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Vetado por Bolsonaro, cientista da Fiocruz Amazônia será condecorado pelo governo Lula, informa colunista

A atual diretora da Fiocruz, Adele Schwartz Benzaken, também teve a honraria revogada e será condecorada junto de Marcus Lacerda pelo governo.

O infectologista da Fiocruz Amazônia Marcus Lacerda, líder do primeiro estudo do mundo a demonstrar a ineficácia da cloroquina contra a Covid-19, receberá na próxima quarta-feira (12/07) do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a condecoração da Ordem Nacional do Mérito Científico (ONMC).

O título será entregue quase dois anos após a revogação da mesma honraria por Jair Bolsonaro. As informações são da colunista Malu Gaspar, de O Globo.

A homenagem será oficializada na primeira reunião do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia, vinculado ao Ministério da Ciência e Tecnologia e Inovação, comandado pela ministra Luciana Santos. A atual diretora da Fiocruz, Adele Schwartz Benzaken, também teve a honraria revogada e será condecorada junto de Marcus Lacerda pelo governo.

Em novembro de 2021, Lacerda e outros 21 cientistas foram condecorados por Bolsonaro e pelo então titular da pasta, Marcos Pontes. Na mesma semana, no entanto, a concessão do título de comendador ao cientista foi cancelada em publicação no Diário Oficial da União (DOU).

Já a sanitarista Adele Schwartz Benzaken foi demitida de um departamento do Ministério da Saúde no início do mandato de Bolsonaro após a divulgação de uma cartilha voltada para homens trans. A decisão abrupta e sem justificativa levantou indícios de retaliação política a Lacerda, que se tornou alvo de bolsonaristas pelo trabalho que ajudou a sepultar a campanha negacionista da cloroquina na pandemia.

Marcus Lacerda frisou que a indicação partiu da Academia Brasileira de Ciências e da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, que costumam colaborar com a construção da lista de homenageados da ONMC.

“Não é razoável que um presidente da República, que representa seu povo, se negue a entregar a comenda por questões ideológicas. O atual presidente repara um erro histórico e retoma o respeito à classe dos cientistas deste país”, declarou o cientista.

As revogações em 2021 deflagraram uma onda de solidariedade na comunidade científica. Um dos homenageados naquela ocasião, o epidemiologista Cesar Victora, professor emérito da Universidade Federal de Pelotas (Ufpel), se recusou a receber o título de grão-cruz.

O movimento de Victora, que coordenou Epicovid, estudo epidemiológico que mapeou a incidência da Covid-19 no Brasil, levou outros cientistas e pesquisadores a renunciarem aos seus títulos da Ordem Nacional do Mérito Científico, mesmo que concedidos em governos anteriores, em protesto à gestão Bolsonaro e em solidariedade aos colegas.

Na ocasião da polêmica, a concessão da honraria já estava na gaveta do Ministério da Ciência e Tecnologia desde 2019. Por essa razão, se especulou nos bastidores que Bolsonaro tenha assinado o decreto sem ter conhecimento do histórico dos homenageados e recuou ao ser alertado por aliados que defenderam o uso da cloroquina e o chamado “tratamento precoce” durante toda a pandemia.

A coluna diz que Marcus Lacerda foi atacado publicamente pelo então presidente, seu filho, o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e aliados como o senador Luís Carlos Heinze (PP-RS), que disseminaram informações falsas sobre o estudo do cientista da Fiocruz. Em 2021, Bolsonaro chegou a acusá-lo de matar pacientes com dosagens altas do remédio, o que não procede, e tentou vinculá-lo ao PT.

Lacerda chegou a responder a inquéritos policiais abertos por procuradores da República em Goiás e no Rio Grande do Sul, que foram sumariamente arquivados após a comprovação de que não houve negligência da parte dos cientistas. O pesquisador também precisou de escolta policial após ameaças de morte.

O estudo liderado por Lacerda foi publicado em abril de 2020 no Journal of the American Medical Association (Jama), uma das principais publicações científicas do mundo. Assinado por outros 27 pesquisadores, o trabalho foi o primeiro trabalho a confirmar, com evidências sólidas, que a cloroquina não funcionava no tratamento de pacientes que contraíram Covid-19.

O estudo clínico foi realizado em março de 2020 com 81 pacientes hospitalizados na UTI de um hospital federal de Manaus, que eventualmente se tornaria um dos epicentros da doença no Brasil.

À época, o remédio, de baixo custo e usado contra malária e outras doenças, foi defendido de maneira enfática por Bolsonaro e pelo então presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.

Além de demonstrar que a droga não funcionava em pacientes com Covid-19, a pesquisa também demonstrou que doses mais altas da cloroquina provocavam arritmia cardíaca. A conclusão levou à recomendação da suspensão do uso do remédio pelo Instituto Nacional de Saúde dos EUA (o NIH, na sigla em inglês). O estudo, elogiado internacionalmente, foi interrompido muito antes da ocorrência dos óbitos de voluntários.

Apesar de todas as credenciais, diz a coluna, a pesquisa foi distorcida por bolsonaristas ao longo de todo o período mais agudo da pandemia para defender tratamentos ineficazes em contraponto às diretrizes defendidas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e boa parte da comunidade científica, como o isolamento social e, após o surgimento de vacinas contra o coronavírus, a imunização da população.

Durante a CPI da Covid, que apurou os desmandos do governo Bolsonaro no comando da pandemia, o senador Luis Carlos Heinze – defensor de remédios sem eficácia – atacou Lacerda nominalmente em diversas sessões da comissão e acusou o pesquisador de “criminalizar” a cloroquina para “desestabilizar o governo”.


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