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Amazônia: cientistas pedem “revogaço” de decretos e retomada de programa antidesmate para proteção florestal

Recomposição do sistema de proteção à floresta levará tempo, mas embargos fundiários e mudança de discurso podem ter efeito de curto prazo, dizem especialistas.

Queimada e desmatamento em floresta na Amazônia. (Foto: Andre Penner_AP)

Diante alta no desmatamento da Amazônia, cientistas, dizem que reverter a situação é algo que levará tempo, mas algumas medidas podem ter efeito de curto prazo. Entre as providências apontadas como necessárias estão, principalmente, a reversão de decretos que afrouxaram a fiscalização e a retomada de um programa antidesmate amplo. As informações são do jornal O Globo.

Reverter a situação levará tempo, dizem, mas algumas medidas podem ter efeito a curto prazo. Entre providências apontadas como necessárias estão, principalmente, a reversão de decretos que afrouxaram a fiscalização e a retomada de um programa antidesmate amplo.

Uma das demandas dos grupos ambientalistas é o que se apelidou de “revogaço”: a eventual revogação de uma série de decretos e normas do poder executivo que dificultaram a aplicação de multas e o combate a crimes ambientais.

Outra palavra resgatada pelos especialistas é a sigla “PPCDAm”, do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia, programa apontado como responsável pela queda acentuada no desmatamento entre 2004 e 2014.

“Um revogaço no setor ambiental não seria uma medida propriamente dita, mas é obrigação para qualquer governo democrático que assuma o poder. Existem mudanças que foram feitas e precisam ser corrigidas para voltar uma situação de gestão viável”, diz o biólogo e especialista em gestão ambiental João Paulo Capobianco, um dos arquitetos do PPCDAm quando era secretário-executivo do Ministério do Meio Ambiente (MMA).

O número de medidas que precisam ser revistas, segundo ambientalistas, é grande, mas a maioria são normas infralegais (que não requerem aprovação no Congresso), criadas durante a gestão do ex-ministro Ricardo Salles. Um levantamento feito pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) no ano passado listou a emissão de 524 decisões como portarias e instruções normativas que atravancam a proteção ambiental, Dessas 48 são classificadas como de dano “alto” ou “muito alto”.

Entre elas está a instrução normativa conjunta número 1 envolvendo MMA, Ibama e ICMBio, de janeiro de 2020. A medida permitiu a conversão de multas ambientais em “serviços” prestados pelo autuado, sem regulamentação técnica, criando brecha para a impunidade. Outra, datada do mesmo dia, mudou o rito de processo das multas, submetendo julgamentos a funcionários não concursados com cargos de indicação política.

Embargos

Os processos de multa, porém, são normalmente mais lentos, e especialistas listam medidas que teriam efeito mais prático no desmate ilegal logo de cara.

“Um dos primeiros sinais a serem dados seria um processo remoto de embargos de áreas desmatadas, em larga escala”, diz o engenheiro florestal Tasso Azevedo, do projeto MapBiomas.”Você notifica o proprietário logo depois de sair o laudo mostrando as imagens de satélite antes e depois, e se ele não apresenta autorização, o embargo é imediato. Entre as consequências estão não ter acesso a financiamento e não poder vender produto”, afirma.

Azevedo afirma também que o CAR (Cadastro Ambiental Rural), que começou a ser implementado após a aprovação do código florestal de 2012, permite corrigir de imediato tentativas grosseiras de grilagem para desmatamento. Um exemplo seria automatizar a negação de registra para propriedades privadas em sobreposição com terras indígenas e unidades de conservação.

“Também é preciso abrir publicamente os dados do CAR, incluindo o nome de quem registrou as áreas. Dados imobiliários no Brasil são abertos, e não tem por que os dados do CAR não serem”, diz o pesquisador, argumentando que a transparência fortalece a fiscalização.

Discurso

Para o geoecólogo Britaldo Soares-Filho, da UFMG, é importante que a próxima gestão do governo federal dê logo sinais de que não aceita a ideia de que atividades ligadas à degradação ambiental são forma válida de de desenvolvimento econômico. Quando o risco de punição é percebido como baixo é que o desmatador investe na derrubada em áreas ilegais, explica.

“Hoje o que existe é quase um incentivo de governo para a prática da criminalidade. Os desmatadores, garimpeiros, grileiros e madeireiros ilegais estão se sentindo empoderados pelo discurso oficial”, diz. “A primeira coisa é chegar com um discurso claro de que o crime ambiental vai ser punido de acordo”, afirma.

Equipes de programa de governo de alguns candidatos parecem estar atentas.

“Eu tenho recebido documentos das campanhas. Pedem para que eu faça sugestões e revisões, e eu tenho feito para todos os que pedem”, diz Capobianco.

A Coalizão Brasil Clima Florestas e Agricultura, da qual o biólogo é integrante, está elaborando suas propostas de governo, a exemplo de ONGs e institutos de pesquisa da área. Segundo ele, não falta respaldo técnico para candidatos elaborarem propostas coerentes.

“O que existe é uma questão de vontade”, diz.

Segundo Capobianco, um dos trunfos que o PPCDAm possuía nos anos iniciais é que o programa era gerido pela Casa Civil, e sua proximidade com a Presidência da República facilitava a coordenação de medidas envolvendo vários ministérios. Essa posição privilegiada foi alterada ainda no governo Dilma, antes de o desmate começar a subir de novo, em 2016.


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