Em maio de 2021, por exemplo, uma série de execuções assustou moradores de áreas periféricas de Macapá e Santana, as duas maiores cidades do estado. Foram 17 assassinatos em apenas um fim de semana. A investigação descobriu que a morte do filho do líder de uma facção desencadeou a onda de violência.
Contatado, o governo do Amapá também afirma que avalia a redução dos crimes no estado como “como resultado da consolidação das políticas de reestruturação física e tecnológica, integração entre os órgãos do Sistema de Segurança Pública do estado e valorização dos agentes operadores deste sistema”.
No outro extremo do país, está Rondônia, estado com o maior aumento de violência em 2022 até setembro: 29%.
Essa variação é mais baixa que a registrada no primeiro trimestre deste ano (alta de 43%), o que significa que o ritmo da violência diminuiu entre abril e setembro – mas os indicadores continuam na contramão da tendência nacional de queda.
Rondônia registra maior aumento nos assassinatos do país: 48% no primeiro trimestre
No balanço semestral, o governo do estado afirmou que “vem adotando medidas necessárias para reduzir o índice de violência, a exemplo de operações policiais integradas”. Contatado novamente para avaliar o balanço de nove meses, o governo não se pronunciou até o fechamento desta reportagem.
Ritmo de queda desacelerando
Mesmo com a queda de 3% entre janeiro e setembro, os dados do terceiro semestre do ano mostram que a diminuição de assassinatos desacelerou no terceiro semestre de 2022 em comparação com o mesmo período do ano passado.
A queda foi de 5% no primeiro trimestre de 2022 e de 4% no segundo trimestre. Já no terceiro, foi de apenas 1% — ou seja, praticamente no mesmo patamar que o de 2021.
“O balanço dos nove meses indica que o ano deve fechar com número de casos próximos ao do ano anterior”, diz Bruno Paes Manso, do NEV-USP. “Alguns estados começam a apresentar problemas, casos de Rondônia e Mato Grosso, lugares que são marcados principalmente por conflitos rurais e pela tensão em torno de crimes ambientais.”
Segundo Bruno, casos de homicídios ligados a discussões de rua, às vezes relacionados à política, passaram a se multiplicar, o que pode contribuir para a reversão da tendência de queda. “São ocorrências ligadas ao aumento de armas em circulação, cada vez mais comuns nos noticiários.”
O pesquisador destaca, porém, que os indicadores atuais continuam abaixo dos registrados em 2017, ano particularmente violento no país, em que quase 60 mil pessoas foram assassinadas.
“A queda em relação a 2017 continua importante, e os novos governadores e presidente da República terão o desafio de aprofundá-la, já que o Brasil segue na liderança do ranking das nações que mais matam por arma de fogo no mundo”, diz.
Tipos de mortes e hipóteses de queda
Segundo Bruno, é difícil apontar hipóteses sobre as causas da variação dos indicadores de violência, mas é possível identificar algumas tendências. Ele afirma que existem diversos motivos por trás das ações dos homicidas.
“Há os assassinos ocasionais, que matam numa discussão de bar ou numa briga de trânsito, por exemplo. Muitas vezes, ficam cegos de ódio e só percebem depois que mataram e jogaram a própria vida fora por um motivo idiota.”
“Há também os casos de feminicídios, vinculados a homens misóginos e machistas, que se sentem donos de suas mulheres e as assassinam porque se sentem ameaçados. Casos como esses são mais prováveis quando o agressor tem uma arma na mão.”
“Existem, porém, um outro tipo de homicídio, com motivações diferentes, que costumam ser mais relevantes nas variações de curto prazo das curvas de violência. São os casos ligados a disputas no mercado criminal.”
Paes Manso destaca que, quando gangues rivais brigam por poder ou mercado nos territórios, os homicídios costumam crescer.
“Foi o que aconteceu em 2017, ano em que as duas maiores gangues do Brasil entraram em confronto dentro dos presídios. As rebeliões, que provocaram quase 200 mortes, foram para as ruas dos bairros de diferentes estados e o Brasil fechou aquele ano como o mais violento da história”, diz Paes Manso.
O pesquisador afirma que, desde então, o cenário de criminalidade brasileiro está ano a ano menos violento — o que não significa que o crime parou ou diminuiu.
“Esse novo modelo criminal tem se revelado menos conflituoso e mais profissional, o que aumenta seus lucros e reduz seus custos. A fotografia que vemos, portanto, parece ser a de um novo perfil do mercado criminal, formado por grupos menos impulsivos e mais estratégicos, que ganham mais dinheiro por serem menos violentos”, diz Paes Manso.
Samira Bueno, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), concorda que o fator que tem mais influenciado nas oscilações dos indicadores de violência no país é a dinâmica do crime organizado. “Isso é algo que precisamos entender melhor, bem como os riscos para a democracia de a gente ter facções de base prisional que tomaram o país”, diz.
“Hoje, não tem nenhum estado do país que não tenha que lidar cotidianamente com a presença do crime organizado. Isso é uma ameaça à democracia. E pensar que os indicadores de criminalidade de algum modo estão tão suscetíveis a acordos ou guerras travadas entre criminosos é muito preocupante”, diz Samira Bueno.
Os especialistas citam ainda outros fatores que podem estar por trás das quedas dos indicadores:
-Criação de programas de focalização e outras políticas públicas: “Várias unidades da federação adotaram, ao longo dos anos 2000 e 2010, programas de redução de homicídios pautados na focalização de ações nos territórios. O Pacto Pela Vida, em Pernambuco, o Estado Presente, no Espírito Santo, e o Ceará Pacífico, no Ceará, são exemplos de projetos que buscaram integrar ações policiais e medidas de caráter preventivo”, afirmam Samira Bueno e Renato Sérgio de Lima, do FBSP.
-Redução do número de jovens na população: “Tem a ver com as mudanças demográficas, algo que a gente já vem apontando há alguns anos no Atlas da Violência, que é a reduçao do número de jovens na populacão. É sabido que a maior parte da violência letal atinge jovens do sexo masculino. E o Brasil esta diante de uma grande mudança demográfica”, afirma Samira.
Taxas por 100 mil habitantes
Veja abaixo as taxas de mortes por 100 mil habitantes de cada estado, da maior para a menor:
Pernambuco: 26,3
Bahia: 25,3
Alagoas: 24,7
Amazonas: 24,3
Ceará: 24,2
Rio Grande do Norte: 22,7
Rondônia: 22,1
Paraíba: 20,8
Roraima: 20,2
Pará: 19,6
Tocantins: 19,2
Maranhão: 18,9
Mato Grosso: 18,8
Espírito Santo: 18,4
Amapá: 18,1
Sergipe: 18,1
Piauí: 18
Acre: 16,1
Paraná: 13,3
Rio de Janeiro: 13,3
Mato Grosso do Sul: 12,8
Goiás: 12,4
Rio Grande do Sul: 11,3
Minas Gerais: 8,8
Distrito Federal: 7,2
Santa Catarina: 6,4
São Paulo: 5,2
Índice nacional de homicídios
A ferramenta criada pelo g1 permite o acompanhamento dos dados de vítimas de crimes violentos mês a mês no país. Estão contabilizadas as vítimas de homicídios dolosos (incluindo os feminicídios), latrocínios e lesões corporais seguidas de morte. Juntos, estes casos compõem os chamados crimes violentos letais e intencionais.
Jornalistas do g1 espalhados pelo país solicitam os dados, via assessoria de imprensa e via Lei de Acesso à Informação, seguindo o padrão metodológico utilizado pelo fórum no Anuário Brasileiro de Segurança Pública.
Os dados coletados mês a mês pelo g1 não incluem as mortes em decorrência de intervenção policial. Isso porque há uma dificuldade maior em obter esses dados em tempo real e de forma sistemática com os governos estaduais. O balanço fechado do ano de 2021 foi publicado em maio.
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