Amazonas
Pesquisador da Fiocruz Amazônia faz novo alerta sobre segundo pico para Covid -19 em Manaus
Jesem Orellana diz que “não há dúvidas que o Amazonas foi duramente derrotado no combate à epidemia de Covid-19″ e que ” resta saber se serão extraídas lições.
O epidemiologista da Fiocruz Amazônia, Jesem Orellana, divulgou hoje novo alerta para a Covid-19 em Manaus. Segundo estimativas atuais do Infogrip, enquanto a incidência de casos novos por 100 mil habitantes da semana de início dos sintomas de Síndrome Respiratória Aguda (SRAG) caiu em boa parte das grandes metrópoles do Brasil, em Manaus, a partir do início de agosto, houve tendência forte de aumento.
Jesem diz que “não há dúvidas que o Amazonas foi duramente derrotado no combate à epidemia de Covid-19″ e que ” resta saber se serão extraídas lições e/ou renovadas as equipes responsáveis pela administração de órgãos estratégicos como a Fundação de Vigilância em Saúde (FVS).
“Não fomos escutados em agosto e o caldeirão da morte encheu novamente em Manaus. Afinal, nossa vocação está mais para contar mortos ou para salvar vidas? O poder público precisa superar suas limitadas e/ou erráticas medidas de flexibilização e de fiscalização do distanciamento social, incluindo reabertura prematura de escolas e pontos de aglomeração (bares, academias, shoppings, restaurantes e locais públicos)”diz.
Em junho a taxa de positividade para testes RT-PCR realizados no Amazonas foi de 18,4%, em julho, aumentou para 26,1% e, finalmente, em agosto, esse percentual quase dobrou em comparação a junho, com 32,1%, valor um pouco abaixo do observado no pico explosivo da mortalidade em Manaus, em abril, com 42,5%.
As informações do pesquisador são baseadas em dados de mortalidade, de internações hospitalares, estimativas de incidência de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) e informações sobre taxa de positividade para diagnóstico de Covid-19, via RT-PCR, dos últimos 66 dias, entre 12 de julho e 15 de setembro.
Já o número de mortes por Covic-19 entre 02 e 22 de agosto com os dados de 12 de julho a 1º de agosto, aumentou 9,7% em Manaus. E o excesso de mortes respiratórias (IR – Insuficiência Respiratória] + SRAG [Síndrome Respiratória Aguda Grave] + Covid-19), entre 02 e 22 de agosto foi de 455%, em comparação com 2019. No período anterior (12 de julho a 1º de agosto), o excesso de mortes respiratórias foi de 300%, um número igualmente alto, mas menor do que os dados mais atuais (2 a 22 de agosto).
VEJA A ÍNTEGRA DO NOVO ALERTA EPIDEMIOLÓGICO
MANAUS (18-Set-2020)
Como chegamos na segunda de COVID-19 em Manaus? Vamos explicar o que aconteceu entre 12 de julho e 15 de setembro (66 dias), com dados de mortalidade, de internações hospitalares, estimativas de incidência de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) e com informações sobre taxa de positividade para diagnóstico de COVID-19, via RT-PCR, em agosto. Em outras palavras, com base em amplo e consistente repertório epidemiológico.
MORTALIDADE
Comparando os dados de mortalidade por COVID-19 entre 02 e 22 de agosto com os dados de 12 de julho a 1º de agosto, observamos aumento de 9,7% no número de mortos em Manaus.
O excesso de mortes respiratórias (IR [Insuficiência Respiratória] + SRAG [Síndrome Respiratória Aguda Grave] + COVID-19), entre 02 e 22 de agosto foi de 455%, em comparação com 2019. Já no período anterior (12 de julho a 1º de agosto), o excesso de mortes respiratórias foi de 300%, um número igualmente alto, mas menor do que os dados mais atuais (2 a 22 de agosto).
HOSPITALIZAÇÕES
Dados mais atuais da FVS mostram que o número médio diário de ocupações de leitos clínicos por COVID-19 (suspeita/confirmado), no período de 17 a 31 de agosto aumentou significativamente, passando de 156,7 para 182,1 de 01 a 15 de setembro.
Ainda mais preocupante foi o ocorrido com o número médio diário de ocupações de leitos de UTI por COVID-19 (suspeita/confirmado) no período de 17 de agosto a 31 de agosto, o qual passou de 95,2 para 106,7, no período de 01 a 15 de
setembro.
Vítimas hospitalizadas, em geral, apresentam pior prognóstico de saúde e estão, portanto, sob maior risco de morte, sobretudo pacientes de UTI.
DADOS DE INCIDÊNCIA POR SRAG E DE TAXA DE POSITIVIDADE PARA COVID-19
Segundo estimativas atuais do INFOGRIPE, enquanto a incidência (casos novos por 100 mil hab. – de acordo com a semana de início dos sintomas) de SRAG cai em boa parte das grandes metrópoles do Brasil, em Manaus, a partir do início de agosto, observa-se tendência fortemente sugestiva de aumento.
Para finalizar, em junho a taxa de positividade para testes RT-PCR realizados no AM foi de 18,4%, em julho, aumentou para 26,1% e, finalmente, em agosto, esse percentual quase dobrou em comparação a junho, com 32,1%, valor um pouco abaixo do observado no pico explosivo da mortalidade em Manaus, em abril, com 42,5%.
Embora esse dado não represente a prevalência de adoecimento na população geral e sim a taxa de positividade em testados, oferece mais uma pista sobre o aumento da transmissão comunitária do novo coronavírus no AM, em especial em Manaus.
Isto porque, a maior parte dos resultados desses exames são de residentes na capital.
Um cenário frustrante, pois mesmo seis meses depois da detecção do primeiro caso de COVID-19 no Brasil, o Amazonas segue sem descentralizar (concentrado em Manaus) o diagnóstico laboratorial à identificação do SARS-COV-2, ferramenta fundamental não só para a confirmação de casos novos de COVID-19, como também para o efetivo rastreamento, identificação, orientação e acompanhamento de casos e seus contatos na comunidade.
Segundo dados da FVS-SUSAM, de março até agosto, haviam sido efetuados menos de 33 mil exames RT-PCR no AM, um número não apenas criticamente baixo, como muito aquém da capacidade máxima operacional que consta no site da FVS-SUSAM, em torno de 30 mil por mês ou mil por dia.
No mês de agosto, um pouco antes de a FVS ter admitido o aumento de casos e hospitalizações por COVID-19, realizou-se o menor número de exames RT-PCR no AM, justamente quando deveriam ter sido aprofundadas as estratégias de vigilância epidemiológica/laboratorial. Como reflexo desse inoportuno relaxamento na vigilância epidemiológica e laboratorial da COVID-19, há mais de quatro semanas, o envio de amostras para processamento na FIOCRUZ-Amazônia, com a metodologia de RTPCR, foi estranhamente suspensa pelo governo do estado.
O grave problema da fraca vigilância laboratorial, via metodologia RT-PCR, ainda esbarra na falta de consistência das informações apresentadas pela FVS em seu “portal da transparência”, já que os dados que constam no “BOLETIM DIÁRIO COVID-19 NO AMAZONAS” do dia 11-Set-2020, informa que foram realizados em torno de 36.600 exames RT-PCR. No entanto, na página “Painel de Monitoramento da COVID-19” e repetindo um ato comum para outros indicadores, a FVS afirma que foram realizados em torno de 34.800 exames RT-PCR, ao longo de toda epidemia no Amazonas, minando ainda mais a confiabilidade nos dados do “portal da transparência” do AM.
CONSIDERAÇÕES FINAIS E RECOMENDAÇÕES
Não é possível que, seis meses depois, esses problemas persistam. Não há dúvidas que o Amazonas foi duramente derrotado no combate à epidemia de COVID-19, resta saber se serão extraídas lições e/ou renovadas as equipes responsáveis pela administração de órgãos estratégicos como a FVS. É urgente elevar o padrão de resposta a emergências sanitárias a um novo patamar, já que Manaus, sua capital, até o momento, é uma das cidades mais gravemente castigadas pela epidemia no planeta e já se encontra na segunda onda de COVID-19, assim como a região de Madri na Espanha, também duramente castigada na primeira fase da epidemia.
Não fomos escutados em agosto e o caldeirão da morte encheu novamente em Manaus. Afinal, nossa vocação está mais para contar mortos ou para salvar vidas? O poder público precisa superar suas limitadas e/ou erráticas medidas de flexibilização e de fiscalização do distanciamento social, incluindo reabertura prematura de escolas e pontos de aglomeração (bares, academias, shoppings, restaurantes e locais públicos).
Seguimos sem vacina e medicação específica para COVID-19. Por isso, precisamos fortalecer o SUS e as medidas de distanciamento social. Talvez o único caminho para frear a segunda onda em Manaus seja um Lockdown rigoroso, de uns 14 dias, para que estado, município e a sociedade de modo mais amplo possam reavaliar os erros cometidos até então e, aos poucos, quem sabe, possamos retomar, de forma realmente segura, as atividades não essenciais e o tão desejado e necessário retorno das aulas presenciais.
É nosso defender a boa ciência e o SUS, em particular a vigilância em saúde nos territórios mais vulneráveis! Vidas importam!
Jesem Orellana
Epidemiologista-FIOCRUZ/Amazônia
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