Amazonas
Ação civil pública determina reabertura de posto de saúde indígena no Tarumã-Açu, em Manaus
A ação civil pública contra a União inclui também a contratação de nova equipe multidisciplinar para atuação junto às comunidades indígenas.
O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou ação civil pública para assegurar a prestação de serviço de saúde indígena na área de atendimento do Polo Base Tarumã-Açu, na região do rio Tarumã-Açu, em Manaus. Na ação, o MPF pede a imediata reabertura do polo base de saúde indígena da aldeia Gavião, que está com as atividades paralisadas desde janeiro deste ano.
Para o funcionamento do polo base, o MPF pede que a Justiça Federal determine, em caráter liminar, a lotação de técnico de enfermagem e de equipe multidisciplinar capacitada para atuação com povos indígenas, além do regular abastecimento de medicamentos, equipamentos, combustível suficiente para transporte fluvial e terrestre, disponibilização de veículo e contratação de condutor habilitado, mediante consulta aos usuários de saúde indígena e conselheiros locais das aldeias, conforme a Convenção n. 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), no prazo de 72 horas.
A ação civil pública inclui também a contratação de nova equipe multidisciplinar para atuação junto às comunidades indígenas, a definição de novos agentes indígenas de saúde e a realização, com urgência, de um novo processo de escolha de conselheiro distrital de saúde indígena no Conselho Distrital de Saúde Indígena (Condisi)/Manaus do Polo Base Tarumã-Açu. A eleição deve ser feita em uma das aldeias de atendimento do polo base, com participação dos usuários da saúde indígena da região e conselheiros locais, no prazo de 15 dias.
Irregularidades – A precariedade estrutural no Polo Base Tarumã-Açu, vinculado ao Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei), foi relatada ao MPF pelos usuários, que indicaram que a unidade funcionava em uma pequena estrutura improvisada na aldeia Gavião. Houve relatos de mau atendimento por parte dos profissionais da equipe multidisciplinar, ausência de prestação de serviço pela agente indígena de saúde de referência para a área, técnicos de enfermagem que não cumpriam os horários de trabalho, ausência de transporte entre as aldeias e hospitais na cidade para atendimento emergencial, entre outras irregularidades.
Houve relatos ainda de que desentendimentos internos entre lideranças indígenas na região do Tarumã-Açu e eleições de conselheiros distritais com falhas administrativas e ausência de legitimidade levaram à escolha de conselheiro distrital da região que não representa adequadamente os usuários de saúde indígena ou, pelo menos, não representa grande parte destes usuários.
O MPF explica, na ação, que divergências e pequenos conflitos são comuns no contexto da prestação do serviço de saúde indígena e são resolvidos por meio de mecanismos de conciliação, diálogo, inclusive com a cooperação de outros atores quando necessário, como o MPF e a Fundação Nacional do Índio (Funai). “Em nenhum momento tais mecanismos de solução de conflitos foram acionados pelo Dsei Manaus ou pelo Condisi Manaus neste caso”, afirma o órgão, no documento.
Conflito, abusos e paralisação das atividades – O estopim do conflito ocorreu entre os dias 3 e 5 de janeiro. Após grave divergência e atos de desrespeito em reunião realizada no dia 3 na aldeia Gavião com a equipe multidisciplinar do polo, a coordenação do Dsei decidiu pela retirada da equipe do local, levando medicamentos e insumos. No dia seguinte, a equipe retornou ao local, de forma temerária e sem qualquer tratativa prévia para solucionar o conflito, o que gerou novo desentendimento, com o arremesso de um pedaço de madeira contra a embarcação da equipe.
Nota de Repúdio enviada pela Coordenação dos Povos Indígenas de Manaus e Entorno (Copime) ao MPF e relatos de indígenas em reunião com órgão apontaram que, no dia 5, o coordenador do Dsei Manaus, de forma arbitrária e escoltado por policiais federais, abordaram de forma abusiva os indígenas da aldeia Gavião, deixando crianças, mulheres e idosos indígenas sob sol forte por mais de uma hora à beira do rio, alguns passando mal, enquanto agentes federais vasculhavam a aldeia. Houve relatos inclusive de invasão da casa de uma liderança indígena na Aldeia Gavião pelos agentes federais sem apresentar qualquer mandado judicial, intimidando a comunidade local, sob o pretexto de que as lideranças indígenas estariam retendo medicamentos, equipamentos e arma de fogo, não sendo encontrada qualquer arma.
“Além dos abusos fomentados pelo Dsei Manaus a partir de um registro de ocorrência desproporcional (alegação de ‘tentativa de homicídio’ pelo atirar do pedaço de madeira em direção ao barco, bem como potencial falsa alegação sobre existência de tiro no dia 04/01/22), nota-se o abuso sequencial e a ausência de capacitação da Polícia Federal no caso para abordagem e contato com os povos indígenas”, afirma o MPF, destacando que não há históricos de ilícitos ou violações contra a lei na comunidade.
Desde a ação policial, o polo base de atendimento à saúde indígena na aldeia Gavião está inoperante, sem qualquer material de saúde, equipamento ou transporte para remoção dos doentes a algum posto de saúde próximo. As equipes multidisciplinares também não entraram mais na área, que é a referência para as cinco aldeias atendidas no Polo Base Tarumã-Açu, nem compareceram mais na aldeia Santa Maria do povo Karapãna.
Danos morais coletivos – Além da retomada do atendimento do polo base, o MPF pediu, na ação civil pública, que a Justiça Federal condene a União ao pagamento de R$ 700 mil em indenização por danos morais coletivos, diante das violações cometidas contra os indígenas da aldeia Gavião entre os dias 3 e 5 de janeiro, especialmente pelo Dsei Manaus e pela Polícia Federal, com impacto negativo direto aos indígenas da aldeia.
A omissão deliberada na prestação de saúde indígena pelo DSEI Manaus na região do Tarumã-Açu desde o início de janeiro de 2022 também fundamenta o pedido de indenização por danos morais.
Sensibilização e capacitação da Polícia Federal – Enfim, outro pedido do MPF foi no sentido de haver melhor preparo das equipes da Polícia Federal para aproximação e abordagem junto aos povos indígenas, com respeito à sua cultura, por meio da realização de curso interno de capacitação neste sentido.
A ação civil pública tramita na 1ª Vara Federal no Amazonas, sob o n. 1004940-57.2022.4.01.3200.
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