Amazonas
“Novo normal”: setor industrial no Amazonas se prepara para estiagem dos rios em 2024 tão grave quanto a de 2023
Além da antecipação de insumos, a indústria também tem preparado planos para escoamento antecipado de produtos, considerando um período crítico para a navegabilidade.
O coordenador da Comissão de Logística do Centro da Indústria do Estado do Amazonas (Cieam), Augusto Rocha, disse ao jornal O Globo que o cenário da última seca dos rios “foi assustador” e que, este ano, a indústria vive um “novo normal” na preparação para o período. Segundo ele, as empresas agora consideram que terão um período de 60 dias com a navegação restrita, ao invés de 30 dias, como nos anos anteriores. Um dos grandes gargalos é a chegada do insumo para as indústrias do Amazonas.
“O que se faz é comprar mais estoque e programar para que ele chegue a Manaus em meados de agosto. De tal forma que em outubro, quando deve ser o ponto crítico do problema, já não tenha nada em trânsito e esteja tudo desembaraçado no estoque das empresas”, afirmou Rocha.
Além da antecipação de insumos, a indústria também tem preparado planos para escoamento antecipado de produtos, considerando um período crítico para a navegabilidade. O Globo informa que, de acordo com a Cieam, que representa 300 empresas da Zona Franca, 60% de toda a produção do polo é escoada por meio de cabotagem (navios); 39% a partir do roll on/roll off (o chamado rô-rô caboclo, que são caminhões em balsas e rodovias), enquanto 1% é feito por transporte aéreo.
Na indústria de eletrônicos, as empresas operam com o prazo de setembro para escoar a produção antes do ponto crítico da estiagem para os rios. Para minimizar as perdas previstas para o período mais grave da seca, o setor também tem negociado a antecipação das férias coletivas do próximo ano, de acordo com Jorge Junior, presidente-executivo da Associação Nacional de Fabricantes de Produtos Eletrônicos (Eletros), que representa 33 indústrias com produção na Zona Franca.
“Algumas empresas já estão a todo o vapor produzindo para escoar a produção. Há uma preocupação de que se a gente novamente não puder produzir, sem os insumos necessários e os rios navegáveis para escoar a produção, vamos ter mais um ano de penalização para as indústrias da região norte”, disse Junior.
Desde o início do ano, os representantes da indústria da região têm levado os alertas sobre a seca para governos federal e estadual. Uma das preocupações é a de que as secas extremas se tornem fenômenos mais persistentes na região.
“Essa é uma pauta que vai se tornar ainda mais urgente. E um dos grandes desafios é a criação de uma infraestrutura na Amazônia, se não vamos sempre ficar tratando de emergência”, disse Rocha.
Em 2023, a seca sem precedentes na Amazônia fez a produção industrial do Amazonas acumular três meses consecutivos de queda (entre setembro e novembro), com recuo de 16,6% no período, segundo a Pesquisa Industrial Mensal do IBGE. A paralisação de linhas de produção e a adaptação da cadeia logística gerou um custo adicional de R$ 1,4 bilhão para a indústria. O impacto veio principalmente com a paralisação do transporte fluvial, que é o principal meio para o escoamento de produtos e para chegada de insumos na Zona Franca de Manaus
O Globo citou um estudo da World Weather Attribution (WWA) apresentado em janeiro, que mostrou que as mudanças climáticas foram a principal causa da estiagem histórica de 2023 e já fazem a seca na Amazônia ser 30 vezes mais provável no período de junho a novembro.
No Ministério dos Transportes, segundo o jornal, uma das ações preventivas que está sendo proposta é a elaboração de uma licitação, que terá o edital publicado até o fim do mês, para a contratação de uma empresa para execução e supervisão de um plano de dragagem e sinalização no Rio Amazonas (de Manaus a Itacoatiara) e no Rio Solimões (em três trechos que vão do Codajás a Benjamin Constant) pelos próximos cincos anos.
Durante a última estiagem, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), do Ministério dos Transportes, fez a contratação emergencial dos serviços de drenagem no Solimões e Amazonas. Erick Moura, diretor de Infraestrutura Aquaviária do órgão, diz que a licitação vai tornar o trabalho permanente na região. “Essa é uma grande preocupação nossa. A gente percebeu que a região deve sofrer pelo menos nos próximos três ano”, afirmou.
Na previsão dos meteorologistas, entretanto, há uma notícia menos preocupante. O fenômeno La Niña (resfriamento anormal das águas do Pacífico), que deve afetar o Brasil no último trimestre — e costuma atrasar o período úmido — deve ser de fraca intensidade. Havia preocupação que o La Niña pudesse agravar e prolongar ainda mais a seca na região.
De acordo com os meteorologistas da Nottus, especializada em meteorologia de negócios, a previsão é que em outubro já se forme um corredor de umidade de Norte a Sul do país. “O modelo não aponta que o La Niña atrase o período úmido este ano e, em outubro, segundo os modelos, existe a possibilidade da formação de um corredor de umidade que começa na costa Sul, passa pelo Sudeste e vai até a região Norte”, diz Desirée Brandt, sócia e meteorologista da Nottus.
O Centro Nacional de Monitoramento e Alertas para Desastres Naturais (Cemaden) emitiu nota em março alertando inclusive que o La Niña tem potencial para aumentar as chuvas na região norte e Nordeste do país.
Ana Clara Marques, especialista em clima na Climatempo avalia que a chegada do La Niña pode ajudar a encurtar o período mais grave estiagem nos rios no segundo semestre. Ainda assim, diz, a previsão para os próximos meses na região amazônica é de chuvas mais irregulares e abaixo da média. A climatologista projeta que os níveis dos rios devem ficar próximos ou até mais baixos do que na seca anterior.
“Estamos nos preparando para o pior. Os prognósticos apontam mais uma vez para uma estiagem severa considerando que estamos com nossas bacias com níveis bem abaixo do que consideramos normal para os rios”, disse ao O Globo o secretário Executivo da Defesa Civil do Amazonas, Francisco Máximo. Segundo ele, os rios, por enquanto, estão navegáveis, mas as nove calhas estão com níveis bem abaixo ou muito próximo das métricas nesse mesmo período do ano passado.
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